TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

604 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O tribunal de primeira instância, por sentença de 31 de março de 2017, julgou a oposição à penhora improcedente e, em consequência, ordenou o prosseguimento da execução em relação ao imóvel penhorado. Inconformado, o executado interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 15 de fevereiro de 2018, julgou a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida. 2. É deste acórdão que vem interposto o presente recurso de constitucionalidade, com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, seguidamente abreviada como “LTC”), nos seguintes termos (cfr. fls. 61-62): «1 – Pretende-se ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo 834.º, n.º 2, al. 1 do C. P. Civil (na versão anterior) – artigo 751.°, n.º 3 do C. P. Civil (nova versão) – aplicada pelo Tribunal da 1.ª Instância –, man- tida pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa –, sempre que esteja em causa a casa de morada de família e esse imóvel não esteja dado de garantia para o pagamento da dívida exequenda (como é o caso dos autos), por tal norma ser inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade e adequação, uma vez que confere maior proteção, sem justificação, ao credor da obrigação (que não é hipotecário) em relação ao devedor, sendo certo que, no caso deste último, existem interesses de particular relevância social a considerar, como seja o direito à habitação. 2 – Isto é, a norma que permite que se penhore a casa de morada de família (que não foi dada de garantia, designadamente de hipoteca) quando não se consiga, mediante penhora de outros bens, pagar a dívida no prazo de dezoito meses (ou 12 meses), é manifestamente inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, quer quanto ao prazo ali estipulado, quer quanto ao objeto da penhora, e violação do artigo 65.º da Constituição da República Portuguesa. 3 – Na verdade, com a penhora do imóvel, que é casa de morada de família, no valor Tributário de € 111 420 e a dívida em causa ser em 02/03/2017 de € 23 965,50, verifica-se uma violação não só do princípio da proporcio- nalidade como também do artigo 65.° da Constituição da República, que defende que “todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e de conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade da família.”. 4 – Note-se, ainda, que tal norma é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, uma vez que, na prática, impõe um regime menos favorável para o devedor não hipotecário, na medida em que, e ao contrário do devedor hipotecário, o devedor comum não beneficia do regime legal imposto ao credor hipotecário de proceder obrigatoriamente à renegociação da dívida antes de recorrer a processo judicial, ainda que o valor em dívida seja manifestamente inferior ao valor tributário da casa de morada de família, como é o caso dos autos. Termos em que deve ser admitido o presente recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo, tudo no lermos do artigo 78.º da L.T.C., e com as legais consequências.» 3. Admitido o recurso (cfr. fls. 63) e subidos os autos a este Tribunal Constitucional, foram as partes notificadas para alegar. Apenas o recorrente apresentou alegações, que concluiu nos seguintes termos (cfr. fls. 73-74): «1 – A norma em questão não estabelece qualquer critério de ponderação, como devia, dos interesses em causa, limitando-se a estabelecer um único critério – somente o prazo para pagamento da dívida –, dando, dessa forma, sem qualquer justificação, maior proteção ao credor, ainda que esteja em causa a casa de morada de família e inde- pendentemente do valor desta e do valor da dívida exequenda. 2 – O Tribunal a quo, ao decidir nos termos em que o fez, julgando a oposição improcedente, entendendo que não se encontram violados os princípios da proporcionalidade e adequação da penhora, no caso concreto, e na interpretação que faz da norma, não valorou, como devia, por a norma em causa não estabelecer qualquer critério, para além do prazo de pagamento da dívida, o facto de o imóvel em causa não ter sido dado como garantia para pagamento do crédito em execução nos autos (porque, seguramente, não foi pedido pelo credor, por ter entendido

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