TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

618 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 19. Por outro lado, não se vislumbra também em que medida possa resultar violado o princípio da igualdade, nos termos invocados pelo recorrente no seu requerimento de interposição de recurso (segundo o recorrente, existe um regime menos favorável para o devedor não hipotecário, na medida em que, e ao contrário do devedor hipotecário, o devedor comum não beneficia do regime legal imposto ao credor hipo- tecário de proceder obrigatoriamente à renegociação da dívida antes de recorrer a processo judicial). Na verdade, para além de o recorrente não chegar a indicar o regime legal a que se refere, sempre se dirá que as diferenças existentes entre os créditos que disponham de uma garantia real (cuja execução, conforme se referiu, começa pela penhora do bem dado em garantia) e aqueles em que não se mostrem especialmente garantidos, podem sempre justificar um regime jurídico diferenciado, designadamente no que respeita à rene- gociação da dívida. Por outro lado, no caso de créditos comuns, nada impede as partes de, na pendência da execução, fazendo uso da liberdade negocial que lhes assiste, procederem à renegociação da dívida, podendo designadamente convencionar o seu pagamento em prestações (cfr. artigo 806.º e seguintes do CPC de 2013). III – Decisão Nestes termos, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 751.º, n.º 3, alínea b) , do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, na sua redação originária, segundo a qual, ainda que não se adeque, por excesso, ao montante do crédito exequendo, é admissível a penhora do imóvel que seja habitação própria permanente do executado e sua família, mesmo que esse imóvel não tenha sido dado em garantia para o pagamento da dívida exequenda, quando esteja em causa uma dívida superior a metade do valor da alçada do tribunal de primeira instância e a penhora de outros bens presumivel- mente não permita a satisfação integral do credor no prazo de dezoito meses; e, em consequência, b) Negar provimento ao recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta, ponderados os critérios estabelecidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (cfr. o artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma). Lisboa, 22 de outubro de 2019. – Pedro Machete – Fernando Vaz Ventura – Mariana Canotilho (vencida, nos termos da declaração de voto junta) – Manuel da Costa Andrade. DECLARAÇÃO DE VOTO Votei vencida. Discordo da ponderação de bens e direitos fundamentais que sustenta a posição que teve vencimento no Acórdão. A aplicação da norma questionada no presente processo («ainda que não se adeque, por excesso, ao montante do crédito exequendo, é admissível a penhora de bens imóveis ou do estabelecimento comercial desde que: b) [a] penhora de outros bens presumivelmente não permita a satisfação integral do credor no prazo de 18 meses, no caso de a dívida exceder metade do valor da alçada do tribunal de 1.ª instância e o imóvel seja a habitação própria permanente do executado” – n.º 3 do artigo 751.º do Código de Processo Civil) terá como consequência, se seguidos os normais trâmites legais, da penhora à venda executiva do imóvel, deixar sem casa oito pessoas, em situação de comprovada fragilidade económica, incluindo menores, para liquidação de uma dívida de 28 427,63 Euros, com origem num crédito pessoal de 27 778,85 Euros, concedido por uma instituição bancária. Não vejo como possa esta ser uma ponderação proporcional e, consequentemente, conforme à Constituição.

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