TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

627 acórdão n.º 623/19 V) Relativamente à remoção da “proibição de poluir” e/ou suportar impactos negativos da exploração de postos de abastecimento, há que reconhecer que o cumprimento das múltiplas regras técnicas a que devem obedecer os postos de abastecimento de combustíveis, no essencial, as da Portaria n.º 131/2002, de 9 de fevereiro, permite justamente que a lesão dos recursos naturais tenha uma expressão mínima, razoável e sustentável. VI) O que significa que os riscos ambientais potencialmente existentes foram devidamente considerados, no âmbito de um procedimento de licenciamento levado a cabo por outra entidade que não o Município de Vila Nova de Gaia. VII) De todo o modo e sem conceder, sempre se dirá que a apontada justificação da taxa cobrada por referência à poluição alegadamente causada pelo funcionamento do posto de abastecimento em questão, poderia, quanto muito, ser suscetível de classificar o tributo como contribuição especial, designadamente na categoria de “contribuições para maiores despesas” (entendidas como aquelas em que a prestação devida pelos particulares encontraria a sua razão de ser no facto de estes ocasionarem com a sua atividade um acréscimo de despesas para as entidades públicas). VIII) No entanto, esta situação acaba por não ter qualquer relevo prático, porquanto a criação deste tipo de contri- buição fica igualmente de fora da competência das Câmaras Municipais, uma vez que tem a mesma exigência formal que os impostos (vide neste sentido acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2009, de 14/01/09, in www.tribunalconstitucional.pt ) . IX) Já no que toca às ações de fiscalização que o Município de Vila Nova de Gaia estaria alegadamente obrigado a fazer, de forma permanente, no domínio da prevenção de riscos e da proteção ambiental não se dá como certo que elas ocorram, bastando a existência de uma presunção suficientemente forte. X) Sucede que, “a prestação administrativa de um serviço público, como contrapartida da taxa, não pode cons- tituir um dever cuja realização seja deixada ao puro alvedrio das entidades públicas. Sob pena de se descarac- terizar o conceito de taxa, enfraquecendo o sinalagma e, nele, a exigibilidade, a conexão específica entre as utilidades proporcionadas e o particular onerado com ela, exige a vinculação a uma prestação concreta e não uma mera presunção da existência de eventual prestação” (vide neste sentido, declaração de voto do Exmo. Sr. Juiz Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro, in Acórdão do TC n.º 316/14). XI) É certo que, entre o enunciado exemplificativo das taxas municipais, a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de dezembro, figura a «prestação de serviços no domínio da prevenção de riscos e da proteção civil» [artigo 6.º, n.º 1, alínea f) ]. XII) Mas não é menos certo que estes serviços têm de assentar na prestação concreta de um serviço (artigo 3.º). É que o serviço concreto exige utilidades divisíveis (artigo 5.º, n.º 2). XIII) Conforme deixa dito Sérgio Vasques, “(…) a qualificação de um tributo local como taxa exige por princípio que este incida sobre prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo e não apenas sobre prestações de que o sujeito passivo seja o presumível causador ou beneficiário. A proteção do ambiente, a proteção civil ou a promoção do desenvolvimento local podem servir de base de incidência às taxas locais mas apenas quando essas atividades se materializem em prestações públicas concretas, de que os respetivos sujeitos sejam os efetivos causadores ou beneficiários e nunca quando elas tomem a forma de prestações públi- cas difusas (…)”, sublinhado nosso (vide “Regime das Taxas Locais – Introdução e Comentário, p. 116). XIV) Em face do supra exposto, deverá concluir-se que o tributo em causa, previsto nos artigos 55.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público e 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas ambos do Município de Vila Nova de Gaia, não poderá ser qualificado como taxa, sendo ao invés um verdadeiro imposto. XV) Nesta medida, a mencionada norma regulamentar, constante dos artigos 55.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, do Regulamento Municipal da Defesa da Paisagem, Publicidade e Ocupação do Espaço Público e 25.º, n.º 3, da Tabela de Taxas do Regulamento de Taxas e Outras Receitas ambos do Município de Vila Nova de Gaia, tal como foi interpretada (e aplicada) pelo douto acórdão recorrido, viola as normas contidas nos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i) , da CRP, quando estão em causa postos de abastecimento de combustíveis líquidos situados inteiramente em propriedade privada (ou que não ocupem qualquer porção de território

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