TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

637 acórdão n.º 623/19 15. A mesma conclusão pode ser alcançada a partir da consideração da própria licença de exploração de postos de abastecimento de combustíveis. Aliás, e como referido, foi essa a via ensaiada pelo tribunal de primeira instância para fundamentar o seu juízo de não inconstitucionalidade. Para o efeito, foi considerada a jurisprudência do Tribunal Constitucional vertida no seu Acórdão n.º 177/10. Naquele Acórdão o Tribunal Constitucional ultrapassou “o argumento restritivo de que as taxas com funda- mento na remoção de um obstáculo jurídico, tivessem que permitir a utilização de um bem do domínio público, sob pena de ser qualificadas como impostos ou figuras que seguissem o regime destes tributos [… O] Tribunal Constitucional reconheceu, em plenário, o caráter excessivamente restrito da tese que vinha subscrevendo nas últimas duas décadas. E, nessa medida, passou a consagrar que, para a aferição da legitimidade da remoção de um obstáculo jurídico como fundamento das taxas, é determinante aferir se esse obstáculo é real, genuíno, ou se foi arbitrariamente criado” (é a síntese de Nuno de Oliveira Garcia e Andreia Gabriel Pereira, “A nova jurisprudência das taxas municipais pela colocação de painéis publicitários em domínio privado” in Direito Regional e Local , n.º 15, julho-setembro de 2011, pp. 25 e seguintes, p. 33). Foi o seguinte, o raciocínio seguido pelo Tribunal no caso então em apreço: «11. Assente que há prestações conexas, sem mais, ao licenciamento de um comportamento dos particu- lares, a que cabe, também do ponto de vista das valorações constitucionais, a qualificação como taxa, cumpre ajuizar, por último, se o tipo de situações de que o caso vertente é exemplo se integra nessa categoria. Está em causa, como já vimos, a colocação de um anúncio luminoso num prédio particular. Seja qual for a materialidade concreta desse reclamo e o modo do seu posicionamento no prédio – matéria sobre a qual não há elementos nos autos – não sofre dúvidas de que o local de implantação do suporte físico da publicidade se situa em domínio privado, num imóvel de propriedade privada. Mas isso não invalida que, pelo seu modo funcional de ser, a atividade publicitária assente em painéis ou inscrições se projete visualmente no espaço público, interferindo conformadoramente na configuração do ambiente de vivência urbana das coletividades locais. A fixação do âmbito de incidência da taxa em questão leva em conta isso mesmo, pois só são taxados “os anúncios que se divisem da via pública” (observação 1), aplicável às normas do Capítulo IV, em que se integra a do artigo 31.º, da Tabela de Taxas anexa ao Regulamento em causa). Na busca da máxima percetibilidade e do maior impacto da respetiva mensagem junto dos potenciais consumidores ou utentes dos produtos ou serviços publicitados, o anunciante utiliza, com muita frequência, formas agressivas de comunicação, em termos luminosos, gráficos ou, até, de dimensão e destaque físicos, pelo que a visualização tem verdadeiros efeitos intrusivos, no ambiente de vida comunitária. Contrariamente ao que transparece de algumas apreciações, a questão não se resolve, pois, pela simples demarcação “física” dos espaços privado e público, determinando-se a legitimidade da qualificação como taxa pela “ocupação” de um ou de outro, por parte da fonte emissora da mensagem publicitária. «É que – faz-se notar na referida declaração de voto do Conselheiro Benjamim Rodrigues – a utilidade essencial e determinante na ótica do utilizador que o obrigado do tributo obtém pela via do pagamento do tributo não é propriamente a utilidade traduzida na afixação ou inscrição dos anúncios nos bens do domínio privado mas sim, essencial- mente, a utilidade dos mesmos poderem ser visíveis e tidos em conta por quem circula nos espaços públicos planificados pelos municípios e cuja preservação como ecologicamente sadios principalmente lhes compete». A colocação, em prédios de propriedade privada, de anúncios de natureza comercial tem direta e muito marcante incidência “externa”, que extravasa da esfera dominial do respetivo titular. Pela natureza do efeito útil pretendido, ela contende necessariamente com o espaço público, cuja gestão e disciplina compete à edili- dade exercitar. Justifica-se, assim, que a atividade publicitária seja relativamente proibida (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 558/98), ficando sujeita a um licenciamento prévio pelas câmaras municipais, “para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental” (artigo 1.º da Lei n.º 97/88 de 17 de agosto, alterada pela Lei n.º 23/2000, de 23 de agosto).

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