TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

640 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de Sintra e dos seus munícipes, e mais em geral, todo do «espaço público municipal» pela prossecução do interesse econó- mico particular do titular da licença. Este impõe – e ao abrigo da licença tem o direito de impor – àquele Município a obrigação de suportar atividades que interferem permanentemente com a conformação de bens públicos. Aliás, em comparação com aquilo que se passa com a inscrição e afixação de mensagens de publicidade em prédios priva- dos, essa interferência e utilização do espaço público é muitíssimo mais gravosa e intrusiva. Depois, há que retirar todas as consequências da ocorrida transferência de competências. Não se justifica dis- tinguir, para efeitos de taxação referente aos condicionamentos do tráfego e acessibilidades e aos impactes ambien- tais negativos nos recursos naturais – ou seja, relativamente à obrigação do município de suportar atividades que interferem permanentemente com aqueles bens – entre a emissão de licenças de exploração ou suas renovações pela Administração central e a emissão de licenças de exploração ou suas renovações pela câmara municipal. Com efeito, tanto num caso, como no outro, as atividades licenciadas projetam-se da mesma forma e de modo negativo sobre o espaço público municipal. Em terceiro lugar, cumpre ter presente que as taxas a impor com referência ao licenciamento propriamente dito – por exemplo, apreciação dos pedidos de aprovação dos projetos de construção e de alteração ou as visto- rias que antecedem a emissão das licenças – estão previstas no artigo 22.º, n.º 1, alíneas a) e b) , do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, que, no tocante aos respetivos montantes remete, na parte que aqui interessa, para regulamento municipal (cfr. o n.º 2 do citado artigo 22.º). Acresce que as licenças em causa se limitam a veri- ficar que, no momento em que são emitidas, se encontram cumpridos todos os requisitos técnicos. Tais licenças e, por conseguinte, as taxas fixadas com referência às mesmas, pura e simplesmente não tomam em consideração os aludidos condicionamentos e impactes negativos no espaço público municipal. Nem o podiam fazer, uma vez que a disciplina jurídica em causa – na tradição que já vem do regime de 1937 – é uniforme para todo o processo de licenciamento de postos de combustíveis, com abstração da entidade competente para a emissão das licenças, se as câmaras municipais, se a Administração central. Esta última distinção competencial é, como referido anteriormente, uma consequência da opera- cionalização em 2002 da política de descentralização vertida na Lei n .º  159/99, de 14 de setembro. Finalmente, há que ter em conta a longa duração da licença de exploração de postos de abastecimento de combustível: em regra, 20 anos (cfr. o artigo 15.º, n. os  1 e 2, do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro; cfr também supra o n.º 13). Durante todo o período da licença, pode ser exercida a atividade licenciada, que, recorde- -se, impacta negativamente em bens públicos. Ou seja, a remoção do obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares – e não parece poder questionar-se, à luz dos interesses públicos a tutelar, a legitimidade de tal regime de licenciamento – não opera instantaneamente, mas permanece durante todo o período de vigência da licença. Considerando conjuntamente todos estes aspetos, a interrogação que se pode formular é a de saber se um município, obrigado a suportar permanentemente no seu espaço público interferências decorrentes de uma ativi- dade económica sujeita a procedimentos públicos de licenciamento previstos em legislação especial e igualmente aplicável à Administração municipal e à Administração central, que, todavia, não considera nem faz relevar tais impactes negativos para efeitos de fixação das taxas aplicáveis, pode, por sua iniciativa, e em ordem à prossecução das suas atribuições nos domínios afetados pela atividade licenciada, tributá-la, tomando como referência as licen- ças previamente atribuídas. Noutros termos: será que a «remoção do obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares» a que se refere o artigo 3.º do RGTAL, como pressuposto das taxas, é necessariamente específico de uma dada taxa, ou pode ser comum e, por conseguinte, valer para outras taxas conexionadas com dimensões da atividade licenciada não consideradas na fixação da taxa que remove o obstáculo jurídico em causa? O caso sub iudicio exemplifica bem a importância da questão: será compatível com o princípio da autonomia das autarquias locais admitir que estas não possam impor taxas sobre atividades que interferem de forma relevante com bens jurídicos que lhes cabe tutelar apenas porque na legislação especial respeitante ao licenciamento da mesma atividade se consideram exigências diferentes e muito relevantes do ponto de vista técnico, mas que igno- ram por completo a aludida dimensão de interferência permanente com bens públicos municipais? No Acórdão n.º 177/10 este Tribunal entendeu que “a constituição da obrigação passiva de se conformar com essa influência modeladora é justamente a contrapartida específica que dá causa ao pagamento da taxa, estru- turando, em termos bilaterais, a relação estabelecida com o obrigado tributário”. Mas, como mencionado pelo

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