TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
66 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL previamente conservados se enquadram no âmbito de aplicação daquele preceito, conforme foi entendido pelo Tribunal de Justiça no já citado acórdão Tele 2 : «76. Também se enquadra no referido âmbito de aplicação uma medida legislativa que tem por objeto […] o acesso das autoridades nacionais aos dados conservados pelos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas. 77. Com efeito, a proteção da confidencialidade das comunicações eletrónicas e dos dados de tráfego com elas relacionados, garantida no artigo 5.°, n.° 1, da Diretiva 2002/58, aplica‑se às medidas tomadas por todas as pessoas que não sejam os utilizadores, independentemente de se tratar de pessoas singulares ou de entidades privadas ou públicas. Como confirma o considerando 21 desta diretiva, esta tem como objetivo impedir «o acesso» não auto- rizado às comunicações, incluindo a «quaisquer dados com elas relacionados», para proteger a confidencialidade das comunicações eletrónicas. 78. Nestas condições, uma medida legislativa através da qual um Estado‑Membro impõe, com fundamento no artigo 15.°, n.° 1, da Diretiva 2002/58, aos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas, para os efeitos mencionados nesta disposição, a obrigação de conceder às autoridades nacionais, nas condições previstas nessa medida, o acesso aos dados conservados pelos referidos prestadores tem por objeto o tratamento de dados pessoais por parte destes últimos, tratamento que se enquadra no âmbito de aplicação desta diretiva.» Ainda a este respeito, importa indicar o pronunciamento decisório formulado pelo TJUE nessa ocasião em resposta às questões concretas objeto do reenvio em que aquele acórdão foi proferido: «1) O artigo 15.°, n.° 1, da Diretiva 2002/58/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de julho de 2002, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no setor das comunicações eletrónicas (Diretiva relativa à privacidade e às comunicações eletrónicas), conforme alterada pela Diretiva 2009/136/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, lido à luz dos artigos 7.°, 8.° e 11.°, bem como do artigo 52.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que prevê, para efeitos de luta contra a criminalidade, uma con- servação generalizada e indiferenciada de todos os dados de tráfego e dados de localização de todos os assinantes e utilizadores registados em relação a todos os meios de comunicação eletrónica. 2) O artigo 15.°, n.° 1, da Diretiva 2002/58, conforme alterada pela Diretiva 2009/136, lido à luz dos artigos 7.°, 8.° e 11.° bem como do artigo 52.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que regula a proteção e a segurança dos dados de tráfego e dos dados de localização, em especial, o acesso das autoridades nacionais competentes aos dados conservados, sem limitar, no âmbito da luta contra a criminalidade, esse acesso apenas para efeitos de luta contra a criminalidade grave, sem submeter o referido acesso a um controlo prévio por parte de um órgão jurisdicional ou de uma autori- dade administrativa independente, e sem exigir que os dados em causa sejam conservados em território da União.» Este enquadramento à luz do direito da União Europeia é relevante direta e indiretamente: por um lado, determina, por força do princípio do primado daquele ordenamento (relativamente às matérias que relevam das atribuições e competências da União Europeia) e, bem assim, do estatuído no artigo 8.º, n.º 4, da Cons tituição, que as medidas legislativas nacionais adotadas com base na faculdade consagrada no artigo 15.º, n.º 1, da Diretiva 2002/58 respeitem tal disposição, assim como as demais regras e princípios do direito da União, incluindo os direitos e princípios consagrados na Carta (cfr. o respetivo artigo 51.º, n.º1); por outro, justifica a interpretação e aplicação de tais medidas em conformidade com o mesmo direito. Sem prejuízo da competência do legislador nacional para adotar as medidas de acesso previstas na Lei Orgânica n.º 4/2017 se fundar no artigo 15.º, n.º 1, da Diretiva 2002/58, reitere-se que se trata de uma faculdade concedida e não de uma obrigação imposta pelo direito da União Europeia. Por outras palavras, os Estados-Membros são autorizados, dentro de certos limites, a atuar neste domínio, segundo as formas e com as restrições que as suas ordens jurídicas determinam. Ora, encontrando-se os atos dos poderes públicos na
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