TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

677 acórdão n.º 641/19 vista a proporcionar um melhor exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres legalmente estabeleci- dos» (artigo 4.º, n.º 1). Já a proteção jurídica «é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou suscetíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos direta- mente lesados ou ameaçados de lesão» (artigo 6.º, n.º 2) e reveste as modalidades de consulta jurídica e de apoio judiciário. Sem prejuízo, mostra-se pacífica a asserção de que a Lei Fundamental não contempla um direito à administração gratuita da Justiça e que o instituto de apoio judiciário não pode ser perspetivado como um meio generalizado e massificado de acesso ao direito e aos Tribunais, mas antes como «um remédio, uma solução a utilizar, de forma excecional, apenas pelos cidadãos economicamente carenciados ou desfavoreci- dos, e não de forma indiscriminada pela generalidade dos cidadãos, o que não deixa de implicar necessaria- mente, que também o sistema das custas judiciais tenha de ser um sistema proporcional e justo e não torne insuportável ou inacessível para a generalidade das pessoas o acesso aos tribunais», nas palavras do Acórdão n.º 255/07. Por conseguinte, uma vez que a administração da Justiça acarreta custos, aceita-se que o Estado possa repercutir sobre os cidadãos que a ela recorrem os inerentes custos, conquanto «tenha na devida conta o nível geral dos rendimentos dos cidadãos, de modo a não tornar incomportável para o comum das pessoas o custeio de uma demanda judicial, pois, se tal suceder, se o acesso aos tribunais se tornar incomportável ou especialmente gravoso, violar-se-á o direito de acesso aos tribunais» (cfr. Acórdão n.º 102/98, deste Tribu- nal Constitucional). Para esse efeito, reitera o aresto n.º 11/19, expressando jurisprudência jusfundamen- tal consolidada: «tal como o legislador ordinário goza de liberdade normativo-constitutiva, dentro de tais parâmetros constitucionais, para configurar o concreto sistema das taxas de justiça, do mesmo passo goza de discricionariedade legislativa no que importa à modelação do sistema de apoio judiciário, estando, porém, vinculado a prosseguir, nele, aquele escopo constitucional de igualdade material no acesso e na utilização do sistema de justiça, de sorte a não impedi-los ou dificultá-los de forma incomportável para o cidadão.» 8. A margem de discricionariedade legal de que o legislador goza nesta matéria, concatenada com a inexistência de um direito constitucional à administração gratuita da justiça, projetou-se já em matéria conexa com a que constitui o objeto destes autos, de que é exemplo a questão da oportunidade do pedido judiciário. No aresto n.º 215/12, salientou-se que «o apoio judiciário tem sobretudo em vista evitar que qual- quer pessoa, por insuficiência de meios económicos, veja impedido, condicionado ou dificultado o recurso aos tribunais para defesa dos seus direitos ou interesses legítimos, não podendo, contudo, ser visto como meio destinado a obter, após o julgamento da causa e a condenação em custas, a dispensa do pagamento dos encargos judiciais a que a participação no processo deu causa. Por esta razão se tem considerado que não fere os princípios constitucionais a solução segundo a qual não é admissível a dedução de pedido de apoio judiciário após o trânsito em julgado da decisão final do processo, quando se tem apenas como objetivo o não pagamento das custas em que a parte veio a ser condenada por efeito dessa decisão (cfr., neste sentido, entre outros, os Acórdãos n. os  508/97, 308/99, 112/01, 297/01 e 590/01)». É, pois, neste conspecto, que se insere a disciplina legal atinente à aquisição superveniente de meios económicos suficientes, que constitui um corolário da premissa geral de inexistência de um direito constitu- cional à administração gratuita da Justiça. Efetivamente, a definição dos critérios e pressupostos suscetíveis de indiciarem que se mostra mitigada ou ultrapassada a situação de insuficiência económica do requerente de apoio judiciário, constitui matéria que se insere na margem de discricionariedade legal reconhecida ao legislador. De acordo com a decisão recorrida, os n. os 1 e 2 do artigo 26.º-I da Portaria parecem instituir regime dis- tinto do previsto no artigo 13.º da LADT, que comporta um regime de diminuição das garantias de defesa, violador do disposto no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição. Na senda das alegações do Ministério Público, não se crê, porém, que assim seja.

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