TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

723 acórdão n.º 661/19 18 – Pelo que, quando a situação não se mostrasse enquadrável na previsão de tal dispositivo legal a condenação em multa cível – que o não fosse por litigância de má-fé – só seria susceptível de recurso se o valor da causa fosse superior à alçada do tribunal recorrido e a decisão impugnada fosse desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, dependendo, assim, a recorribilidade da decisão não só do valor da causa – que teria de ser superior à alçada do tribunal recorrido – mas também do montante da multa aplicada, que correspon- deria ao valor da sucumbência, e que teria de ser superior a metade da dita alçada. 19 – A entrada em vigor do RCP veio inovar em relação à recorribilidade das decisões que condenam em multa, com a previsão contemplada no n.° 6 do art.° 27.° do mesmo, mormente a referente à expressão nela contida “fora dos casos legalmente admissíveis”, não vem concitando entendimento uniforme. 20 – Para o Cons. Salvador da Costa, in Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado , Almedina, 2009, pág. 329. “a expressão fora dos casos legalmente admissíveis é desadequada porque é susceptível de levar a crer, sobretudo no caso da taxa sancionatória excepcional, que se reporta a cominações fora das espécies proces- suais a que se reporta o proémio do artigo 447.°-B do Código de Processo Civil “, concluindo, ao que parece, que do normativo em causa resultará que o recurso é sempre admissível, independentemente do valor da causa e da sucumbência. 21 – A norma do n.° 6 do art.° 27.° do RCP tem por objetivo introduzir uma regra geral de recorribilidade das decisões de condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória, fora dos casos de litigância de má-fé, de modo a colmatar o bloqueio decorrente do factor condicionante do valor. 22 – Assim, nos termos do n.° 6 do art.° 27.° do RCP, é sempre admissível recurso, independentemente do valor da causa ou da sucumbência, das decisões que condenem em multa, penalidade ou taxa sancionatória excep- cional, fora dos casos de litigância de má-fé, mas apenas em um grau, por paralelismo com o disposto no n.° 3 do art.° 542.° do CPC. 23 – De fato, tal regime recursório encontra justificação na natureza e nos efeitos das decisões sancionatórias, reclamando o duplo grau de jurisdição que na verdade já se encontrava especialmente assegurado para as decisões de condenação em litigância de má-fé nos termos do artigo 542.°, n.° 3, do CPC pelo que fazer depender o recurso do valor das custas é inconstitucional. 24 – Este regime não era isento de críticas, como aquelas que foram expressas por Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 8® edição, pág. 120, nota 217 refere que o n.° 6 do artigo 27.° do RCP visou moderar este regime, passando a prever- se a admissibilidade de recurso, em um grau, de qualquer decisão conde- natória em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis. 25 – Todavia, a redacção do preceito, tal a sua ambiguidade, suscitou fundadas dúvidas interpretativas, diver- gindo os Tribunais ora para considerar que a sua aplicabilidade se restringia aos casos em que a condenação não assentasse em qualquer disposição legal que a previsse (acórdãos da Relação de Coimbra, de 20-6-12, e da Relação. de Lisboa, de 29-4-14, em www.dgsi.pt ), ora para concluir que da mesma decorria a admissibilidade de recurso, independentemente do valor da causa ou da sucumbência (acórdãos da Relação de Coimbra, de 10-9-13, e da Relação de Guimarães, de 26-9-13, em www.dgsi.pt ), o autor aderiu à primeira tese, com argumentos que deixei expressos em Recursos no Novo CPC, 2.ª edição, à margem do artigo 629.° do CPC. Porém, a prolação dos acórdãos do STJ, de 26-3-15 e de 16- 6-15, em www.dgsi.pt despoletou a inversão daquela opinião, convencendo- -me agora os argumentos que foram empregues em tais arestos no sentido de ser mais ajustada ao texto legal e ao elemento de ordem racional o entendimento de que é sempre admissível recurso, ainda que apenas em um grau, independentemente do valor da causa ou da sucumbência. das decisões que condenem em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional, fora dos casos de litigância de má fé, pelo facto de estes já se encontrarem regulados no artigo 542.°, n.° 3.” 26 – Aqui chegados, entre uma interpretação minimalista ou até niilista da recorribilidade das decisões que condenem em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional, salvo os casos de litigância de má fé e uma interpretação, de certo modo, maximalista do n.° 6 do artigo 27.° do RCP, como a sustentada no acórdão-funda- mento, afigura-se mais curial optar por esta, com a restrição acima indicada, por ser a que melhor condiz com a unidade do sistema jurídico e que melhor radica na occasio legis .

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