TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

725 acórdão n.º 661/19 Portuguesa – leis, decretos-leis e decretos legislativos regionais, não sendo admissível que tal matéria seja regula- mentada através de portaria. 35 – Assim sendo, a imposição de restrições de acesso dos cidadãos aos Tribunais por portaria, condicionando o recurso ao valor da nota de custas de parte, além de violar a norma do artigo 112.°, n.° 1, viola também as normas dos artigo 161.° (competência política e legislativa da Assembleia da Republica) e 198.° (competência legislativa do Governo), bem como o artigo 20.° de acesso ao Direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, todos da CRP, e o princípio da separação de poderes. 36 – O direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva não se compadece, por ser discrimi- natória e desproporcionada, com uma restrição de acesso ao recurso judicial com base no valor da acção ou critério da sucumbência. 37 – O acórdão do Tribunal da Relação, ao decidir nos termos decididos, violou princípios e direitos funda- mentais consignados na Constituição da República Portuguesa, desde logo, o princípio da não discriminação no acesso ao direito e aos tribunais. 38 – Mais, o artigo em causa é materialmente inconstitucional por, ao arrepio do artigo 13.°, n.° 2, da Consti- tuição, conduzir na prática a um tratamento desigual em razão da sua situação económica. 39 – Por outro lado, este preceito é inválido por se recusar o direito fundamental ao duplo grau de jurisdição, concedido pelo artigo 20.°, n.° 1, da Constituição e violar o princípio constitucional da protecção jurisdicional efectiva, conduzindo, assim, a uma denegação da justiça por insuficiência de meios económicos. 40 – Todos os cidadãos são iguais perante a lei, a todos sendo assegurado o acesso ao direito e aos Tribunais, para defesa dos seus interesses legítimos. 41 – A ordem jurídica é uma só, pelo que fica sem justificação plausível o facto de se reconhecer o duplo grau de jurisdição penal e recusá-lo na jurisdição cível. A previsão de uma ordem de tribunais ou hierarquia dos tribu- nais judiciais, impõe a existência de pelo menos um recurso dentro dessa hierarquia. Não podemos consentir, em qualquer caso, que possa haver um qualquer obstáculo de natureza económica, que inviabilize o direito de recorrer. 42 – Acresce que, o acórdão proferido viola, ainda, o princípio do Estado de Direito, plasmado no artigo 2.° da C.R.P., a interpretação da lei ordinária que não permite um recurso jurisdicional de reacção contra «erros judi- ciários» ou contra violações jurisdicionais dos direitos fundamentais;  Em virtude da cessação de funções da Relatora originária, foram os autos objeto de redistribuição. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação a) Delimitação do objeto do recurso 9. Nos presentes autos, discute-se a constitucionalidade da norma constante do n.º 3 do artigo 33.° da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, no sentido de que cabe recurso da decisão proferida em um grau, se o valor da nota exceder 50 unidades de conta. “Artigo 33.º Reclamação da nota justificativa (...) 3 – Da decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC . (Destacado). (...).

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