TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

751 acórdão n.º 667/19 Segundo a recorrente, a resposta a esta questão é inequívoca: a circunstância de terem sido estabelecidos acordos com as referidas entidades públicas é, por si só, suficiente para considerar as instituições privadas inte- gradas no sistema nacional de saúde, a operar em condições sociais análogas aos organismos de direito público – e logo, absolutamente inibidas de exercer o direito de renúncia à isenção do IVA consagrada no n.º 2 do artigo 9.º do Código, sob pena de violação do princípio da neutralidade fiscal e do princípio da igualdade. A este Tribunal, importa esclarecê-lo desde já, não cabe discutir se a recorrida se encontra, ou não, integrada no sistema nacional de saúde – esse é um problema a resolver no plano da interpretação do direito infraconstitucional, e que apenas nesse plano releva. Ao Tribunal Constitucional cumpre apenas verificar se o reconhecimento da faculdade de renúncia à isenção do IVA às entidades privadas que hajam celebrado «acordos com subsistemas de saúde públicos» (ou com outras entidades públicas do sector da saúde) é censurável em face do princípio da neutralidade fiscal e da igualdade de tratamento, consagrado no artigo 13.º da Constituição, à luz do qual o TJUE vem afir- mando deverem ser interpretadas as normas que, tal como ocorre com a alínea b) do n.º 1 do artigo 132.º da Diretiva, consagram isenções que não conferem o direito a dedução do IVA suportado a montante. É o que se fará nos pontos seguintes. 16. No âmbito da consecução do mercado interno – justamente aquele em que nos situamos –, a dire- tiva constitui um instrumento privilegiado de ação da União Europeia na medida em que, ao contrário do que sucede com os Regulamentos, vincula os Estados-Membros apenas quanto ao resultado a alcançar, dei- xando às instâncias nacionais a competência para definir, no âmbito das respetivas ordens jurídicas internas, a forma e os meios necessários para o concretizar (artigo 288.º do TFUE). Ora, é certo que, de acordo com a Diretiva, a isenção de IVA em apreço é imposta a todos os «estabe- lecimentos hospitalares, centros de assistência médica e de diagnóstico e outros estabelecimentos da mesma natureza devidamente reconhecidos» que operem «em condições sociais análogas às que vigoram» para os organismos de direito público. Do que decorre que o legislador deverá abster-se de atribuir às entidades que se encontrem nessas circunstâncias a faculdade de renúncia à isenção do imposto (tal como resulta da leitura conjugada dos artigos 377.º e 391.º da Diretiva), o que poria em causa a uniformidade na aplicação do direito da União e contenderia com o princípio da neutralidade fiscal e da igualdade de tratamento, consti- tucionalmente consagrado no artigo 13.º da Constituição. Mas é ao legislador democraticamente legitimado, no exercício da liberdade de conformação que lhe é reconhecida tanto pelo direito da União Europeia como pela Constituição, que compete definir os fatores e critérios que devem preponderar para dar por verificada a analogia de condições sociais que, constituindo o critério de equiparação aos estabelecimentos do sector público, determinará, também para estes, a impossibi­ lidade de optar pela tributação. E, neste contexto, a este Tribunal compete tão-somente verificar se o critério normativo mobilizado na decisão recorrida ofende o princípio da igualdade na sua dimensão de proibição do arbítrio. Com efeito, «não cabe ao juiz constitucional garantir que as leis se mostrem, pelo seu conteúdo, “racionais”. O que lhe cabe é apenas impedir que elas estabeleçam regimes desrazoáveis, isto é, disciplinas jurídicas que diferen- ciem pessoas e situações que mereçam tratamento igual ou, inversamente, que igualizem pessoas e situações que mereçam tratamento diferente. Só quando for negativo o teste do “merecimento” – isto é, só quando se concluir que a diferença, ou a igualização, entre pessoas e situações que o regime legal estabeleceu não é justificada por um qualquer motivo que se afigure compreensível face à ratio que o referido regime, em con- formidade com os valores constitucionais, pretendeu prosseguir – é que pode o juiz constitucional censurar, por desrazoabilidade, as escolhas do legislador.» (Acórdão n.º 546/11; no mesmo sentido vide, entre muitos outros, os Acórdãos n. os  39/88, 302/97, 409/99, 232/03, 12/12 e 157/18). 17. A esta luz, importa, antes do mais, relembrar que a norma em questão visa permitir o exercício do direito a optar pela tributação – recuperando, assim, o correlativo direito a deduzir o imposto suportado a

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