TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

757 acórdão n.º 669/19 Simplesmente e por razões certamente de segurança jurídica, decidiu a lei que estas pessoas não podiam depor, por os seus depoimentos poderem, em abstrato, lançar mais confusão sobre os factos em apreciação, dado o seu handicap psicológico. Mas logo e em clara contradição, diz-nos a lei civil que a capacidade do interdito é equiparável à do menor, exceto quanto às especificidades do instituto (art.º 139.º CC). Em termos antagónicos, os menores não são inca- pazes para depor em Processo Penal (cfr. art.º 131.º CPP), enquanto os interditos o são. Sobre a Constitucionalidade desta incapacidade se vêm debruçando os Tribunais, há mais de dez anos. E, surpreendentemente, não foi o Tribunal Constitucional, no Acórdão citado, o primeiro a suscitar a questão, mas o Tribunal da Relação de Lisboa, nos seus Acórdãos de 22/5/2007, Nuno Gomes da Silva e de 23/11/2010, Paulo Barreto, ambos em www.dgsi.pt . O Acórdão do Tribunal Constitucional citado pelo recorrente, n.º 359/2011, de 12/7, publicado na 2.ª Série do D.R. de 3/10/2011, abordou também a questão. Todos se pronunciaram pela inconstitucionalidade daquela parte do art.º 131.º/1 CPP, mas em casos em que a testemunha era o próprio ofendido e até se tinha constituído assistente. Lembre-se que à prestação de declara- ções pelo assistente são aplicáveis as normas referentes às testemunhas – art.º 145.º/3 C.P.P – e logo, aquele art.º 131.º/1 CPP. Estas decisões basearam-se em vários princípios Constitucionais, como o direito à prova e a uma justiça equi- tativa (artigos 20.º/4 CRP e 6.º CEDH), o acesso ao direito (art.º 20.º/1 C.R.P.) ou o princípio da igualdade com outros portadores de anomalia psíquica grave, mas não declarados interditos e até com os menores (art.º 13.º CRP). Depois destes, sobre a mesma factualidade e no mesmo sentido, se pronunciou ainda o Acórdão da Relação de Coimbra de 9/3/2 016, Inácio Monteiro. Mas, depois de tudo isto uma outra evolução jurisprudencial houve, decorrente do Acórdão do Tribunal Cons- titucional n.º 396/17, de 12/7, publicado na 2.ª Série do D.R de 17/5/2017. Aqui, a matéria de facto era já um pouco diferente, pois estava em causa um ofendido não constituído assis- tente e que era assim simplesmente testemunha e já não sujeito processual interessado. Aqui, a fundamentação do Acórdão já foi buscar um outro princípio Constitucional, além de se referir o direito a uma justiça equitativa. De novo se falou neste princípio Constitucional e de Direito Internacional Convencional, na sua versão rela- tiva à obtenção de uma decisão justa e baseada na procura da verdade material e desta feita, também baseada no princípio Constitucional da proibição do excesso de restrições legais, aos direitos, liberdades e garantias (art.º 18.º/2 CRP). Aí se entendeu, com efeito, que esta restrição não era apta a satisfazer o que se queria fazer prevalecer (a segu- rança e justiça das decisões), pelo que era excessiva, na própria terminologia do art.º 18.º/2 CRP. Entendeu-se como mais adequado à realização da justiça, que caso a caso seja o Juiz a verificar da aptidão física e mental da testemunha, como aliás dispõe o art.º 131.º/2 CPP e que é aplicável aos menores. Aliás, o testemunho prestado deverá ser sempre livremente apreciado pelo Tribunal (art.º 127.º CPP). Aí se diz, nomeadamente que “A questão que aqui se coloca não diz apenas respeito ao depoimento das vítimas, mas ao de qualquer pessoa declarada interdita em razão de anomalia psíquica”. Ou seja: de toda e qualquer testemunha, nem se invocando sequer já, o princípio do acesso ao direito, em que se pressupunha que a vítima era assistente. Ao que acresce que, no caso dos autos, a incapacidade permanente global da testemunha não era de 100% (cem por cento) ou próxima, mas de 60% (sessenta por cento), do que decorre que a mesma teria aptidão psicológica para ainda alguns atos da vida diária.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=