TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

759 acórdão n.º 669/19 Porém, essa decisão não lhe faz a mínima referência e desconhecendo-se a razão dessa omissão desconhece-se também qual a relevância que a alteração legislativa teria no recurso interposto para aquela Relação, o que, certa- mente, afeta o recurso interposto para o Tribunal Constitucional. Por outro lado, a questão da aplicação, neste processo, da alteração legislativa que se verificou, é matéria da exclusiva competência das instâncias. Por tudo isso, parece-nos que o Tribunal Constitucional deverá limitar-se a apreciar o mérito do recurso. 3. Conclusão 1. A norma do artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (na redação anterior à dada pelo artigo 9.º da Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto), na dimensão em que estabelece a incapacidade absoluta para testemunhar de pessoa arrolada como testemunha pelo arguido e que está interdita por anomalia psíquica, é inconstitucional por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição), do processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da Constituição), conjugado com o princípio da proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição) e das garan- tias de defesa arguido (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição). 2. Termos em que deve ser negado provimento ao recurso» 3. Decorrido o prazo, o recorrido não apresentou contra-alegações. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 4. A decisão do Tribunal da Relação de que foi interposto recurso nos presentes autos – o acórdão datado de 25 de março de 2019 – aplicou o artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo Penal na redação que lhe era dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, que manteve aquela que fora introduzida pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro. Nessa redação – recorde-se – o preceito dispunha que: «Qualquer pessoa que se não encontrar interdita por anomalia psíquica tem capacidade para ser testemunha e só pode recusar-se nos casos previstos na lei.» Esse preceito foi alterado pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto, que criou o regime jurídico do maior acompanhado, eliminando os institutos da interdição e da inabilitação, previstos no Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de novembro de 1966. Na redação que lhe passou a ser dada por este diploma, o artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo Penal passou a prever que: «Qualquer pessoa tem capacidade para ser testemunha desde que tenha aptidão mental para depor sobre os factos que constituam objeto da prova e só pode recusar-se nos casos previstos na lei.» Como pode verificar-se, nesta sua nova reda- ção, aquele preceito não implicaria, numa situação como a dos presentes autos, a conclusão pela existência de uma incapacidade para ser testemunha. Em vez de fazer depender a capacidade para ser testemunha da ausência da condição de interdito por anomalia psíquica (ou de outra qualquer condição determinada hete- ronomamente, num processo estranho ao processo penal a que aquela capacidade se refere), o artigo 131.º, n.º 1, do Código de Processo Penal prevê agora um critério autónomo para a aferição daquela capacidade, qual seja o de o individuo apresentar «aptidão mental para depor sobre os factos que constituam objeto da prova». A norma que a decisão recorrida desaplicou foi, portanto, revogada. A decisão que para os efeitos do recurso em apreço figura como decisão recorrida foi prolatada no dia 25 de março de 2019, sendo que, em razão do disposto no seu artigo 25.º, a Lei n.º 49/2018, acima referida, entrara já em vigor no dia 10 de fevereiro de 2019. Apesar disso, foi o n.º 1 do artigo 131.º do Código de Processo Penal na redação dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, que o tribunal recorrido entendeu ser aplicável – e então desaplicou com fundamento inconstitucionalidade –, sendo que se encontra vedada ao Tribunal Constitucional a sindicância desse entendimento, que se situa num plano normativo estrita- mente infraconstitucional. Assim, embora a revogação superveniente de uma norma possa repercutir-se

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