TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

786 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL e independentemente da proporção de cada quota, relativamente à designação das verbas que devem compor, no todo ou em parte, o quinhão de cada um dos herdeiros e os valores por que devem ser adjudicados. 13. Por força do exposto, deverá ser tomada decisão no sentido de julgar materialmente inconstitucional a norma contida no artigo 48.º, n.º 1, do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 5 de março, no segmento em que permite que seja tomada deliberação por maioria de dois terços dos titulares do direito à herança e independentemente da proporção de cada quota, relativamente à designação das verbas que devem compor, no todo ou em parte, o quinhão de cada um dos herdeiros e os valores por que devem ser adjudi- cados, negando, assim, provimento ao presente recurso. Nos termos do acabado de explanar, deverá o Tribunal Constitucional negar provimento ao presente recurso, assim fazendo a costumada Justiça.” 5. No mesmo sentido, a interessada B. apresentou contra-alegações, que sumariou nos seguintes termos (fls. 500 a 524): I. Conclusões A. O objecto dos recursos apresentados prende-se com a decisão proferida pelo Juízo Local Cível de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, no Processo n.º 12223/17.9T8LSB, que recusou a aplicação da norma estabelecida no artigo 48.º do Regime Jurídico do Processo de Inventário (daqui em diante apenas designado por “RJPI”) por entender que o segmento “(...) que permite que seja tomada “(...) deliberação por maioria de dois terços dos titulares do direito à herança e independentemente da proporção de cada quota”, relativamente à designação das verbas que devem compor, no todo ou em parte, o quinhão de cada um dos herdeiros e os valores por que devem ser adjudicadas, é materialmente inconstitucional (...)”.  B. OMinistério Público que interpôs recurso da decisão proferida pelo Tribunal a quo por a isso estar legalmente vinculado, veio, em sede de alegações, acompanhar o entendimento do Tribunal a quo, considerando dever “(...) ser tomada decisão no sentido de julgar materialmente inconstitucional a norma contida no artigo 48.º, n.º 1, do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei n.º 23/2013, de 5 de março (...)” e, em consequência, peticionar que “deverá o Tribunal negar provimento ao presente recurso (...)”.  C. A douta decisão do Tribunal a quo não merece censura, mostrando-se de lapidar clareza e de fundamentação segura e sólida.  D. Na base da decisão proferida pelo Tribunal a quo esteve uma “deliberação” tomada pelos Recorrentes A. e B., em sede de conferência preparatória, os quais, apesar da expressa oposição da ora Recorrida, acordaram que bens – e por que valores – caberiam a cada um dos herdeiros legitimários.  E. Tal “deliberação” é, sob diferentes prismas, juridicamente inadmissível, por violadora dos mais basilares prin- cípios e normas enformadoras do Direito Sucessório em Portugal e, bem assim, por consagrar uma solução frontalmente inconstitucional, por violadora do direito ao Processo Equitativo – como decorrência do Prin- cípio da Igualdade –, do Princípio da Autonomia Privada, do Princípio da divisão por cabeça, do direito à propriedade privada e, bem assim, do Princípio da Proporcionalidade.  F. A solução que decorre da aplicação da norma prevista no artigo 48.º, n.º 1, do RJPI, colide com o Princípio da Intangibilidade da Legítima, estabelecido no artigo 2163.º do Código Civil.  G. Nesse sentido, Fernando Neto Ferreirinha, in Processo de Inventário (reflexões sobre o novo regime jurídi- co – Lei n.º 23/2013, de 5 de março), sustenta que “No citado Regime Jurídico do Processo de Inventário, anotado por Carla Câmara, Carlos Castelo Branco, João Correia e Sérgio Castanheira, diz-se, a propósito desta maioria, a pp. 203: “Note-se, todavia, que esta solução legal, no que respeita à sucessão legitimária, não pode implicar a violação do princípio da intangibilidade qualitativa da legítima, pois não poderá ser possível a co-herdeiros que representem dois terços da herança designarem os bens que integram a respectiva legítima (sob pena de se violar, por via da lei processual, o expressamente proibido na lei substantiva: O artigo 2163.º do Código Civil proíbe ao autor da sucessão designar os bens que devam preencher a legítima contra a vontade do herdeiro legitimário )” (itálico nosso).

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