TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

789 acórdão n.º 680/19 parte dos herdeiros que podem ver a composição dos seus quinhões previamente determinada pelas contra- partes do processo.  AA. A este respeito, defendeu o Tribunal a quo o seguinte: “(...) – aquilo que interessa a todos, todos devem aprovar; – em matéria de Autonomia Privada, rege o Princípio da eficácia relativa dos contratos (cfr. artigo 406.º, n.º2 do Código Civil), razões pelas quais a lei processual proíbe a transacção de um litisconsorte nos casos de litisconsórcio necessário unitário. Ora, no caso do Inventário, dúvidas não existem de que nos encontramos perante um litisconsórcio entre os herdei- ros e que os respectivos interesses se contrapõem. Daí que – interessando a relação processual a todos os herdeiros –, se nos afigure evidente que, não podendo haver – à luz das regras gerais do processo civil – uma transação parcial, por força do disposto no artigo 298.º do Código de Processo Civil, por identidade de razões, também não poderá haver uma “deliberação” por maioria dos herdeiros a qual, em substância, coloca fim ao litígio existentes entre aqueles interessados na partilha. Com efeito, a “deliberação” a que alude o artigo 48.º do RJPI traduz-se em termos práticos numa transacção, isto é, numa composição do litígio que ab initio opôs os herdeiros, obrigando-os a recorrer a processo de Inventário. (...) Na partilha não estamos perante um direito em compropriedade mas, sim, perante vários direitos, (...). O artigo 48.º do RJPI permite uma “deliberação”, que determina os ulteriores termos do processo de Inventário, obviando a que seja agendada conferência de interessados, fase processual que visa a partilha da herança. (...) Ora, verifica-se que o artigo 48.º do RJPI permite que dois herdeiros, cada um com uma quota ideal de 1/3 da herança, afastem um terceiro herdeiro do processo de especificação das quotas que, na sua totalidade, compõem a herança, impedindo-o de discutir qual ou quais os bens que em concreto lhe competirá(ão), bem como o(s) valor(es) pelo(s) qual(uais) todos os bens será(ão) adjudicados” (itálicos nossos).  BB. O Tribunal a quo procurou, sob a égide do Princípio da Proporcionalidade, analisar o fundamento especifico para a diferenciação de tratamento entre herdeiros, tendo chegado à seguinte conclusão: “(...) o conceito de maioria pressupõe o conceito de unidade, o qual, conforme já referido supra, não tem qualquer aplicação ao caso do Inventário. Os herdeiros têm direitos próprios e participam no Inventário em litisconsórcio necessário. Assim, a aplicação de tal regra de maioria num caso em que os herdeiros têm interesses autonomizáveis corresponde à supressão da posição processual e, ipso facto, negocial de um dos herdeiros. A isto acresce que não se encontra qualquer critério para a diferenciação de tratamento entre os herdeiros, isto é, no confronto entre cada uma das posições substantivas dos herdeiros não se vislumbra qualquer outra razão para a solução legal, que não seja a capacidade de formação de uma “maioria”, com exclusão do herdei- ro preterido. Neste quadro, tal consenso de “dois terços” resulta facilitado, no sentido em que os termos do acordo – que inclui a totalidade do acervo hereditário – deixam de ser definidos por três partes, para passarem a (poder) ser definidos apenas por duas. Ora, se por um lado, a exclusão de um dos herdeiros nas negociações afasta qualquer “maioria” que pressupo- ria paridade de posições “na unidade” por outro, parece-nos ainda que a existência de uma “maioria” constitui um método, um critério, e não um fundamento, isto é, nunca se poderia bastar, por si só, como suporte argumenta- tivo ” (itálicos nossos).  CC. O Tribunal a quo analisou ainda, e tal como seria seu dever, se a opção legislativa em causa (a de tornar o processo de inventário mais ágil e célere) passaria, ou não, o crivo do disposto no artigo 18.º da CRP, relativo às restrições de direitos, liberdades e garantias, tendo decido do seguinte modo: “Na nossa interpretação, a via encontrada para assegurar uma maior celeridade do processo passa pela descon- sideração da posição de uma das partes interessadas na composição do litígio, colocando-a na impossibilidade de poder participar num momento essencial do processo de partilha em Inventário , quando inexiste acordo quanto à composição de quinhões, e que corresponde à especificação da quota ideal de que é titular cada herdeiro. Tal solução – na nossa leitura – contraria o Princípio da Autonomia Privada (eficácia relativa dos contratos) e o Princípio da Igualdade de Armas no processo.

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