TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

814 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL concursais com vista à constituição de relações públicas de emprego público por tempo indetermi- nado, para carreira geral, destinados a candidatos que não possuam uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado. III - Relativamente à norma objeto do presente processo, o legislador invocou expressamente, no texto legal, como interesse público justificador a estabilidade orçamental e a necessidade de cumprimento do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF); embora a norma em causa fosse apta a alcançar os objetivos propostos constantes no artigo 66.º, n.º 9, da Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2013 (Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro), pois restringia a abertura de concur- sos para a contratação de novos trabalhadores em funções públicas, o que significa um controlo do aumento das despesas públicas e a solução normativa tinha um carácter excecional e transitório, é de notar o grau intenso de interferência dos membros do Governo sobre a autonomia local decorrente da norma objeto de análise. IV - Dependendo a abertura de procedimentos concursais com vista à constituição de relações jurídicas de emprego público, no âmbito da administração autárquica, obrigatoriamente, da concordância dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da administração pública, a ausência dessa anuência acarreta necessariamente a impossibilidade da contratação dos trabalhadores em causa, levando a falta deste parecer à cominação da nulidade de todo o procedimento, fazendo incorrer os seus autores em responsabilidade civil, financeira e disciplinar, bem como a redução nas transferências do Orçamento do Estado para a autarquia em causa em montante idêntico ao assim gasto; o con- teúdo do parecer em causa não se encontra limitado a questões de legalidade, atribuindo a norma ao Governo o poder de condicionar decisivamente a decisão autárquica formulando juízos de mérito, conveniência ou oportunidade relativamente à abertura do concurso. V - A norma decorrente dos nos n. os  6 e 7 do artigo 6.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, consagra um poder de intervenção governamental quanto à abertura de procedimentos concursais para a cons- tituição de relações jurídicas de emprego público que está previsto no âmbito da administração direta e indireta do Estado – onde pode encontrar justificação nos poderes de direção e de superintendência que sobre estas o Governo exerce; no entanto, a norma objeto de fiscalização de constitucionalidade manda aplicar esse regime à administração autárquica, que tem garantias especiais de autonomia con- sagradas no texto da Lei Fundamental, nomeadamente em termos de ter «quadros de pessoal próprio», não respeitando o estatuto próprio do poder local previsto na Constituição, suscitando, neste âmbito, a problemática da tutela administrativa do Governo sobre as autarquias locais. VI - Analisando o conteúdo e o alcance da solução normativa em presença, pode concluir-se que dela resul- ta o estabelecimento de uma relação tutelar (ou, pelo menos, para-tutelar), atribuindo ao Governo o poder de condicionar a prática de atos na gestão das autarquias; a lei atribui a membros do Governo um poder governamental de controlo prévio sobre a atuação do empregador público autárquico que não se limita a um mero controlo de legalidade – sendo, por isso, violadora da Constituição. VII - Existiam formas alternativas de a lei prosseguir os interesses públicos em causa, restringindo, condi- cionando ou limitando o poder dos empregadores públicos autárquicos de abertura e condução de procedimentos concursais de emprego público dentro dos limites da Constituição; apesar da exis- tência de algumas especificidades e diferenças, o regime aplicável à abertura de concurso por parte das autarquias em situação de desequilíbrio financeiro estrutural ou de rutura financeira, em aspetos

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