TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

820 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Canotilho/ Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, Coimbra Editora, 2007, p. 232). A importância central desta matéria tem como consequência o tratamento jurisprudencial desenvolvido pelo Tri- bunal Constitucional sobre o alcance da garantia constitucional da autonomia local (cfr. A. Maurício, “A garantia constitucional da autonomia local à luz da jurisprudência do Tribunal Constitucional”, in Estudos em homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2003, pp. 625-657). O princípio da autonomia local, de que importa agora tratar, é desenvolvido na Constituição no seu título VIII, relativo ao Poder local, da parte III (Organização do poder político). O enquadramento supralegal das autarquias locais é, ainda, completado pela Carta Europeia da Autonomia Local, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 28/90, de 23 de outubro, e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 58/90, de 23 de outubro, vigente na nossa ordem jurídica por força do artigo 8.º, n.º 2, da Constituição.» Ainda no âmbito de um enquadramento ao regime constitucional das autarquias locais, recorre-se ao Acórdão n.º 420/18, do Plenário, ponto 18.2: «(…) [O] princípio da autonomia local [apresenta-se], no quadro jurídico-constitucional português, como um prin- cípio jurídico ordenador e estruturante da organização – política, administrativa, territorial (qualificando a autonomia municipal como autonomia político-administrativa, André Folque, A Tutela Administrativa nas Relações entre o Estado e os Municípios (Condicionalismos Constitucionais), Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pp. 116 e seguintes) – do Estado português (sobre o tema, desenvolvidamente, José de Melo Alexandrino, Direito das Autarquias Locais, in Paulo Otero/ Pedro Gonçalves (coord.), in Tratado de Direito Administrativo Especial , Volume IV, Almedina, Coimbra, 2010, pp. 11-299, em especial, pp. 77 e seguintes), compreensivamente entendido na relação com outros princípios fundamentais (de que se destacam os princípios da descentralização administrativa, da unidade do Estado, do Estado de direito demo- crático, da democracia, do pluralismo, da participação, da subsidiariedade), a que a Constituição se refere como dimen- são da organização do Estado unitário (artigo 6.º, n.º 1) e componente da organização democrática do Estado (artigo 235.º, n.º 1), estabelecendo, a seu respeito, reservas de lei (designadamente nos artigos 236.º, n. os 3 e 4, 237.º, n. os 1 e 2, 238.º, n. os 2 e 4, 239.º, n.º 4, 240.º, n.º 2, 242.º, n. os 1 e 2, e 243.º), em especial, reservas de competência legislativa parlamentar, absolutas e relativas [artigo 164.º, alíneas l) , m) , n) e r) e artigo 165.º, n.º 1, alíneas q) , r) e aa) ] e erigindo a garantia da autonomia das autarquias locais a limite material de revisão constitucional [artigo 288.º, alínea n) ]. O princípio da autonomia local (cujas fontes não se esgotam no quadro jurídico-constitucional) encontra, assim, na Constituição o acolhimento devido a um princípio fundamental que se revela em diversas vertentes, como, aliás, reconhecido na jurisprudência constitucional que se tem pronunciado sobre a garantia constitucional da autonomia do poder local.» Desenvolvendo a garantia constitucional da autonomia do poder local, o Acórdão n.º 450/19, do Plenário, ponto 18, esclarece que: «Na arquitetura dos poderes que integram o Estado unitário e na correlação entre eles estabelecida, o princípio constitucional da autonomia local (…), assume, nos termos da própria Constituição, uma vertente garantística: ao estabelecer que a “organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais”, enquanto “pes- soas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das popu- lações respetivas”, o artigo 235.º da Constituição “tem um sentido de garantia institucional, assegurando a existência de administração local autárquica autónoma” em todo o território nacional (Acórdão n.º 296/13 [ponto 12]). O recorte desta garantia institucional e a definição do seu exato âmbito têm subjacente a ideia de que as autar- quias locais têm por objetivo, “a prossecução de interesses próprios das populações respetivas (artigo 235.º, n.º 2)”; e que, tal como decorre do artigo 3.º, n.º 1, da Carta Europeia da Autonomia Local, tal objetivo “pressupõe e exige, entre outros, o direito e a capacidade de as autarquias regulamentarem e gerirem, nos termos da lei, sob a sua responsabilidade e no interesse das respetivas populações, uma parte importante dos assuntos públicos” (Acórdão n.º 296/13 [ponto 12]). »

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