TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

837 acórdão n.º 689/19 Desde logo, anota-se que quanto à decisão de excecional complexidade o recorrente não impugnou os seus fundamentos, ou seja, as razões que levaram o tribunal a deferir tal pretensão. O arguido assenta a arguida nulidade desta decisão por não lhe ter sido permitido o acesso aos autos, o que entende ter prejudicado a seu direito de defesa. Não temos dúvida de que o acesso pelos arguidos a elementos do inquérito que decorra com exclusão da publi- cidade possa ter importância fundamental para o exercício de direitos de defesa. Mas não é este o caso dos autos. Desde logo, o arguido não fundamentou minimamente tal requerimento, visando apenas o total “acesso a todos os elementos de prova de que o Ministério Público faz depender a sua pretensão face à declaração de excecional complexidade”, sem especificar qualquer elemento de prova, ou questionar qualquer aspeto relevante, sendo que os meios de prova e as razões pelas quais o Ministério Público requereu a especial complexidade vinham explícitos na sua promoção que se traduziram, no essencial, na enumeração das diligências investigatórias em curso e a realizar. Além disso, o arguido tinha o conhecimento efetivo do conteúdo dos elementos do processo que fundamentaram o juízo sobre a verificação dos pressupostos da medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada. Em face desta pretensão do recorrente, o Ministério Público veio então a opor-se ao acesso aos autos, conside- rando, fundadamente, que tal acesso na dimensão requerida poderia prejudicar a investigação, vindo o Sr.° Juiz de instrução a considerar justificado o indeferimento do Ministério Público, sendo esta decisão do juiz de instrução irrecorrível (cfr. artigo 89.°, n.° 2, CPP). Neste quadro, muito bem se refere no despacho recorrido “… que o exercício do contraditório quanto à pro- movida declaração de excecional complexidade dos autos não exige o conhecimento efetivo do conteúdo de cada um dos atos processuais praticados num processo sujeito a segredo de justiça, apenas a sua composição e objeto genérico, que nenhum aspeto relevante foi questionado pelo arguido e que não se vislumbra, com razoabilidade que o arguido deva ter, para estes efeitos, um acesso superior ao que resulta da aplicação de medidas de coação, ponderando a restrição de liberdade que estas representam…”. Efetivamente, o particular direito de audição do arguido nos temos do artigo 215.°, n.° 4, do CPP, em face das normas processuais aplicáveis, é cumprido com o mero conhecimento pelo arguido de que a questão da excecional complexidade vai ser apreciada, permitindo ao arguido que venha alegar o que tiver por conveniente, ficando ape- nas a conhecer as respetivas razões no despacho a proferir após tal audição, despacho sujeito a recurso. Mostra-se assim concretizado o direito de audição do arguido. Em face do exposto, não se vislumbra a existência de nulidade de que padeça a decisão de declaração de exce- cional complexidade, mostrando-se cumpridas todas as formalidades legais, e na substância não se vislumbra neste procedimento qualquer prejuízo para o arguido que pudesse colocar em causa o seu direito de defesa. – Por fim, refira-se que o recorrente vem ainda colocar a questão da inconstitucionalidade desta interpretação do artigo 215.°, n.°s 3 e 4, do CPP, por violação do disposto no artigo 32.°, n.° 5, do CRP, mais concretamente no sentido de que, estando o inquérito sujeito a segredo de justiça, o arguido não tem direito de acesso aos autos para consulta dos mesmos, em caso de requerimento de declaração de excecional complexidade, cumprindo-se o direito de audição com a notificação do requerimento do Ministério Público. Nesta perspetiva, e em vista do que acima se deixou exposto, esta situação processual sempre se integraria nas situações em que a Constituição admite restrições aos direitos, liberdades e garantias fundamentais, cingindo-se essas limitações ao estritamente necessário para salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos – artigo 18.°, n.° 2, da CRP – mostrando-se a eventual restrição sempre justificada pela salvaguarda de outro direito fundamental ou de outros interesses constitucionalmente protegidos, estando subjacente sempre um princípio de razoabilidade, ínsito no princípio da proporcionalidade. Somos assim a concluir que o despacho recorrido não viola qualquer norma processual penal, nem de natureza constitucional, não padecendo de qualquer nulidade.» 7. É desta decisão de 25 de setembro de 2019 que vem interposto o presente recurso de constitucio- nalidade, tendo o recorrente delimitado, no requerimento de interposição do recurso, o objeto respetivo como correspondendo à interpretação da norma constante do artigo 215.º, n. os 3 e 4, do Código de Processo

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