TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

838 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Penal (CPP), com o sentido de que, promovendo o Ministério Público a especial complexidade do processo, o arguido, caso o requeira, tem direito de aceder aos elementos de prova em que se funda a pretensão do Ministério Público a fim de emitir pronúncia, sob pena de a mesma padecer de inconstitucionalidade mate- rial por violar o princípio do contraditório previsto no artigo 32.º da Constituição (CRP), designadamente o seu n.º 5. Resultando evidenciado que o recorrente incorreu em lapso manifesto na enunciação do objeto do recurso, formulando a interpretação normativa cuja inconstitucionalidade sindica na positiva, e tendo tal sido também sinalizado pelo tribunal a quo na apreciação da invocada inconstitucionalidade, que reformulou o enunciado apresentado pelo recorrente no sentido negativo, foi determinada, neste Tribunal, por despa- cho de 16 de outubro de 2019, a notificação para a prolação de alegações relativamente à «norma constante do artigo 215.º, n. os 3 e 4, do CPP, na interpretação de que promovendo o Ministério Público a especial complexidade do processo, o arguido não tem direito de aceder aos elementos de prova em que se funda a pretensão do Ministério Público mesmo que o requeira a fim de emitir pronúncia». ». No despacho em causa usou-se a expressão “especial complexidade”, o que representa um manifesto lapso tendo em conta a letra do preceito em causa, que se refere a “excecional complexidade”. 8. O recorrente veio formular as suas alegações, cujas conclusões se cifram no seguinte: «1. O contexto da problemática a dirimir centra-se no momento em que o Ministério Público dirige a investi- gação contra cidadãos privados da liberdade; 2. O combate ao crime implica, em determinadas circunstâncias, que o acesso ao inquérito seja vedado ao arguido; 3. Porém, nesta compressão dos direitos do arguido o legislador entendeu que por vezes o arguido tinha o direito de aceder a determinados elementos do processo em segredo de justiça; 4. A limitação do acesso a determinados elementos do processo tem de ceder quando estiver em causa uma decisão que respeite à liberdade do arguido; 5. Nesse sentido o legislador entendeu que o arguido tinha o direito de aceder aos meios de prova indicados pelo Ministério Público em sede de 1.º interrogatório para aplicação das medidas de coação; 6. O artigo 215.º, n.º 3, do CPP veio permitir o alargamento do prazo de prisão preventiva, dependendo da verificação de determinados requisitos; 7. O legislador fez depender a declaração de especial complexidade do processo, da audição prévia do arguido, no sentido de se pronunciar sobre a verificação ou não desses requisitos; 8. Para o arguido se pronunciar sobre a verificação desses requisitos tem de conhecer os elementos que susten- tam o pedido formulado pelo Ministério Público; 9. O desconhecimento do arguido, dos elementos que sustentam o pedido formulado pelo MP, impede-o de exercer o contraditório, quer no momento em que o JIC vai decidir do alargamento do prazo, quer ainda em sede de impugnação da decisão do Tribunal em sede de recurso; 10. De resto, o Tribunal Constitucional já se pronunciou, pelo menos, por duas vezes sobre questões análogas apesar de respeitarem ao 1.º interrogatório, mas com a semelhança de o arguido aceder aos elementos indicados pelo MP num processo em segredo de justiça; 11. É esta também a Jurisprudência do TEDH: “O Tribunal reconhece a necessidade de uma condução eficaz dos inquéritos penais, o que pode impli- car que uma parte das informações recolhidas durante essas investigações devam ser mantidas secretas a fim de impedir os suspeitos de alterar as provas e de prejudicar a boa administração da justiça. No entanto, este objetivo legítimo não deve ser perseguido à custa de restrições importantes infligidas aos direitos da defesa. Consequentemente, as informações essenciais para apreciar a legalidade da detenção de uma pessoa devem ser postas à disposição do advogado do suspeito de modo adequado à situação.”

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