TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

845 acórdão n.º 689/19 crime» e, finalmente, a elevação em seis meses dos prazos correspondentes às segunda e terceira situações, no caso de haver recurso para o Tribunal Constitucional.  15. Para o presente recurso interessa-nos a terceira situação, prevista no n.º 3 do artigo 215.º, devendo notar-se ainda que, de acordo com o n.º 4, a «excecional complexidade apenas pode ser declarada durante a 1.ª instância, por despacho fundamentado, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, ouvidos o arguido e o assistente». Assim, é de apreciar no contexto do presente processo a constitucionalidade da interpretação normativa segundo a qual, promovendo o Ministério Público a excecional complexidade do processo, o arguido não tem direito de aceder aos elementos de prova em que se funda tal pretensão, mesmo que o requeira a fim de emitir pronúncia, extraída do artigo 215.º, n. os 3 e 4, do CPP. De acordo com o que acima ficou já assinalado em sede de apreciação da questão prévia no ponto 12, o sentido da expressão «elementos de prova em que se funda a pretensão do Ministério Público» constante do enunciado normativo em análise reporta-se também ao conteúdo dos meios de prova e meios de obtenção de prova aludidos na promoção do Ministério Público e reporta-se a processo em segredo de justiça. ii) Decisão de declaração de excecional complexidade do processo e princípio do contraditório 16. O recorrente invoca a inconstitucionalidade da referida interpretação normativa, por violação do disposto no artigo 32.º, n. os 1 e 5, da Constituição. A base da sua argumentação assenta no entendimento de que a limitação do acesso a determinados elementos do processo tem de ceder quando estiver em causa uma decisão que respeite à liberdade do arguido existindo – no entender do recorrente –, um paralelismo da decisão que declara a excecional complexidade do processo com a decisão de aplicação das medidas de coação, em especial a medida de coação de prisão pre- ventiva, em sede de 1.º interrogatório, em que o legislador entendeu que o arguido tinha o direito de aceder aos meios de prova indicados pelo Ministério Público. Lembrando que o legislador fez depender a declaração de excecional complexidade do processo, da audição prévia do arguido, no sentido de se pronunciar sobre a verificação ou não desses requisitos, sustenta o recorrente que, para o arguido se pronunciar sobre a veri- ficação desses requisitos tem de conhecer os elementos que sustentam o pedido formulado pelo Ministério Público. O seu desconhecimento impede-o de exercer o contraditório, quer no momento em que o juiz de instrução criminal vai decidir do alargamento do prazo, quer ainda em sede de impugnação da decisão do Tribunal em sede de recurso. 17. O Tribunal Constitucional já foi chamado a pronunciar-se sobre algumas dimensões da decisão de declaração de excecional complexidade do processo, prevista no artigo 215.º, n. os 3 e 4, do Código de Pro- cesso Penal, em especial referentes ao estabelecimento do contraditório. Nesse âmbito, não merece dúvida a necessidade de respeitar o princípio do contraditório na decisão que declara a excecional complexidade do processo. O Tribunal Constitucional tem vindo a afirmá-lo reiterada- mente. No Acórdão n.º 555/08, 2.ª Secção (disponível no sítio do Tribunal Constitucional, onde podem ser encontrados os restantes arestos doravante citados), em que se questionava a constitucionalidade do artigo 215.º, n.º 4, do CPP, em dois sentidos distintos, sendo que um deles se reportava especificamente a uma situação de declaração oficiosa da excecional complexidade sem ter sido assegurada a prévia audição do arguido, o Tribunal referiu que «a “especial complexidade do procedimento” é qualificação que, nos termos do n.º 3 do artigo 213.º do CPP, acarreta a elevação dos prazos de prisão preventiva. Por conseguinte, a deci- são afeta-o pessoalmente, incidindo diretamente no núcleo do seu direito fundamental à liberdade, pois é suscetível de provocar a extensão temporal de uma medida de coação que o priva desse bem primário, sendo certo que, por imperativo constitucional (artigo 32.º, n.º 2, da CRP), ele é presumido inocente. É quanto basta para considerar que aqui se fazem sentir, de forma particularmente intensa, as razões garantísticas que

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