TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

862 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL legislativa da Assembleia da República, pelo que o Governo apenas pode regular tal matéria se devidamente autorizado para o efeito”. 2.3. Passou depois a averiguar-se a Lei n.º 39/2003, de 22 de agosto – ao abrigo da qual o CIRE fora aprovado –, habilitava o Governo a editar uma norma correspondente à interpretação normativa que então estava em causa, mais concretamente se o n.º 2 do artigo 1.º daquela Lei era credencial bastante. Essa disposição legal autorizava o Governo a criar “um processo de execução universal que terá como finalidade a liquidação do património de devedores insolventes e a repartição do produto obtido pelos credores ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência que, nomeadamente, se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente”. Portanto, a questão nuclear era a de saber se esta autorização legislativa habilitava o Governo a legislar sobre a sus- pensão da prescrição de todas as dívidas do insolvente ou do responsável originário, dizendo-se fundamentadamente: “Em suma, o argumento é o de que a suspensão de todas as dívidas do insolvente foi tida como consequên- cia necessária do regime insolvencial que o Governo estava autorizado a adotar, razão pela qual esta regra deve estar necessariamente ao abrigo da lei autorizativa”. Seguidamente, consignou-se: “A doutrina parece sufragar este entendimento, porquanto a justificação dada à regra da prescrição é, justamente, a unidade do processo falimentar, aí concentrando o apuramento de todos os créditos. Só assim se podem tomar as decisões de recuperação da empresa ou de liquidação e, nesse caso, definir o modo de repartição do respetivo produto pelos credores (cfr. Ana Prata, Jorge Morais Carvalho e Rui Simões, cit., p. 288; Maria do Rosário Epifânio, cit., p. 174; Alexandre Soveral Martins, cit., pp. 162 e 170), o que se articula com a suspensão de quaisquer outras ações executivas e o impedimento à propositura de novas ações contra o sujeito declarado insolvente (cfr. Gonçalo Andrade e Castro, «Efeitos da declaração de insolvência sobre os créditos», Direito e Justiça , vol. XIX, Tomo II, p. 290). Isto é, a norma em crise visa um «congelamento da massa», gerando uma «paralisação que a ordem jurídica impõe às vicissitudes jurídicas em curso» (v. Oliveira Ascensão, «Insolvência: efeitos sobre os negócios em curso», Revista da Ordem dos Advogados, Ano 65, 2005, p. 284), o que se liga à natureza de processo de execução universal que o Governo foi autorizado a disciplinar”. Ora, esta é, precisamente, a situação que se verifica nos autos, concordando nós com a posição doutrinal que sobre a matéria foi referida. 2.4. Note-se que a parte seguinte do Acórdão n.º 557/18, foi dedicada, exclusivamente, a demonstrar que as especificidades, no caso de se tratar de um responsável subsidiário, afastavam aquele entendimento. Elucidativamente começa por dizer-se: “Independentemente da bondade desta argumentação no tocante às dívidas exigidas ao devedor insolvente no âmbito do processo de insolvência, o raciocínio não colhe quando em causa está a interpretação normativa que aplica a suspensão prescricional, no processo tributário, ao responsável subsidiário do devedor principal insolvente. Ou seja, a tese segundo a qual a autorização para atuar no domínio do direito falimentar implica o poder de legislar sobre a prescrição de todas as dívidas do insolvente (e, por isso, também tributárias) não tem fundamento quando o responsável tributário não é o insolvente e está fora do processo de insolvência”.  Seguidamente justifica-se a diferença entre as situações, concluindo-se: “Em suma, do ponto de vista do responsável subsidiário, a norma em crise cria uma nova causa de suspensão da prescrição (a insolvência de outrem), declarada em processo em que este não é parte e sem que o Governo haja

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