TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

886 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sem se preocupar, porque de tarefa Inútil se trata, com a reconstrução histórica dos factos, a procura da verdade material, que não raras vezes é bem diferente do relato feito quer pelo MP, quer pelo arguido. Aliás, admitir que um arguido concorde com uma alteração substancial de factos quando daí resulte a imputação de um crime diverso (o que, salvo nos casos de concurso aparente de crimes, conduzirá à absolvição daquele pelo qual está acusado) ou a agravação do limite máximo da pena aplicável (daí podendo resultar a condenação em medida superior ou em pena de diferente e mais gravosa natureza), é algo que não tem qualquer reflexo no dia a dia dos tribunais. Já ao abrigo da anterior redação, tal concordância era uma realidade palpável, dado que o arguido poderia ter interesse em não ter de enfrentar ab initio um novo processo, preferindo aproveitar toda a prova produzida e, porventura, requerer a produção suplementar de prova relativamente aos novos factos. A restrição de direitos, liberdades e garantias como medida de salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucional- mente protegidos só pode ocorrer quando não é possível a adoção de medidas de equilíbrio que assegure tanto uns como outros. Ora, repita-se, tal equilíbrio é possível e foi alcançado ao abrigo da anterior redação do artigo 359.º do CPP. (...)” A este propósito e no mesmo sentido também o voto de vencido proferido pela Ex.ma Sr.ª Conselheira Maria Lúcia Amaral no âmbito do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 226/08 que decidiu não julgar inconstitucio- nal a norma em causa “Depois, tenho dúvidas quanto ao juízo de não inconstitucionalidade que foi proferido. É certo que a pergunta que a decisão recorrida colocava ao Tribunal – por vaga e imprecisa que fosse a sua formulação – dizia respeito ao deficit de proteção de direitos e liberdades pessoais. Pretendia-se saber, afinal, se a norma processual em juízo assegurava suficientemente a proteção necessária de bens jurídicos constitucio- nalmente tutelados. Creio, porém, que além deste problema (cuja complexidade é reduzida pela delimitação do objeto do recurso) se colocava ainda um outro, com ele conexo. A doutrina aborda este segundo problema quando fala de um “mandado [constitucional] de esgotante apreciação de toda a matéria tipicamente ilícita submetida à cognição do Tribunal num certo processo penal”, mandado esse decorrente do princípio ne bis in idem , que torna afinal decisiva a determinação do que seja “o mesmo crime” (Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, p. 978). Tenho pois dúvidas quanto à questão – central – de saber se, no caso, se cumpriu este mandado constitucional.” Por fim dir-se-á que a solução consagrada na norma em apreço confere à acusação (do Mº. Pº. ou particular) um valor fixo e/ou definitivo superior ao do próprio caso julgado das sentenças dado que estas podem ser objeto de (recurso de) revisão em determinados casos e, no limite, até em prejuízo do arguido. De facto permite-se a revisão de sentença, artigo 449.º do C.P. P., p. ex. quando; a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido deter- minantes para a decisão; b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo; c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação; d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Por seu lado confere-se, também, legitimidade para requerer a revisão de sentença ao assistente e ao Mº. Pº. relativamente a sentenças absolutórias, art.º 450 do C.P.P.. Um inquérito mal arquivado poderá sempre, ressalvando a prescrição, ser objeto de reabertura mas uma acu- sação dada com desconsideração de factos e/ou meios de prova (cujo conhecimento poderá inclusive ser posterior

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