TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

891 acórdão n.º 711/19  Na sua redação anterior, o n.º 1 do artigo 359.º dispunha que, «[u]ma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em curso; mas a comunicação da alteração ao Ministério Público vale como denúncia para que ele proceda pelos novos factos.» Este preceito foi objeto de interpretações diversas pelo Supremo Tribunal de Justiça, documentadas na seguinte síntese constante do Acórdão n.º 237/07: «O regime instituído pelo artigo 359.º do Código de Processo Penal de 1987 constituiu uma inovação face ao regime resultante dos artigos 444.º, 447.º e 448.º do Código de Processo Penal de 1929, e se dele resulta, com suficiente clareza, o procedimento a adotar quando se verifique acordo do Ministério Público, do arguido e do assistente quanto à continuação do julgamento pelos novos factos, já o mesmo não ocorre quando se verifica falta de acordo, designadamente por oposição do arguido. A falta de explícita pronúncia do legislador quanto ao procedimento a adotar nesta última hipótese tem dado lugar a diferenciadas soluções doutrinais e jurisprudenciais (cf. António Quirino Duarte Soares, “Convolações”, Coletânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça , ano II, 1994, tomo III, pp. 13‑28, em especial p. 26), sendo de citar, como exemplo dessas posições contrastantes: – o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 28 de Novembro de 1990, proc. n.º 40 909 (Boletim do Ministério da Justiça, n.º 401, p. 443, e Coletânea de Jurisprudência, ano XV, 1990, tomo V, p. 12), que decidiu que, encerrada a discussão da causa, tem que ser proferida sentença (nomeadamente, absolutó- ria ou condenatória) relativamente ao objeto da acusação, mesmo que anteriormente o tribunal tenha veri- ficado situação de alteração substancial dos factos descritos na acusação e a haja comunicado ao arguido, desde que este se tenha oposto à continuação do julgamento pelos factos novos; – o acórdão do STJ, de 28 de Janeiro de 1993, proc. n.º 43 395 ( Coletânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, ano I, 1993, tomo I, p. 178), que decidiu que, comunicada ao arguido alte- ração substancial dos factos e opondo‑se este à continuação do julgamento pelos factos novos, o tribunal deve proceder à comunicação desses factos ao Ministério Público para abertura de inquérito quanto a todos os factos (e não somente quanto aos factos novos), e não havendo lugar a prolação de sentença quanto ao facto por que o arguido estava acusado, devendo ser declarada a suspensão (e não a extinção) da instância; – o acórdão do STJ, de 17 de Dezembro de 1997, proc. n.º 1347/97 ( Coletânea de Jurisprudência – Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça , ano V, 1997, tomo III, p. 257), que decidiu que, no caso de oposição, pelo arguido, ao prosseguimento pelo julgamento depois de indiciada alteração substancial dos factos da acu- sação, nos termos do n.º 1 do artigo 359.º do CPP, deve o tribunal determinar a extração de certidão de todo o processado para remessa ao Ministério Público e ordenar o arquivamento do processo em curso, por se tratar de “situação inequivocamente configuradora de excepção dilatória inominada”, sendo “óbvio que a posição, legitimamente assumida pelo arguido, de não aceitar a continuação do julgamento pelos novos factos, impossibilitaria – como impossibilita – o julgamento imediato não só no que concerne aos factos novos como também quanto aos da atual acusação, por estes serem elementos essenciais comuns a ambos os tipos de crimes, que se apresentam deste modo numa relação de interferência”; mais acrescentando o mesmo acórdão que esta solução não beliscava os direitos do arguido constitucionalmente garantidos, pois ela “não corresponde a recusa de decisão, mas tão‑só a protelamento da decisão final (sobre a factualidade que vier a ser definitivamente apurada e que poderá eventualmente coincidir com os factos da atual acu- sação); e este protelamento tem em vista, como é de todo evidente, tão‑só a real eficácia das garantias de defesa do arguido, possibilitando‑lhe exercer cabalmente os seus direitos de defesa”.» A última solução, de extinção da instância no processo em curso sem pronúncia de mérito sobre os fac- tos pelos quais o arguido vinha acusado e extração de certidão para que o Ministério Público possa proceder pela totalidade dos factos, foi precisamente aquela que a decisão recorrida acolheu, na sequência da recusa de aplicação da solução introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto. Tal interpretação da lei antiga foi objeto de um juízo negativo de inconstitucionalidade no mesmo Acórdão n.º 237/07, tendo-se entendido

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