TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

916 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, em que é recorrente o Ministério Público e recorrida A., CRL, o primeiro interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele Tribunal no dia de 27 de abril de 2018 que desaplicou, com fundamento em violação do princípio do juiz natural consagrado no artigo 32.º, n.º 9, da Constituição, o artigo 4.º, n.º 1, alínea l) , do Estatuto de Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, interpretado no sentido de os tribunais administrativos de círculo serem competentes para conhecer e tramitar execuções de coimas aplicadas por decisões não impugnadas nos tribunais administra- tivos, no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo. 2. A decisão recorrida pronunciou-se sobre a execução instaurada pelo Ministério Público contra a aqui recorrida, com vista à cobrança de coima e custas em que esta fora condenada pela Câmara Municipal de Cascais, declarando o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra – o tribunal a quo – «incompetente em razão da matéria e da jurisdição, para conhecer e tramitar o presente processo de execução de coima não impugnada judicialmente neste TAF, por continuarem a ser competentes os tribunais comuns [criminais]». A decisão recorrida apresenta, para o que aqui releva, o seguinte teor: «(…) [P]or decisão de 09/03/2018, a fls dos autos, o TCA-Sul entendeu julgar competente os TAF, sufragando aquele entendimento do MP bem como o precedente de o Tribunal de Conflitos já ter considerado os TAF com- petentes para a execução de coimas, convocando, nesse sentido, os Acórdãos n.º 066/17, de 08/02/2018 e 060/17, de 11/01/2008, e um Ac do TCA-Sul, que nesses Acórdãos se inspirou. Mas existe flagrante erro da decisão do TCA-Sul, ao carrear os mencionados Acórdãos n.º 066/17, e 060/17, porque os mesmos não respeitam a casos como o presente, de execuções de coimas não impugnadas, mas sim ao caso das impugnações judiciais de decisões CO, – essas sim, como vimos, expressamente contempladas no citado artigo 4-1 -l) , do ETAF – , e a única questão que se discutia não era sequer a da competência material dos TAF para conhecer dessas impugnações das decisões contraordenacionais condenatórias, mas sim e apenas a questão de saber a partir de que data é que se aplica às impugnações o artigo 4-1 -l) , do ETAF, na dita redação de 2015. E, nesse ponto, o Tribunal de Conflitos abriu uma espécie de precedente, ainda que judicial, de considerar os TAF competentes para julgar recursos de impugnação das decisões CO, seja qual for a data da entrega do recurso de impugnação jurisdicional na secretaria da Autoridade Administrativa recorrida, pois tem considerado que releva a data em que o Ministério Público remete esse recurso a juízo, considerando isso como “data da interposição da ação”, aplicando ao direito para-penal, leia-se contraordenacional, uma figura, – a “ação” –, que não existe no Processo Penal (…). Ora quando os TAF executam coimas confirmadas/decretadas pela sentença que julgou o recurso de impug- nação, o título executivo, como em direito penal, é a sentença transitada, pelo que, nesse ponto, o legislador não tinha necessidade, como não teve, de se referir no artigo 4-1 -l) , do ETAF, na redação de 2015, à competência para os TAF executarem as próprias sentenças CO. Ora, a questão dos autos em apreço é outra, a da competência material dos TAF para tramitarem e julgarem processos de execução de coimas não impugnadas judicialmente. E, neste ponto, a decisão do TCA-Sul em presença, atribui aos TAF, por via interpretativa, sem ter na letra do artigo 4-1 -l) , do ETAF/2015 um mínimo de correspondência verbal, uma competência para execução de coimas não impugnadas, que o legislador não atribuiu.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=