TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

971 acórdão n.º 776/19 14) Tal como sucedeu no recurso para o Plenário, rejeitado pelo Acórdão n.º 281/17, também aqui a norma apreciada por ambas as secções do Tribunal Constitucional é manifestamente diferente, pelos mesmos motivos que constam daquela decisão. 15) Para haver verdadeira divergência decisória quanto à mesma norma, seria necessário que o Acórdão fun- damento tivesse partido da mesma dimensão interpretativa e tivesse enveredado por um excurso argumentativo diverso antes de concluir diferentemente, o que manifestamente não sucedeu. 16) Aliás, é seguro dizer que, com base em cada um dos acórdãos, não é possível saber se o sentido decisório seria o mesmo caso tivessem analisado o preceito legal à luz da dimensão interpretativa de que partiu a decisão oposta. Tanto basta para concluir que não se verifica o requisito previsto no artigo 79.º-D, n.º 1, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional, de que «a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade em sentido divergente do anteriormente adotado quanto à mesma norma por qualquer das suas secções» 17) Assim, confrontado o Plenário do Tribunal Constitucional com a inexistência de identidade de normas, deverá decidir de uma de duas formas: ou rejeita agora o recurso para o Plenário, ou pronuncia-se apenas sobre uma das interpretações do artigo 84.º, n.º 5, da Lei da Concorrência em confronto, nos termos do disposto no artigo 80.º, n.º 3, da Lei da Concorrência. III. A inaplicabilidade dos fundamentos do Acórdão n.º 123/18 18) A circunstância de o Plenário do Tribunal Constitucional ter já concluído, no Acórdão n.º 123/18, pela não inconstitucionalidade dos n. os 4 e 5 do artigo 46.º do RSSE em nada vincula o Tribunal Constitucional a decidir em sentido idêntico no presente caso. 19) Desde logo porque o juízo decisório formulado no acórdão n.º 123/2018 assenta, em grande medida, nas especificidades do mercado energético e das funções exercidas pela ERSE. 20) As referências feitas no referido acórdão à importância da «regulação dos mercados energéticos, decorrente da premência das necessidades que satisfazem, da expressão económica da atividade que neles se desenvolve e da importância estratégica da política que lhes diz respeito», bem como a alusão às especificidades do mercado energético, designadamente por referência à sua dimensão transnacional e à regulação europeia, foram alguns dos fundamentos a que recorreu o Tribunal Constitucional para justificar a relevância da exequibilidade imediata das decisões que apliquem coima naquele setor. 21) Portanto, para além de ter um âmbito de atuação relativamente reduzido, a ERSE atua num setor espe- cializado, fortemente regulado, onde todos os players têm um dever de conhecimento e cumprimento normativo qualificados, onde a atividade dos regulados se encontra sujeita a licenciamento prévio, onde tendencialmente operam apenas grandes empresas e que tutela o funcionamento de Serviços Públicos Essenciais, tal como definidos na Lei n.º 23/96. 22) O mesmo não sucede no direito da concorrência em que não está em causa uma regulação setorial, mas sim uma regulação transversal a todos os operadores económicos do mercado, independentemente da respetiva dimensão e da concreta relevância do impacto da eventual prática anticoncorrencial. 23) Não existe uma apertada malha regulatória, não existe licenciamento prévio, não existe sequer uma limi- tação estanque e consensualmente aceite quanto ao seu âmbito subjetivo de aplicação, e, ao invés de se regularem serviços públicos essenciais, regulam-se interesses de cariz estritamente económico. 24) A diferença entre os âmbitos objetivo e subjetivo de aplicação de cada um dos regimes, bem como entre a natureza dos interesses aí tutelados, é o suficiente para mudar as coordenadas em que assentou a decisão do Tribu- nal Constitucional no Acórdão n.º 123/18. 25) Assim sucede, desde logo, porque (i) estão em causa interesses de relevo inferior aos que subjazem à regu- lação dos mercados energéticos, o que resulta, por exemplo, da extensa regulamentação legal nesta matéria, da exis- tência de procedimentos de licenciamento próprios, da importância das necessidades que tutelam e da sua impor- tância estratégica, (ii) o impacto dos ilícitos de natureza jus-concorrencial, tendo em conta o universo total de operadores económicos, será tendencialmente menos gravoso do que o que resulta dos ilícitos no setor energético, incidentes sobre um mercado setorial, (iii) sendo a sujeição ao regime jurídico da concorrência uma consequência

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