TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

984 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Porém, sem razão. Não obstante depararmos com elementos de diversidade – que têm a ver apenas com a distinta sin- gularidade do caso decidendo – é evidente que existe contradição na solução jurídica que é dada à questão jurídico-constitucional apreciada nos dois Acórdãos. É certo que há diferenças entre as formulações que constam da parte decisória dos Acórdãos em colisão: enquanto o Acórdão fundamento faz referência aos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, o Acórdão recorrido apenas menciona o n.º 5; e enquanto o Acórdão recorrido faz menção à «caução em substituição», o Acórdão fundamento refere apenas a «caução», sem qualquer outra indicação. Mas essas diferenças não implicam sem mais a diversidade de questões jurídico-constitucionais, posto que se referem apenas a elementos que não afetam a identidade do problema resolvido em ambos Acórdãos. Com efeito, é irrelevante que o Acórdão fundamento – Acórdão n.º 376/16 – tenha feito referência ao n.º 4 do artigo 84.º e o Acórdão recorrido – Acórdão n.º 445/18 – não lhe faça menção, pois o enunciado da norma que foi julgada inconstitucional por este Acórdão contém expressamente o segmento normativo enunciado em tal número: «a impugnação judicial de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coima tem, em regra, efeito devolutivo». Ou seja, o enunciado da norma extraída do n. º 4, segunda a qual «o recurso tem efeito meramente devolutivo», apesar da diferente formulação linguística, não deixa de estar revelado em cada uma das normas que constituem o objeto material dos recursos em que foram proferidos aqueles Acórdãos. Também, por sua vez, é irrelevante que, para determinar a identidade da questão jurídica apreciada em ambos os Acórdãos, num deles se mencione a «caução» como pressuposto do efeito suspensivo da impug- nação e no outro se faça referência à «caução em substituição», a fórmula que legislador utiliza no n.º 5 do artigo 84.º. É verdade que a parte decisória do acórdão fundamento sindica uma norma extraída desse pre- ceito, enunciando a «caução» como um dos requisitos da suspensão da eficácia da decisão sancionatória de aplicação da coima, sem conter a formulação legal «caução em substituição». Porém, o objeto do recurso em que foi proferido esse Acórdão foi delimitado tendo em conta tal expressão: «o objeto do recurso de consti- tucionalidade restringe-se à norma extraída do artigo 84.º, n. os 4 e 5, da Lei da Concorrência, segundo a qual a impugnação interposta de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coima tem, em regra, efeito devolutivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando a execução da decisão cause ao visado prejuízo considerável e este preste caução, em sua substituição, no prazo fixado pelo tribunal». Ora, foi justamente na delimitação do recurso que o Tribunal afastou do seu objeto a questão da possibilidade de o juiz valorar as circunstâncias concretas da prestação da caução, em particular a eventual insuficiência de recursos financeiros das empresas visadas para prestação da própria caução. Portanto, o segmento normativo do n.º 5 do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que condiciona o efeito suspensivo do recurso à prestação de caução em substituição, quando interpretado no sentido de que o montante da caução é equi- valente ao valor da coima, sem ponderação do caso concreto, não foi dimensão normativa autonomamente convocada no recurso. E daí a irrelevância de se ter omitido na parte decisória do Acórdão fundamento a expressão «em sua substituição». Porém, já não seria irrelevante, como elemento de diversidade das normas sindicadas, se essa dimensão normativa constituísse fundamento jurídico do juízo de inconstitucionalidade efetuado no Acórdão recor- rido. É o que entendem as recorridas quando referem que o Acórdão recorrido, ao remeter ipsis verbis para o Acórdão n.º 674/16, decidiu sobre a mesma norma que foi considerada nesse recurso, e por isso, tal como foi decidido no Acórdão 281/17, não há oposição com o Acórdão fundamento, uma vez que ambos incidiram sobre diferentes dimensões normativas das disposições dos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei da Concorrência. É verdade que o Acórdão n.º 281/17 – que decidiu um recurso destinado a uniformizar jurisprudên- cia contraditória das secções, contida nos Acórdãos n. os 376/16 e 674/16 – julgou que «na sua substância, não existe coincidência entre a norma que prevê que a impugnação interposta de decisões da Autoridade da Concorrência que apliquem coima tem, em regra, efeito devolutivo, apenas lhe podendo ser atribuído efeito suspensivo quando a execução da decisão cause ao visado prejuízo considerável e este preste caução, e

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