TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

987 acórdão n.º 776/19 compressão excessiva das garantias de defesa previstas no artigo 32.º, n. os 2 e 10, em articulação com o artigo 18.º, n.º 2, da Constituição».  De facto, é preciso ter presente que a determinação do parâmetro constitucional aplicável não pode deixar de estar correlacionada como o âmbito e modo de relevância da norma que suscita a questão de consti- tucionalidade. A norma contida nos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei da Concorrência – relativamente à qual se coloca o problema – descreve o tipo de efeitos que a impugnação judicial produz na decisão que aplica uma coima: por regra, meramente devolutivo, com possibilidade de ser requerido o efeito suspensivo, verificados determinados pressupostos. Ora, o contexto de realidade em que estes efeitos jurídicos se produzem evi- dencia sobretudo o propósito de regular a eficácia das decisões sancionadoras na pendência da impugnação judicial. Por isso, constituindo a impugnação da decisão administrativa um meio de acesso à jurisdição, o sentido jurídico que a norma assume está diretamente conexionado com a garantia da via judiciária e com o direito à tutela jurisdicional efetiva. Uma vertente essencial deste direito exige ou impõe, em certas situações, a suspensão dos atos impugnados, como medida cautelar capaz de neutralizar pericula in mora e impedir prejuízos significativos, perante a duração normal do processo (artigo 268.º, n.º 4, da CRP). É, pois, por referência a este parâmetro constitucional que se pode dizer que a mesma questão jurídico-constitucional obteve soluções opostas. Assim, a questão fundamental que ambos os acórdãos pretenderam resolver prende-se sobretudo com a eventual restrição do direito à via judicial e à tutela jurisdicional efetiva, previsto nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da CRP, tendo o Acórdão n.º 376/16 entendido que não ocorre uma restrição relevante dessa garantia e o Acórdão n.º 445/18 considera que a solução legislativa constitui uma restrição desproporcional ao princípio da tutela jurisdicional efetiva. B. Do mérito do recurso. 12. A questão que se coloca no presente recurso é, pois, a da constitucionalidade da solução consagrada nos n. os 4 e 5 do artigo 84.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, de onde se extrai uma norma nos termos da qual a impugnação judicial da decisão aplicativa de coima proferida pela Autoridade da Concorrência em processo contraordenacional tem efeito meramente devolutivo, ressalvados os casos em que a execução da decisão cause «prejuízo considerável» ao impugnante e em que este preste «caução substitutiva» do paga- mento imediato da coima, casos em que o efeito da impugnação judicial é suspensivo. O teor dos preceitos que contêm a referida norma é o seguinte: Artigo 84.º Recurso, tribunal competente e efeitos do recurso (…) 4 – O recurso tem efeito meramente devolutivo, exceto no que respeita a decisões que apliquem medidas de caráter estrutural determinadas nos termos do n.º 4 do artigo 29.º, cujo efeito é suspensivo. 5 – No caso de decisões que apliquem coimas ou outras sanções previstas na lei, o visado pode requerer, ao interpor o recurso, que o mesmo tenha efeito suspensivo quando a execução da decisão lhe cause prejuízo consi- derável e se ofereça para prestar caução em substituição, ficando a atribuição desse efeito condicionada à efetiva prestação de caução no prazo fixado pelo tribunal. Importa, desde já, esclarecer que a forma de expressão da norma questionada no processo não corres- ponde rigorosamente ao enunciado da norma constante do n.º 4 desta disposição: enquanto aquela utiliza a expressão «efeito devolutivo», esta está formulada com a expressão «efeito meramente devolutivo». Este enunciado textual é normalmente utilizado nas leis processuais para definir o efeito que a interposição do recurso jurisdicional tem na eficácia da decisão judicial: os recursos ordinários têm sempre efeito devolutivo, no sentido de atribuírem ao tribunal superior o poder de rever a decisão recorrida; mas se forem somente ou

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