TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

995 acórdão n.º 776/19 sancionatória. E embora este esteja obrigado a prestar caução substitutiva, a função de garantia que esta deve preen- cher pode revestir formas diversas do depósito de dinheiro, nomeadamente títulos de crédito, garantias bancárias ou garantias reais (v. o artigo 623.º, n. os  1 e 3, do Código Civil). A estes mecanismos de salvaguarda contemplados pelo RSSE, importa acrescentar a possibilidade residual de reparação de danos especiais e anormais da execução da sanção, através da cláusula geral da indemnização pelo sacrifício consagrada no artigo 16.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro. Por tudo isto, é de concluir que a solução consagrada n. os  4 e 5 do artigo 46.º do RSSE, não implica, em prin- cípio, qualquer restrição do direito à efetividade da tutela jurisdicional.     14. Cabe agora confrontar tal regime com o princípio da presunção de inocência, consagrado nos artigos 32.º, n. os  2 e 10, da Constituição. A primeira questão que, a tal propósito, se coloca, é a de saber se o direito do arguido a que seja presumido inocente até ao trânsito em julgado de sentença de condenação, consagrado no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição, se estende, por força do disposto no n.º 10 do mesmo artigo, aos processos contraordenacionais, no sentido em que o visado deve ser presumido inocente até que a decisão condenatória da Administração se consolide na ordem jurídica ou, caso esta seja impugnada, até que transite em julgado sentença judicial que a confirme. A essa questão não pode deixar de se dar uma resposta afirmativa. Como se escreveu, a esse respeito, no Acór- dão n.º 674/16: «11. O princípio da presunção de inocência pertence àquela classe de princípios materiais do processo penal que, enquanto constitutivos do Estado de direito democrático, são extensíveis ao direito sancionatório público. Sendo expressão do direito individual das garantias de defesa e de audiência, este princípio encontra, pois, aplicação também no processo contraordenacional, como decorre dos n. os  2 e 10 do artigo 32.º da Cons- tituição. Nestes termos, no processo contraordenacional, como em qualquer outro processo sancionatório, o arguido presume-se inocente até se tornar definitiva a decisão sancionatória contra si proferida, o que, neste caso, se consubstancia no momento em que a decisão administrativa se torne inatacável ou, no caso de impugnação, até ao trânsito em julgado da sentença judicial que dela conhecer. O estatuto processual do arguido no processo contraordenacional, enformado pela garantia da presunção de inocência, permite, por exemplo – e para o que agora releva –, que o tratamento do arguido ao longo de todo o processo seja configurado sem perder de vista a possibilidade de verificação da sua inocência, não sendo de admitir, designadamente, que a autoridade administrativa considere o arguido culpado antes de formalizar o juízo sancionatório de forma necessariamente fundamentada.».  Firmada tal premissa, coloca-se agora a questão de saber se o regime consagrado nos n. os  4 e 5 do artigo 46.º do RSSE, constitui uma restrição do direito da entidade visada pelo procedimento contraordenacional a ser presumida inocente. No Acórdão n.º 674/16, entendeu-se não ser esse o caso, pelas seguintes razões: «(…) Ora, sendo assim, pelo regime delineado não se nega – antes é reconhecido – o direito do arguido impug- nar a decisão sancionatória proferida pela autoridade administrativa e, com o exercício desse direito, continuar a beneficiar do estatuto de inocente. Simplesmente, a suspensão da decisão sancionatória fica dependente do cumprimento de uma garantia imposta pelo legislador. É certo que o efeito meramente devolutivo recurso não impede a instauração de execução da coima fixada pela autoridade administrativa e implica, consequentemente, a possibilidade de penhora do seu património,

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