IV Conferência da Justiça Constitucional da Ibero-América
Modelos de Justiça Constitucional
Relatório do Tribunal Constitucional Português
Elaborado por Catarina Sarmento e Castro, assessora do Gabinete do Presidente do Tribunal Constitucional
[Sevilha 19 a 21 de Outubro de 2005]
MODELOS DE JUSTIÇA CONSTITUCIONAL
PORTUGAL
QUESTIONÁRIO
Em Portugal, a garantia da Constituição é fundamentalmente assegurada
por dois meios distintos, ambos consagrados na Parte IV da Constituição da
República Portuguesa (CRP): a fiscalização da constitucionalidade (Título I) e
a revisão constitucional (Título II). Em qualquer dos casos estamos perante
mecanismos de protecção do ordenamento constitucional em si mesmo, ou seja, de
garantia da existência da Lei fundamental. No que respeita à fiscalização da
constitucionalidade, esta pretende assegurar a observância da Constituição, bem
como prevenir a criação de actos normativos que a contrariem; cabe aos limites
da revisão constitucional garantir a estabilidade e a conservação da
Constituição
[1]
.
Apesar de na fórmula «garantias da constituição»
[2]
se incluírem realidades diversas – seria ainda possível enunciar, v.g, os
poderes de garantia da Constituição conferida a outros órgãos, como o
Parlamento
[3]
,
ou o efeito garantístico que resulta da vinculação constitucional dos poderes
públicos, bem patente no princípio da constitucionalidade da acção do Estado,
ou os controlos interorgânicos e intra-orgânicos dos órgãos de soberania em concretização
da separação e interdependência dos órgãos de soberania
[4]
– o texto da Constituição de 1976 apenas classifica expressamente como
tal o mecanismo da fiscalização da constitucionalidade. Neste texto, tomaremos
por preocupação fundamental este aspecto particular das garantias da
Constituição.
Em Portugal existe um sistema de garantia jurisdicional da
Constituição, traduzido na fiscalização da constitucionalidade das leis e
demais actos normativos públicos pelos tribunais.
O sistema português de fiscalização da constitucionalidade é hoje,
aliás, um sistema integralmente jurisdicional, embora nem sempre o tivesse
sido.
Apesar de o controlo político das leis ter sido o elemento dominante do
constitucionalismo monárquico, a primeira Constituição portuguesa da época
republicana – a Constituição de 1911 – consagrou um sistema de
fiscalização da constitucionalidade de tipo judicial difuso incidental e
concreto (artigo 63.º)
[5]
,
que tendo a sua raiz no sistema da judicial review americana, foi consagrado em
Portugal por influência directa da Constituição brasileira de 1891, havendo a
solução portuguesa sido pioneira na Europa. Este tipo de controlo da
constitucionalidade foi seguido pela Constituição de 1933 (artigo 123.º), e
seria ainda esta Constituição, após a revisão operada em 1971, que viria a
possibilitar a institucionalização de um sistema de controlo político,
traduzido na fiscalização abstracta concentrada da constitucionalidade a cargo
da Assembleia Nacional (artigo 91.º, n.º 2), a par da fiscalização judicial
difusa já anteriormente em vigor. Este sistema misto, que admitia um controlo
concentrado não judicial, foi depois mantido, embora com alterações, no período
que se seguiu à revolução do 25 de Abril de 1974, até à aprovação da actual
Constituição Portuguesa, a 2 de Abril de 1976, cabendo ao Conselho de Estado,
primeiro (artigo 13.º, n.º 3, da Lei n.º 3/74, de 14 de Maio), e ao Conselho da
Revolução, depois (Lei n.º 5/75, de 14 de Março), as funções relativas ao
controlo concentrado da constitucionalidade
[6]
.
A Constituição de 1976 adoptou este mesmo sistema misto de fiscalização
da constitucionalidade, muito embora tivesse criado a Comissão Constitucional
como órgão de controlo, de funções híbridas, quer enquanto órgão consultivo do
Conselho da Revolução em matéria de fiscalização abstracta da
constitucionalidade, quer como instância de recurso das questões de
inconstitucionalidade suscitadas perante os tribunais. O Conselho da Revolução
desempenhava então, entre outras, funções de fiscalização política da
constitucionalidade.
Só com a Revisão constitucional de 1982 se cria o Tribunal
Constitucional, que é hoje o principal e supremo órgão da justiça
constitucional, mas ao qual são também atribuídas outras competências, a que
adiante se fará referência. Este Tribunal entrou em funcionamento a 6 de Abril
de 1983.
Como vimos no ponto anterior, a garantia jurisdicional da Constituição
em Portugal é assegurada pelo exercício de funções de controlo da
constitucionalidade, a cargo dos tribunais em geral, e do Tribunal
Constitucional, em especial.
Todos estes tribunais se dedicam ao conhecimento e decisão de questões
de inconstitucionalidade: a título concreto e meramente incidental, os
primeiros, tendo as respectivas decisões efeitos meramente circunscritos ao
caso concreto; ou no âmbito de um processo especialmente criado para o efeito
ou em sede de recurso de decisão dos demais tribunais sobre a questão de
inconstitucionalidade, no segundo. Neste último caso de controlo pelo Tribunal
Constitucional, a decisão deste em sede de recurso de fiscalização concreta
terá efeito inter partes, diferentemente do que sucederá quando a questão seja
directamente colocada a este Tribunal, para efeitos de fiscalização abstracta
sucessiva da constitucionalidade.
Em qualquer dos casos, as normas emitidas pelo legislador podem ser
objecto de fiscalização, isto é, quer a título principal e abstracto, em
processo de fiscalização concentrado, a cargo do Tribunal Constitucional, quer
a título incidental difuso e concreto, por qualquer tribunal que deva aplicar
uma norma numa situação concreta, as normas contidas num legislativo podem ser
objecto de controlo da constitucionalidade.
No complexo modelo português de fiscalização da constitucionalidade
existem quatro formas de fiscalização: a fiscalização sucessiva concreta da
inconstitucionalidade, a cargo de qualquer tribunal, e a fiscalização sucessiva
abstracta da inconstitucionalidade por acção, a fiscalização preventiva da
inconstitucionalidade por acção, e a fiscalização da inconstitucionalidade por
omissão, todas exclusivamente a cargo do Tribunal Constitucional. Este tem
ainda o exclusivo da apreciação dos recursos das decisões de inconstitucionalidade
dos restantes tribunais.
Nos termos da Constituição, o objecto de controlo não coincide em cada
um destes tipos de fiscalização. Mas em qualquer dos casos, os actos
legislativos podem sempre ser apreciados. Se o controlo judicial concreto
[7]
e o controlo abstracto sucessivo abrangem toda e qualquer norma
[8]
,
independentemente da sua categoria ou hierarquia, e por isso, naturalmente, os
actos legislativos, já no controlo preventivo apenas dele podem ser objecto os
diplomas legislativos (da República ou regionais) ou equiparados
[9]
.
Também no controlo da inconstitucionalidade por omissão se reveste de
especificidades quanto ao objecto do controlo dado que o Tribunal
Constitucional apenas verifica a «omissão das medidas legislativas necessárias
para tornar exequíveis as normas constitucionais»
[10]
.
No que respeita ao controlo concreto, e apesar de neste constituir
objecto de fiscalização todo e qualquer acto normativo, há ainda uma
especificação respeitante aos actos legislativos ou equiparados que importa
fazer: quando a norma desaplicada no caso concreto seja uma norma legislativa
ou equiparada é, em princípio, obrigatório para o Ministério Público o recurso
para o Tribunal Constitucional.
Do que fica dito resulta que em qualquer um dos tipos de processos de
fiscalização da constitucionalidade a lei sempre poderá ser objecto de
apreciação. Ainda assim, nem sempre o resultado do labor do legislador será
directamente afectado pela decisão: tal apenas acontecerá nos casos de
fiscalização abstracta sucessiva, na qual o Tribunal procede à anulação de um
acto normativo em vigor na ordem jurídica portuguesa, e que pode ser uma lei,
ou nos casos de fiscalização abstracta preventiva, se tivermos em conta que o
diploma pretendido pelo legislador não chega a entrar em vigor. Também nos
processos de declaração da inconstitucionalidade com base no controlo concreto
é possível chegar-se à anulação de uma lei até então em vigor - sempre que o
juízo de inconstitucionalidade proferido pelo Tribunal Constitucional se repita
em três casos concretos e o Ministério Público
[11]
promover a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral,
seguindo-se, então os termos do processo de fiscalização abstracta sucessiva de
constitucionalidade
O sistema português de fiscalização da constitucionalidade, de carácter
misto, defere competências de apreciação da constitucionalidade das normas quer
a um tribunal especial criado para o efeito – o Tribunal Constitucional
– quer a todos e a cada um dos demais tribunais.
A Constituição da República Portuguesa de 1976 consagrou o direito de
acesso directo dos juízes à Constituição, na linha do que fora já entre nós
pioneiramente consagrado pela Constituição de 1911.
Nos termos do artigo 204.º da Constituição, sob a epígrafe «Apreciação
da inconstitucionalidade», estabelece-se: «Nos feitos submetidos a julgamento
não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição
ou os princípios nela consignados».
Neste artigo a Constituição prevê um controlo judicial difuso,
incidental e concreto da Constitucionalidade, influência do sistema da judicial
review desenvolvido nos Estados Unidos da América desde 1803. A competência
para fiscalizar a constitucionalidade é reconhecida a qualquer juiz que deva
aplicar um acto normativo num caso concreto submetido à sua apreciação -
devendo, caso considere a norma inconstitucional, desaplicá-la - o que faz de
todos os tribunais, independentemente da sua categoria, órgãos da justiça
constitucional.
A apreciação da constitucionalidade pelos tribunais em geral ocorre
relativamente aos feitos submetidos a julgamento, i.e., num processo em curso
nesse tribunal, e a título incidental, não a título principal (só tem cabimento
a apreciação da constitucionalidade da norma se esta puder constituir ratio
decidendi da questão principal).
O mecanismo de
fiscalização concreta difusa e incidental pode ser desencadeado oficiosamente
ou por impugnação das partes do processo.
Apesar de se admitir (ou obrigar, em certos casos) recurso para o
Tribunal Constitucional da apreciação que fez o juiz do processo sobre a
inconstitucionalidade de uma norma que ao caso submetido a julgamento devesse
ser aplicada, se este recurso não tiver lugar, a questão da
inconstitucionalidade será decidida de modo definitivo pelo tribunal ordinário.
Caso tenha lugar, a apreciação do Tribunal Constitucional em sede de recurso
valerá como última palavra, mas apenas para a aplicação da norma ao caso
concreto.
A abertura do acesso à Constituição a todo e qualquer juiz no âmbito de
um processo concreto deve ser entendida de modo estrito: a fiscalização da
constitucionalidade só pode ter lugar quando realizada por mecanismos
jurisdicionais, seja pelos tribunais em geral (judiciais, administrativos e
fiscais, etc.), seja pelo próprio Tribunal Constitucional, em processos da sua
competência em matéria fora do âmbito do controlo da constitucionalidade, ou
mesmo pelos tribunais arbitrais e julgados de paz (artigo 209.º, n.º 2 da CRP,
que os inclui nas categorias de tribunais)
[12]
.
O controlo da constitucionalidade não poderá realizar-se através de
instrumentos de composição não jurisdicional de conflitos
[13]
,
nem por tribunais, fora do exercício da função jurisdicional.
A primeira Revisão da Constituição da República Portuguesa de 1976,
ocorrida em 1982, criou um Tribunal Constitucional, enquanto verdadeiro órgão
jurisdicional, e enquanto instituição separada de qualquer outro órgão,
judicial ou não judicial. No actual texto do artigo 221.º a CRP caracteriza-o
do seguinte modo: «O Tribunal Constitucional é o tribunal ao qual compete
especificamente administrar a justiça em matérias de natureza
jurídico-constitucional». Isto, não obstante a este serem ainda constitucional
e legalmente deferidas outras competências especiais. A seguir a esta Revisão
foi aprovada a Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, relativa à organização, ao
funcionamento e ao processo deste Tribunal
[14]
.
O Tribunal Constitucional, com sede em Lisboa e jurisdição no âmbito de
toda a ordem jurídica portuguesa (artigo 1.º da Lei n.º 28/82), profere
decisões obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas que prevalecem
sobre as dos restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades (artigo 2.º
da Lei n.º 28/82), sendo o órgão supremo para a fiscalização da
constitucionalidade.
Este Tribunal, como outros na Europa, surge por influência da
Constituição austríaca de 1920 que concentrou num tribunal especial a
fiscalização jurisdicional da constitucionalidade.
Em Portugal, a instituição da fiscalização concentrada teve a sua
origem ainda antes da criação do Tribunal Constitucional, com o deferimento à
Comissão Constitucional de competências de fiscalização da constitucionalidade,
pela Constituição de 1976, na sua versão originária. A Constituição reservava o
Capítulo II da Parte IV (Garantia da Constituição) a esta Comissão, tratando no
Capítulo I da fiscalização da constitucionalidade. A Comissão Constitucional
não era ainda, todavia, um verdadeiro tribunal constitucional, pois embora
tendo uma composição semelhante à de um tribunal constitucional, e sendo uma
instância especializada, a verdade é que ao lado das funções de instância de
recurso das decisões em matéria de fiscalização concreta realizada por todos os
tribunais desempenhava funções auxiliares do Conselho da Revolução, ao qual
dava pareceres em processos de fiscalização abstracta da constitucionalidade
[15]
.
Com a criação do Tribunal Constitucional, este veio concentrar as
competências de fiscalização da constitucionalidade antes atribuídas à Comissão
Constitucional e ao Conselho da Revolução.
Na tradição portuguesa nunca as competências máximas e finais em
matéria de fiscalização da constitucionalidade ficaram a cargo de um outro
tribunal superior.
O artigo 209.º
da Constituição define as categorias de tribunais, no Capítulo II (Organização
dos tribunais) do Título V (Tribunais) da Parte III (Organização do poder
político) da CRP, estabelecendo no seu n.º 1:
«Além do Tribunal Constitucional, existem as seguintes
categorias de tribunais:
a) O Supremo
Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de primeira e de segunda
instância;
b) O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais administrativos e
fiscais;
c) O Tribunal de Contas»
[16]
.
O Tribunal
Constitucional surge, assim, na Constituição, como um verdadeiro órgão
jurisdicional, com existência própria, autonomia e independência
[17]
,
e com uma legitimidade que lhe advém da própria Constituição
[18]
.
O seu estatuto, que se pretendeu
demarcado dos demais tribunais, é definido de modo autónomo e sistemático num
Título que lhe é especialmente dedicado (Título VI, da Parte III –
artigos 221.º a 224.º da CRP). Nele se trata a organização, funcionamento e
competência do Tribunal Constitucional, e se caracteriza este tribunal como
aquele ao qual compete especificamente administrar a justiça em matérias de
natureza jurídico-constitucional, também deste modo o distinguindo dos demais.
Ainda assim, a autonomia do tratamento da sua organização e funcionamento em
Título autónomo do dedicado à fiscalização da constitucionalidade mostra bem
que este não é apenas um tribunal, sendo igualmente um «regulador essencial da
vida institucional do Estado»
[19]
.
Ao contrário do
que sucede com os demais tribunais, é a Constituição que define, no essencial,
as competências do Tribunal Constitucional. Também de modo particular, a Lei
reguladora das competências, organização, funcionamento e processo deste
tribunal é aprovada pela Assembleia da República, como lei orgânica,
constituindo matéria de reserva absoluta (artigos 164.º, alínea c); 166.º, n.º
2, e 112.º, n.º 3, da CRP). Ainda relativamente às competências, é interessante
notar que só ao próprio Tribunal Constitucional cabe delimitar, em cada caso, a
sua competência relativamente à de outros tribunais, que devem, também nesta
matéria, acatar as suas decisões
[20]
.
Outros traços
distinguem este Tribunal dos restantes órgãos jurisdicionais, caracterizando o
seu estatuto específico: os juízes que o compõem são maioritariamente eleitos
pela Assembleia da República, o seu presidente é membro nato do Conselho de
Estado (artigo 142º, alínea c), da CRP), uma vez que é considerado um órgão
constitucional autónomo, dispõe de autonomia administrativa e financeira e de
orçamento próprio, e, ao contrário dos restantes tribunais, não está submetido
à gestão governamental.
O Tribunal
Constitucional partilha ainda características que são próprias de qualquer
tribunal, sendo um órgão de soberania (artigo 202.º da CRP), as suas decisões
impõem-se a qualquer outra autoridade (artigo 2.º da Lei do Tribunal Constitucional:
«As decisões do Tribunal Constitucional são obrigatórias para todas as
entidades públicas e privadas»), sendo que «prevalecem sobre as (decisões) dos
restantes tribunais e de quaisquer outras autoridades»). Composto por juízes
independentes (inclusivamente em relação aos órgãos que os elegem) e
inamovíveis, e que gozam também das garantias de imparcialidade e
irresponsabilidade típicas dos demais juízes (artigo 222.º, n.º 5, da CRP),
este Tribunal trabalha de forma autónoma e independente, não funcionando junto
de qualquer outro órgão.
No sistema português qualquer tribunal pode conhecer e decidir questões
de constitucionalidade relativas à aplicação de uma norma que se coloquem num
processo submetido à sua apreciação. Não foi, assim, consagrado um reenvio
prejudicial de questões de constitucionalidade dos tribunais comuns para o
Tribunal Constitucional. Este direito de acesso directo do juiz à Constituição
consagrado no artigo 204.º aproximou o modelo de fiscalização da
constitucionalidade português ao modelo norte-americano. Mas ao contrário
deste, em que se prevê que estas decisões possam ser recorríveis para um
tribunal superior, no sistema português o recurso – possível ou
necessário, conforme os casos – é decidido por um tribunal especial, fora
da ordem judicial, que é, desde 1982, o Tribunal Constitucional
[21]
.
Tal como no sistema norte-americano, este Tribunal (na judicial review, o
tribunal superior) apenas se pronunciará, a título incidental, sobre a
inconstitucionalidade de norma relevante para a situação na sua aplicação ao
caso sub iudice, não já sobre a questão controvertida em si mesma, e a decisão
do Tribunal Constitucional acerca da questão de inconstitucionalidade não será
dotada de eficácia erga omnes, mas apenas de eficácia limitada ao caso concreto
[22]
.
A via de recurso é o único elo relacional entre cada um dos tribunais e
o Tribunal Constitucional no exercício de funções de fiscalização da
constitucionalidade. É que, ao contrário do que hoje sucede no sistema
austríaco, em que a fiscalização abstracta concentrada no Tribunal
Constitucional começa por ter a sua origem num processo concreto que é seu
pressuposto, cabendo ao juiz desse processo decidir se leva a questão ao
Tribunal Constitucional, para efeitos de fiscalização abstracta da
constitucionalidade - ou seja, os incidentes de inconstitucionalidade acabam
por subir ao Tribunal Constitucional, para efeitos de fiscalização abstracta,
provindo de quaisquer tribunais -, entre nós, o incidente de
inconstitucionalidade pode ser oficiosamente levantado pelo juiz, ou suscitado
pelas partes, podendo estas recorrer da decisão do juiz a quo para o Tribunal
Constitucional, o qual se pronunciará apenas sobre a aplicação da norma àquele
caso concreto (artigo 280.º, n.º 6, da CRP: «Os recursos para o Tribunal
Constitucional são restritos à questão da inconstitucionalidade…»).
Caberá recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos
tribunais que:
- Recusem a aplicação de uma norma com fundamento em
inconstitucionalidade, ou em contradição com uma convenção internacional
(artigo 280.º, n.º 1, alínea a), da CRP), recurso que será obrigatório para o
Ministério Público quando esteja em causa norma que conste de convenção
internacional, de acto legislativo ou de decreto regulamentar (artigo 280.º,
n.º 3, da CRP).
- Apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada no
processo (artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da CRP), recurso que apenas pode ser
apresentado pela parte que tenha suscitado o incidente (artigo 280.º, n.º 4, da
CRP).
- Apliquem norma anteriormente julgada inconstitucional pelo próprio
Tribunal Constitucional (artigo 280.º, n.º 5, da CRP), recurso que é
obrigatório para o Ministério Público, podendo ainda recorrer a parte que
levantou o incidente de inconstitucionalidade.
Estes recursos não diferem apenas no regime estabelecido quanto à
legitimidade processual activa ou à liberdade ou obrigatoriedade da sua
interposição. São ainda distintas as soluções quanto à necessidade de exaustão
de recursos como condição para sua interposição perante o Tribunal
Constitucional.
Os artigos 70.º, n.º 2, 72.º, e 76.º, n.º 2, da Lei do Tribunal
Constitucional, determinam que o recurso de decisões negativas (de rejeição) de
inconstitucionalidade para este Tribunal só pode ser interposto de decisão que
não admita já recurso ordinário, quer por que já tenham sido esgotados todos os
recursos, quer por que não o admitisse
[23]
.
Já quanto aos recursos de decisão positiva de inconstitucionalidade (de
acolhimento), não é obrigatória a exaustão de recursos, podendo, todavia, ter
lugar quando as partes o desejem
[24]
.
Justifica esta solução Gomes Canotilho, escrevendo: «Não era muito lógico que
tendo o recurso como objecto exclusivo a questão da inconstitucionalidade, esta
devesse ser obrigatoriamente apreciada por outros tribunais (embora superiores)
não competentes para decidir, a título principal, problemas de
inconstitucionalidade. O regime actual é mais consentâneo com a natureza
incidental da questão de inconstitucionalidade e com a própria razão de ser do
controlo concentrado com a base num controlo difuso»
[25]
.
Nos termos do artigo 277.º, o Tribunal Constitucional é também órgão
competente para apreciar a ilegalidade. A essa competência se referem o artigo
281.º (fiscalização abstracta da ilegalidade) e, para o que nos interessa, o
artigo 280.º (fiscalização concreta da ilegalidade) da CRP.
Também nesta matéria se estabelecem relações entre os tribunais em
geral e o Tribunal Constitucional, dispondo este de poderes de decisão de
recursos em matéria de ilegalidade de normas. Assim, cabe recurso para o
Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais (artigo 280.º, n.º 2, da
CRP):
«a) Que recusem
a aplicação de norma constante de acto legislativo com fundamento na sua
ilegalidade por violação da lei com valor reforçado;
b) Que recusem
a aplicação de norma constante de diploma regional com fundamento na sua
ilegalidade por violação do estatuto da região autónoma;
c) Que recusem
a aplicação de norma constante de diploma emanado de um órgão de soberania com
fundamento na sua ilegalidade por violação do estatuto de uma região autónoma;
d) Que apliquem
norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos
fundamentos referidos nas alíneas a), b) e c)».
Caberá ainda, nos termos do n.º 5 do artigo 280.º, recurso das decisões
dos tribunais que apliquem norma anteriormente julgada ilegal pelo próprio
Tribunal Constitucional, sendo este recurso obrigatório para o Ministério
Público.
O Tribunal Constitucional português é o órgão supremo em matéria de
fiscalização da constitucionalidade, mas desempenha também outras competências
fundamentais para regulação da vida institucional do Estado.
As competências do Tribunal Constitucional são enunciadas na
Constituição e na lei.
Os artigos 221.º a 224.º (Título VI, da Parte III) da CRP são dedicados
às competências, organização, composição e funcionamento deste Tribunal.
A Constituição reservou ainda o Título I da Parte IV para tratar da
fiscalização da constitucionalidade, um dos modos de garantia e de preservação
da própria Constituição, que em boa medida fica a cargo do Tribunal
Constitucional.
A Constituição define no n.º 1 do artigo 223.º o núcleo fundamental das
competências do Tribunal Constitucional, que se refere a matéria de
fiscalização da constitucionalidade, as quais são em boa parte estabelecidas
pelos artigos 277.º e seguintes da CRP, precisamente as disposições em que se
trata da fiscalização da constitucionalidade.
No n.º 2 do artigo 223.º a Lei Fundamental elenca um conjunto de outras
competências não incluídas no âmbito do controlo da constitucionalidade.
Já de acordo com o definido no artigo 223.º, n.º 3, da CRP, ao Tribunal
Constitucional podem a Constituição e outras leis atribuir novas competências.
Vejamos.
No artigo 223.º a CRP define:
«1.
Compete ao Tribunal Constitucional apreciar a inconstitucionalidade e a
ilegalidade, nos termos dos artigos 277.º e seguintes».
Dos artigos mencionados, bem como na Lei n.º
28/82 (Lei do Tribunal Constitucional), constam as várias competências do
Tribunal nesta matéria. Na resposta à questão seguinte cuidaremos do seu
desenvolvimento.
Outras competências do Tribunal Constitucional,
não ligadas ao controlo da constitucionalidade, estão definidas no número 2 do
mesmo artigo 223.º:
«2.
Compete também ao Tribunal Constitucional:
a)
Verificar a morte e declarar a impossibilidade física permanente do Presidente
da República, bem como verificar os impedimentos temporários do exercício das
suas funções;»
Esta competência está também prevista no artigo 7.º alínea a) da Lei do
Tribunal Constitucional.
O artigo 223.º, n.º 2 da CRP prossegue:
«b) Verificar a perda do cargo de Presidente da República, nos casos
previstos no n.º 3 do artigo 129.º e no n.º 3 do artigo 130.º;»
O artigo 7.º alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional trata
igualmente esta competência.
Na alínea c) do n.º 2 do artigo 223.º estabelece-se:
«c) Julgar em última instância a regularidade e a validade dos actos de
processo eleitoral, nos termos da lei;»
O artigo 9.º da Lei do Tribunal Constitucional
tem várias referências a esta matéria, definindo como competências do Tribunal
Constitucional:
«c)
Julgar os recursos interpostos de decisões sobre reclamações e protestos
apresentados nos actos de apuramento parcial, distrital e geral da eleição do
Presidente da República, nos termos dos artigos 114º e 115º do Decreto-Lei n.º
319-A/76, de 3 de Maio;
d) Julgar os recursos em matéria de contencioso de apresentação de candidaturas
e de contencioso eleitoral relativamente às eleições para o Presidente da
República, Assembleia da República, assembleias regionais e órgãos do poder
local.
e)
Receber e admitir as candidaturas relativas à eleição dos Deputados ao
Parlamento Europeu e julgar os correspondentes recursos e, bem assim, julgar os
recursos em matéria de contencioso eleitoral referente à mesma eleição;
f)
Julgar os recursos contenciosos interpostos de actos administrativos
definitivos e executórios praticados pela Comissão Nacional de Eleições ou por
outros órgãos da administração eleitoral;
g)
Julgar os recursos relativos às eleições realizadas na Assembleia da República
e nas Assembleias Legislativas Regionais.»
Já na alínea d) do n.º 2 do artigo 223.º da CRP
dispõe-se acerca das competências do Tribunal Constitucional:
«Verificar a morte e declarar a incapacidade para o exercício da função
presidencial de qualquer candidato a Presidente da República, para efeitos do
disposto no n.º 3 do artigo 124.º;»
Sobre a matéria dispõe igualmente o artigo 8.º,
alínea b) da Lei do Tribunal Constitucional.
Na alínea e) do n.º 2 do artigo 223.º da CRP
define-se como competência deste Tribunal:
«Verificar a legalidade da constituição de partidos políticos e suas
coligações, bem como apreciar a legalidade das suas denominações, siglas e
símbolos, e ordenar a respectiva extinção, nos termos da Constituição e da
lei;»
O artigo 9.º da Lei do Tribunal Constitucional
faz-lhe referência:
«a) Aceitar a inscrição de partidos políticos em
registo próprio existente no Tribunal;
b) Apreciar a legalidade das denominações, siglas
e símbolos dos partidos políticos e das coligações e frentes de partidos, ainda
que constituídas apenas para fins eleitorais, bem como apreciar a sua
identidade ou semelhança com as de outros partidos, coligações ou frentes;
c) Proceder às anotações referentes a partidos
políticos, coligações ou frentes de partidos exigidas por lei;»
Na alínea f) do n.º 2 do artigo 223.º da CRP
estabelece-se como competência do Tribunal Constitucional:
«f) Verificar previamente a
constitucionalidade e a legalidade dos referendos nacionais, regionais e
locais, incluindo a apreciação dos requisitos relativos ao respectivo universo
eleitoral;»
O artigo
11.º-A da Lei do Tribunal Constitucional determina nesta matéria que:
«Compete ao Tribunal
Constitucional verificar previamente a constitucionalidade e a legalidade das
propostas de referendo nacional, regional e local, previstos no n.º 1 do artigo
115º, no n.º 2 do artigo 232º e nos artigos 240º e 256º da Constituição,
incluindo a apreciação dos requisitos relativos ao respectivo universo eleitoral,
e o mais que, relativamente à realização desses referendos, lhe for cometido
por lei»
[26]
.
Na alínea g) do n.º 2, do artigo 223.º da
CRP também se dispõe, designadamente, em matéria eleitoral:
«g) Julgar a requerimento dos Deputados, nos termos da lei, os recursos
relativos à perda do mandato e às eleições realizadas na Assembleia da
República e nas Assembleias Legislativas das regiões autónomas;»
O artigo 223.º, n.º 2 alínea h), da CRP, tal como
a já mencionada alínea e), regula a matéria dos partidos políticos:
«h) Julgar as acções de impugnação de eleições e deliberações de órgãos
de partidos políticos que, nos termos da lei, sejam recorríveis.»
O artigo
9.º da Lei do Tribunal Constitucional também atribui ao Tribunal competências
várias em matéria de partidos políticos, coligações e frentes:
«d) Julgar as acções de
impugnação de eleições e de deliberações de órgãos de partidos políticos, que,
nos termos da lei, sejam recorríveis;
e) Apreciar a regularidade e
a legalidade das contas dos partidos políticos, nos termos da lei, e aplicar as
correspondentes sanções;
f) Ordenar a extinção de
partidos e de coligações de partidos nos termos da lei».
Nos
termos do n.º 3 do artigo 223.º da CRP «compete ainda ao Tribunal
Constitucional exercer as demais funções que lhe sejam atribuídas pela
Constituição e pela lei».
No que respeita a outras competências atribuídas pela própria
Constituição, estabelece-se no seu artigo 127.º, nº 2, a competência do
Tribunal Constitucional para receber as candidaturas para Presidente da
República.
Já no que toca a competências definidas, não na Constituição, mas
noutras leis - que devem revestir a forma de lei orgânica
[27]
-, a Lei do Tribunal Constitucional deferiu a este Tribunal competência em
matéria de extinção das organizações de ideologia fascista (artigo 10º)
[28]
,
nos termos da Lei n.º 64/78, de 6 de Outubro; a Lei n.º 4/83, de 23 de Abril
(alterada pela Lei n.º 38/83, de 25 de Outubro, e pela Lei n.º 25/95, de 18 de
Agosto), bem como a Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho (modificada pela Lei n.º
287/2003, de 12 de Novembro), atribuem-lhe, respectivamente, competências em
matéria de controlo da riqueza e dos rendimentos dos titulares de cargos
políticos (também referido no artigo 11.º-A da Lei do Tribunal Constitucional)
[29]
e de fiscalização das finanças partidárias
[30]
.
No ponto seguinte daremos especial atenção às competências do Tribunal
Constitucional em matéria de fiscalização da constitucionalidade, da legalidade
e de defesa de direitos.
Já
anteriormente fizemos referência ao artigo 221.º da Constituição que
estabelece: «O Tribunal Constitucional é o tribunal ao qual compete
especificamente administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional».
Mais à frente, o artigo 223.º, n.º 1, da CRP determina que «compete ao
Tribunal Constitucional apreciar a inconstitucionalidade e a ilegalidade, nos
termos dos artigos 277.º e seguintes». É fundamentalmente nestes artigos que se
encontram definidos os processos de fiscalização da constitucionalidade e da
legalidade das normas, assim como o papel neles desempenhado pelo Tribunal
Constitucional
[31]
. Como foi
referido atrás neste estudo, a Constituição Portuguesa não consagra uma acção constitucional
de defesa do tipo do recurso de amparo espanhol, da alemã
Verfassungsbeschwerde, ou dos institutos de países ibero-americanos como o já
mencionado recurso de amparo, o mandado de segurança, o mandado de injunção, ou
o habeas corpus, (que entre nós assume um sentido diverso e é decidido pelo
Supremo Tribunal de Justiça) que permitisse a defesa directa dos direitos
fundamentais contra actos administrativos ou judiciais junto do Tribunal
Constitucional. A fiscalização deste Tribunal incide apenas sobre normas, não
sendo admitido o recurso para o Tribunal Constitucional para fins de defesa
imediata e directa de direitos fundamentais. Aliás, as regras de legitimidade
processual activa nem sequer permitem, em geral, que seja um eventual
interessado a requerer a fiscalização de uma norma junto do Tribunal
Constitucional (se exceptuarmos os casos de recurso para o Tribunal
Constitucional de decisões proferidas por juízes num qualquer tribunal em
questões de constitucionalidade).
Por estas razões, faremos neste ponto referência resumida ao controlo
da constitucionalidade e ao controlo da legalidade por parte do Tribunal
Constitucional, sendo que é apenas por esta via indirecta do controlo de normas
que se torna possível a protecção de direitos fundamentais pelo Tribunal.
No primeiro caso apontado de controlo está em causa a garantia da
Constituição; no segundo, a garantia do respeito de determinadas normas
infraconstitucionais.
No que respeita ao controlo da constitucionalidade, existem várias
formas de fiscalização: fiscalização abstracta preventiva por acção,
fiscalização abstracta sucessiva por acção, fiscalização sucessiva concreta
difusa e incidental por acção, fiscalização abstracta sucessiva com base no
controlo concreto, e fiscalização por omissão. Em todos eles o objecto da
fiscalização podem ser normas contidas em actos legislativos.
Na fiscalização abstracta preventiva por acção pretende-se evitar que
normas jurídicas violadoras da Lei fundamental entrem na ordem jurídica. Esta
tem por objecto restrito qualquer norma constante de tratado internacional que
tenha sido submetido para ratificação ao Presidente da República, de decreto
que lhe tenha sido enviado para promulgação como lei ou como decreto-lei ou de
acordo internacional cujo decreto de aprovação lhe tenha sido remetido para
assinatura, podendo este enviá-los ao Tribunal Constitucional para apreciação
(artigo 278.º, n.º 1); ou de qualquer norma constante de decreto legislativo
regional que tenha sido enviado para assinatura aos Representantes da
República, cabendo-lhes, quanto a estas normas, legitimidade processual activa
(n.º 2). Podem ainda requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação
preventiva da constitucionalidade de qualquer norma constante de decreto que
tenha sido enviado ao Presidente da República para promulgação como lei
orgânica, além deste, o Primeiro-Ministro ou um quinto dos Deputados à
Assembleia da República em efectividade de funções (n.º 4).
A fiscalização abstracta sucessiva por acção tem por objecto qualquer
norma, estando a cargo do Tribunal Constitucional (artigo 281.º, n.º 1, alínea
a)), que profere decisões cujos efeitos, por via de regra, serão erga omnes
[32]
.
A fiscalização sucessiva concreta difusa e incidental por acção está a
cargo de todos os tribunais, nos termos do artigo 204.º da CRP, e tem por
objecto qualquer norma jurídica que o juiz do caso deva aplicar na situação
concreta
[33]
. Como já
noutros pontos deste Relatório se explicou, da decisão que tome o juiz do caso
acerca da questão de inconstitucionalidade caberá recurso para o Tribunal
Constitucional. Estes recursos encontram-se regulados no artigo 280.º da CRP,
bem como no artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional.
A fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade com base no
controlo concreto é um tipo de fiscalização no qual a apreciação da norma pelo
Tribunal Constitucional tem lugar quando este Tribunal já anteriormente julgou
inconstitucional a norma em causa em três casos concretos, naturalmente, em
sede de recurso (artigo 281.º, n.º 3, da CRP) - a declaração de
inconstitucionalidade terá, então, força obrigatória geral.
A fiscalização da inconstitucionalidade por omissão visa verificar a
existência de omissões das medidas legislativas necessárias para tornar
exequíveis as normas constitucionais, sendo que a sua consequência é a mera
certificação, pelo Tribunal, dessa mesma omissão, participando-a ao órgão
legislativo competente (artigo 283.º, n.º 2, da CRP). A legitimidade processual
activa restringe-se, neste tipo de fiscalização, ao Presidente da República, ao
Provedor de Justiça ou, com fundamento em violação de direitos das regiões
autónomas, aos presidentes das Assembleias Legislativas das regiões autónomas
(artigo 283.º, n.º 1, da CRP).
O controlo da legalidade pelo Tribunal Constitucional tem lugar, quer
sob a forma de fiscalização concreta, quer sob a forma de fiscalização
abstracta sucessiva.
No primeiro caso, a intervenção do Tribunal dá-se, já o apontámos na
resposta à questão 6 deste Relatório, em sede de recurso de decisões tomadas
sobre a questão da legalidade por um qualquer tribunal, que produzirá efeitos
inter partes. No segundo, existirá um processo especial dirigido ao Tribunal
Constitucional, com efeitos erga omnes.
Os recursos de ilegalidade para o Tribunal Constitucional podem ter por
fundamento a decisão do juiz a quo que recusa a aplicação de norma constante de
acto legislativo com fundamento na sua violação de lei com valor reforçado
(artigo 280.º, n.º 2, alínea a), da CRP, e artigo 70.º, n.º 1, alínea c), da
Lei do Tribunal Constitucional); a decisão do juiz a quo que recusa a aplicação
de norma constante de diploma regional com fundamento na sua ilegalidade por
violação do estatuto da região autónoma (artigo 280.º, n.º 2, alínea b), da
CRP, e artigo 70.º, n.º 1, alínea d), da Lei do Tribunal Constitucional); a
decisão do juiz a quo que recusa a aplicação de norma constante de diploma
emanado de um órgão de soberania com fundamento na sua ilegalidade por violação
do estatuto de uma região autónoma (artigo 280.º, n.º 2, alínea c), da CRP, e
artigo 70.º, n.º 1, alínea e), da Lei do Tribunal Constitucional; a decisão do
juiz a quo que aplica norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o
processo com qualquer dos fundamentos referidos nos casos anteriores (artigo 280.º,
n.º 2, alínea d), da CRP, e artigo 70.º, n.º 1, alínea f), da Lei do Tribunal
Constitucional).
Neste último caso só haverá recurso de decisões que não admitam recurso
ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que
no caso cabiam, salvo os destinados a uniformização de jurisprudência (artigo
70.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
No que respeita à fiscalização abstracta da ilegalidade, prevista no
artigo 281.º, n.º 1, da CRP, estará em causa a ilegalidade de quaisquer normas
constantes de acto legislativo com fundamento em violação de lei com valor
reforçado (alínea b)); ilegalidade de quaisquer normas constantes de diploma
regional, com fundamento em violação do estatuto da região autónoma (alínea
c)); ou a ilegalidade de quaisquer normas constantes de diploma emanado dos
órgãos de soberania com fundamento em violação dos direitos de uma região
consagrados no seu estatuto (alínea d)).
A resposta a esta questão ficou já, em boa parte, respondida nos pontos
2 e 6 deste Relatório. De acordo com o estabelecido no artigo 204.º da CRP,
«Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que
infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados». Com
esta norma foi consagrado um direito de acesso directo dos juízes à
Constituição. Significa isto que a inconstitucionalidade de qualquer norma que
deva ser aplicada a um caso concreto submetido a julgamento, incluindo actos
legislativos, pode ser suscitada pelas partes, ou ex officio pelo juiz do
processo, devendo este apreciá-la e decidi-la.
Como resulta do exposto, este é um processo incidental de fiscalização
da inconstitucionalidade: o juiz tem o dever de apreciar e decidir se uma norma
que vai aplicar ao caso concreto viola a Constituição, devendo desaplicá-la
caso a considere inconstitucional, nisto se traduzindo o seu «acesso directo» à
Constituição
[34]
. A questão
da inconstitucionalidade a decidir pelo juiz surge como um incidente no
processo principal em curso, em virtude de respeitar a norma imprescindível à
solução do caso concreto. A decisão acerca desta questão incidental produzirá
efeitos restritos ao caso concreto.
Sendo o sistema português de fiscalização da constitucionalidade um
sistema misto, deve também colocar-se a questão de saber se os juízes dos
tribunais comuns podem suscitar a inconstitucionalidade de normas perante o
Tribunal Constitucional para efeitos de fiscalização abstracta preventiva ou
sucessiva da constitucionalidade por via de acção, ou em processo de
fiscalização da constitucionalidade por omissão. Nos termos da Constituição
(artigo 278.º, artigo 281.º, n.º 2, e artigo 283.º, respectivamente) os juízes
não possuem legitimidade processual activa para desencadear qualquer um destes
tipos de fiscalização. Nem mesmo no caso de processo de declaração da
inconstitucionalidade com base no controlo concreto esta possibilidade é
admitida (artigo 281.º, n.º 3, da CRP).
A apreciação da questão de constitucionalidade de uma norma surgida
durante o processo deve ser decidida pelo juiz da causa, que a desaplicará caso
a considere inconstitucional. O juiz não pode suscitar oficiosamente questões
de constitucionalidade perante o Tribunal Constitucional, visto que não existe
um mecanismo de «reenvio prejudicial» que permitisse ao Tribunal
Constitucional, a pedido de um qualquer tribunal, apreciar, a título
prejudicial, uma questão de constitucionalidade.
As normas constantes dos tratados internacionais estão subordinadas à
Constituição, consequentemente, o Tribunal Constitucional português controla a
sua constitucionalidade, quer preventiva, quer sucessivamente, nos termos do
disposto, respectivamente, nos artigos 277.º, n.º 2, 278.º, n.º 1, 279.º, n.º 4
e 280.º, n.º 3, da CRP
[35]
.
Algumas formas de inconstitucionalidade dos tratados são expressamente
consideradas irrelevantes pelo texto constitucional, no termos do n.º 2 do
artigo 277.º que estabelece: «a inconstitucionalidade orgânica ou formal de
tratados internacionais regularmente ratificados não impede a aplicação das
suas normas na ordem jurídica portuguesa, desde que tais normas sejam aplicadas
na ordem jurídica da outra parte, salvo se tal inconstitucionalidade resultar
de violação de uma disposição fundamental»
[36]
.
Pretende-se, com este preceito não pôr em causa a aplicação na ordem interna
das normas válidas constantes dos tratados em razão da violação de regras
internas meramente secundárias em matéria de competência, forma ou procedimento
de celebração ou aprovação de tratados
[37]
.
A contrario, não serão irrelevantes a inconstitucionalidade material de
tais normas
[38]
, e mesmo
tratando-se de inconstitucionalidade orgânica ou formal esta não pode resultar
da violação de disposição fundamental, sendo como tal consideradas as normas
que assumam grande relevância em termos de repartição de competências
[39]
.
As especificidades do controlo da constitucionalidade referem-se desde
logo à fiscalização abstracta preventiva da constitucionalidade: os tratados
fazem parte do núcleo restrito de normas que podem ser objecto deste tipo de
fiscalização pelo Tribunal Constitucional (artigo 278.º, n.º 1, da CRP).
Nos termos gerais, o tratado internacional deverá ser vetado pelo
Presidente da República e a superação deste veto só poderá ter lugar, nos
termos do disposto no artigo 279.º, da CRP, se a Assembleia da República o vier
a aprovar por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que
superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, caso em
que poderá este ser então ratificado pelo Presidente da República.
Também em sede de fiscalização concreta, mais especificamente em matéria
de recurso para o Tribunal Constitucional, a Constituição consagra igualmente
um regime especial aplicável aos tratados ao tornar obrigatório para o
Ministério Público o recurso para o Tribunal Constitucional quando a norma
desaplicada pelo tribunal a quo conste de convenção internacional (artigo
280.º, n.º 3, da CRP).
As alterações introduzidas em 1989 à Lei n.º 28/82 (Lei do Tribunal
Constitucional) consagraram um novo processo de verificação da contrariedade de
uma norma legislativa com uma convenção internacional, que embora não
constitucionalmente previsto, se considera admissível ao abrigo do disposto no
n.º 3 do artigo 225.º da Constituição. Trata-se de um recurso para o Tribunal
Constitucional – por isso, em sede de fiscalização concreta - de decisões
dos tribunais comuns que recusem a aplicação de norma constante de acto
legislativo com fundamento na sua contrariedade com uma convenção internacional
ou a apliquem em desconformidade com o anteriormente decidido sobre a questão
pelo Tribunal Constitucional (artigo 70.º, n.º 1, alínea i), da Lei do Tribunal
Constitucional). Este recurso incide apenas sobre questões de natureza
jurídico-constitucionais ou jurídico-internacionais implicadas na decisão
recorrida (artigo 71.º, n.º 2).
Sobre o que poderão ser consideradas «questões de natureza
jurídico-constitucionais ou jurídico-internacionais» escreveu Gomes Canotilho:
«são questões jurídico-constitucionais as que se localizam em sede de direito
constitucional (cfr. artigo 8.º), devendo ser analisadas e resolvidas segundo
as normas e princípios constitucionalmente consagrados» (v.g., problemas quanto
à posição hierárquica das normas de direito internacional, qualificação de
normas reguladoras de actos ou relações internacionais). «Serão questões jurídico-internacionais
as que se localizam no plano do direito internacional, geral, convencional e
consuetudinário, cabendo discuti-las e analisá-las à face dos princípios e
normas deste direito» (v.g., validade e vigência de uma convenção
internacional, campo de aplicação das normas internacionais, etc.).
[40]
Esta inovação processual da Lei do Tribunal Constitucional teve como
objectivo resolver a desarmonia jurisprudencial existente entre as 1.ª e 2.ª
Secções do Tribunal Constitucional relativamente ao conhecimento da
desconformidade entre direito interno e direito internacional, designadamente
convencional, já que entre 1984 e 1989 a 1.ª Secção considerava este vício como
inconstitucionalidade (violação do artigo 8.º da CRP), e a 2.ª Secção como mera
ilegalidade, declarando-se, então, incompetente para seu conhecimento
[41]
.
Em virtude das características mistas do sistema português de
fiscalização da constitucionalidade, que recebeu a influência do sistema difuso
da judicial review norte americana e do sistema concentrado austríaco (Verfassungsgerichtsbarkeit),
o acesso dos particulares à jurisdição constitucional foi regulado de modo
diverso, consoante o que esteja em causa seja a fiscalização difusa ou a
fiscalização concentrada da constitucionalidade.
No que respeita à fiscalização abstracta concentrada da
constitucionalidade, a cargo do Tribunal Constitucional, o sistema português
não contemplou uma acção constitucional de defesa, ou seja, não existe uma
acção directa de inconstitucionalidade para defesa dos direitos, liberdades e
garantias que possa ser accionada por iniciativa do cidadão, nem consagrou a
acção popular.
Já no que toca à fiscalização difusa concreta, a Constituição estabeleceu
importantes direitos de participação, traduzidos num acesso mais ou menos amplo
à jurisdição constitucional pelos particulares, muito embora também aqui não
haja sido consagrado um direito autónomo de acção, mas simplesmente um direito
de, por via incidental, suscitar a questão a propósito de norma que deva ser
aplicada ao caso sub iudice por um qualquer tribunal
[42]
.
A ausência de uma acção directa de inconstitucionalidade traduz-se na
impossibilidade de os particulares eventualmente afectados por um acto
normativo público poderem impugnar directamente a sua constitucionalidade junto
do Tribunal Constitucional. Já o não reconhecimento aos cidadãos em geral,
independentemente do seu interesse pessoal, da possibilidade de pedir a
declaração de inconstitucionalidade de um acto normativo, explica que se
sustente que no sistema português não existe uma acção popular de
inconstitucionalidade.
Estas soluções não deixaram de ser debatidas e ponderadas –
designadamente nas Revisões da Constituição ocorridas em 1989 e em 1994 –
mas dois argumentos – que traduzem dois mecanismos que assumem o
protagonismo fundamental no que se refere às vias de acesso dos particulares à
jurisdição constitucional, um ainda ligado à fiscalização abstracta, outro
referente à fiscalização concreta - parecem ter sido decisivos para o
afastamento destes meios de acesso do quadro da justiça constitucional
portuguesa.
Por um lado, o artigo 23.º da CRP confere aos cidadãos o direito de
petição perante o provedor de justiça (genericamente estabelecido no artigo
52.º da CRP, para, entre outros, defesa dos seus direitos e da Constituição),
podendo aqueles apresentar queixas por acções ou omissões dos poderes públicos.
Sendo o provedor uma das entidades com legitimidade processual activa para pedir
a fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade, por acção, nos
termos do disposto no artigo 281.º, n.º 2, alínea d), ou omissão, de acordo com
o fixado pelo artigo 283, n.º 1, ambos da CRP, acabam os cidadãos, também por
esta via, por dispor de um acesso quase directo ao Tribunal.
Por outro lado, o artigo 280.º da CRP consagra uma acção indirecta de
inconstitucionalidade, traduzida no direito conferido ao cidadão de recorrer
para o Tribunal Constitucional da decisão de qualquer tribunal que aplique
normas cuja inconstitucionalidade haja sido por si suscitada no processo (n.º
1, alínea b)), ou que recusem a aplicação de qualquer norma com fundamento na
sua inconstitucionalidade (n.º 1, alínea a)). O recurso para o Tribunal
Constitucional é restrito à matéria de constitucionalidade, não podendo este
apreciar a questão sub iudice. Este mecanismo caracteriza o acesso dos
particulares ao Tribunal Constitucional pela via do recurso relativamente a
decisões na matéria tomadas por um qualquer tribunal em sede de fiscalização
concreta, difusa e incidental da constitucionalidade.
Naturalmente, do que fica exposto resulta que o cidadão tem acesso à
justiça constitucional junto de qualquer tribunal, podendo suscitar a questão a
propósito de norma que vá ser aplicada ao caso concreto, decisão que será, em
primeira instância, decidida pelo tribunal da causa, e que só produzirá efeitos
nesse caso concreto.
A questão tem merecido alguma discussão na doutrina portuguesa.
Nos termos do artigo 12.º, n.º 2, da CRP, relativo ao princípio da
universalidade, «As pessoas colectivas gozam dos direitos e estão sujeitas aos
deveres compatíveis com a sua natureza». Se é pacífico que as pessoas
colectivas de direito privado gozam de direitos fundamentais a que não seja
inerente a referência humana, – como a liberdade de imprensa, a liberdade
de reunião, a liberdade de profissão, ou a liberdade de domicílio – não
pressupondo, então, características intrínsecas ou naturais ao homem como sejam
o corpo ou bens espirituais
[43]
,
já não há unanimidade no que respeita ao gozo de direitos fundamentais por
parte das pessoas colectivas de direito público.
Os que afastam as pessoas colectivas do gozo de direitos fundamentais
argumentam no sentido de que os estes são instituídos como uma esfera de
liberdade perante os poderes públicos pelo que, por natureza, as pessoas
colectivas públicas não poderiam gozar destes direitos. Esta tese negativa
sustenta também que as entidades públicas não poderiam ser, simultaneamente,
titulares e destinatários de direitos fundamentais
[44]
.
Ainda assim, aceita-se que gozariam de direitos processuais fundamentais, como
o direito do juiz legal ou o direito de ser ouvido (artigo 32.º da CRP)
[45]
.
Aqueles que aceitam a titularidade de direitos fundamentais por parte
das pessoas colectivas invocam que a letra do artigo 12.º, n.º 2, da CRP, não
estabelece qualquer diferenciação e, argumento de muito maior peso, que estas
pessoas poderão encontrar-se numa situação típica de sujeição, em virtude de
desempenharem tarefas que visam a realização de interesses protegidos por
direitos fundamentais
[46]
.
A questão da execução das sentenças do Tribunal Constitucional pode
colocar-se tanto no caso de fiscalização abstracta da constitucionalidade, como
nos casos de fiscalização concreta, em que a intervenção do Tribunal tem lugar
para conhecimento, em sede de recurso, de decisões de outros tribunais em
matéria de constitucionalidade proferidas no âmbito de processos que perante
estes corriam. Na primeira situação, deverá analisar-se tanto a execução de
sentenças proferidas no âmbito de processos de fiscalização abstracta
preventiva, como a sua execução em processos de fiscalização por omissão, como
ainda nos casos de processos de fiscalização abstracta sucessiva da
constitucionalidade. No segundo caso importa referir em especial a execução das
sentenças do Tribunal Constitucional pelos tribunais cujas decisões foram
objecto de recurso para este Tribunal.
A questão foi profusamente tratada em anterior Relatório deste Tribunal
[47]
.
Com a
fiscalização abstracta preventiva pretende-se evitar que entrem em vigor normas
violadoras da Constituição. De acordo com o estabelecido no artigo 279.º, n.º
1, da CRP, quando o Tribunal Constitucional se pronunciar pela
inconstitucionalidade de norma constante de qualquer decreto ou acordo
internacional, deverá o diploma ser vetado pelo Presidente da República ou pelo
Representante da República, conforme os casos, e devolvido ao órgão que o tiver
aprovado.
Nestes casos, o
decreto não poderá ser promulgado ou assinado sem que o órgão que o tiver
aprovado expurgue a norma julgada inconstitucional (n.º 2).
Mas apesar da pronúncia do Tribunal Constitucional, o diploma contendo
normas inconstitucionais poderá, nos termos previstos na Constituição, vir a
ser promulgado, assinado ou ratificado.
De facto, pode
acontecer que a norma não seja expurgada, sendo, em alternativa, o diploma
confirmado por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que
superior à maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, assim se
superando a pronúncia do Tribunal Constitucional (n.º 3).
Também no caso
de norma constante de tratado, se a Assembleia da República o vier a aprovar
por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à
maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, este poderá ser
ratificado, apesar da pronúncia de inconstitucionalidade do Tribunal
Constitucional (n.º 4).
Apesar desta
possibilidade, na prática a Assembleia da República nunca utilizou o poder
previsto no artigo 279.º, n.º 2, da CRP, podendo afirmar-se que o legislador
cumpre as decisões do Tribunal em matéria de fiscalização preventiva
[48]
.
Duas
razões parecem contribuir para este cumprimento: desde logo a possibilidade de
o Tribunal voltar a pronunciar-se sobre o diploma depois de entrar em vigor, em
sede de fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade, ou em sede de
fiscalização concreta, quando lhe seja apresentado recurso
[49]
.
Por outro lado, atendendo à obrigatoriedade de recurso imposta ao Ministério
Público quando esteja em causa a aplicação de norma já anteriormente julgada
inconstitucional pelo Tribunal Constitucional (artigo 280.º, n.º 5, da CRP),
esta sempre será uma possibilidade bem plausível.
No processo de fiscalização por omissão o Tribunal Constitucional
aprecia e verifica o não cumprimento da Constituição por omissão das medidas
legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais
(artigo 283.º, n.º 1, da CRP). A execução das decisões do Tribunal
Constitucional nestes processos pretenderia fazer com que essa omissão fosse
corrigida. Tem-no sido algumas vezes.
Frequentemente, o simples desencadear do processo no Tribunal
Constitucional, e o subsequente pedido de pronúncia deste ao órgão que deveria
ter emitido a norma leva a que o órgão inicie o processo legislativo, que
culmina com a emissão das normas em falta
[50]
.
Outras vezes, é já a decisão do Tribunal que faz apressar o processo
legislativo
[51]
.
No que diz respeito aos processos de fiscalização abstracta sucessiva
da constitucionalidade, mediante o qual o Tribunal Constitucional anula uma
norma submetida à sua apreciação, não podendo, contudo, emitir, ele mesmo,
norma substitutiva (ele é contralegislador, não é legislador
[52]
),
as decisões deste Tribunal vinculam todos os tribunais, o próprio Tribunal
Constitucional e o legislador.
A vinculação dos tribunais pela declaração de inconstitucionalidade em
processo de fiscalização abstracta sucessiva implica que estes desapliquem, nos
processos pendentes, a norma declarada inconstitucional
[53]
.
Quanto à vinculação do próprio Tribunal, significa que deve decidir em
conformidade com a declaração de inconstitucionalidade todos os recursos
pendentes
[54]
.
São efeitos típicos da declaração de inconstitucionalidade, o de
eliminar retroactivamente da ordem jurídica a norma inconstitucional, desde o
momento da entrada em vigor desta última, e o de repristinar a norma revogada
pela norma declarada inconstitucional (artigo 281.º, n.º 1, da CRP). Mas a
declaração com força obrigatória geral da inconstitucionalidade de uma norma
constituirá o legislador no dever de não reproduzir a norma declarada
inconstitucional, incorrendo no mesmo tipo de inconstitucionalidade que foi
declarada? Isto é, terá a decisão um efeito preclusivo? Assim parece, visto que
sempre o Tribunal poderia ver a pronunciar-se no mesmo sentido após a emissão
da mesma norma desde que tal lhe fosse solicitado
[55]
.
Claro que a extensão deste efeito preclusivo depende do tipo de vício que
esteja em causa, uma vez que, tratando-se de vício orgânico ou formal a norma
poderá ser de novo editada desde que seja ultrapassada a sua deficiência quanto
a estes aspectos.
Também não será permitido ao legislador neutralizar ou contrariar tais
declarações de inconstitucionalidade através de convalidação retroactiva, por
acto legislativo, de actos administrativos praticados com base numa norma
declarada inconstitucional sem restrição de efeitos
[56]
.
Nos processos de fiscalização concreta as decisões do Tribunal
Constitucional em sede de recurso de decisões proferidas por um qualquer
tribunal em matéria de constitucionalidade apenas valem para o caso concreto,
ou seja, não têm força obrigatória geral, mas fazem caso julgado no processo
respectivo quanto à questão de constitucionalidade (artigo 80.º, n.º 5 da Lei
do Tribunal Constitucional), admitindo-se, inclusivamente, recurso para o
Tribunal Constitucional por motivo de violação, pelo tribunal a quo, do caso
julgado fixado por decisão deste em sede de recurso de fiscalização concreta
[57]
.
Nos termos do n.º 2 do artigo 80.º da Lei do Tribunal Constitucional, se o
Tribunal Constitucional der provimento ao recurso (ainda que só parcialmente),
o Tribunal revoga a decisão recorrida e os autos baixam ao tribunal de onde
provieram, a fim de que este reforme a decisão ou, caso se trate de tribunal
superior, a mande reformar, em conformidade com o julgamento sobre a questão da
inconstitucionalidade - tal significa que o tribunal está impedido de voltar a
aplicar a norma (ou a interpretação normativa) julgada inconstitucional, muito
embora isso nem sempre implique uma alteração do sentido da decisão da questão
principal.
Importa, ainda, acentuar que, nos casos em que o juízo de
constitucionalidade ou de legalidade formulado pelo Tribunal Constitucional
assentar em determinada interpretação da norma infraconstitucional em causa,
esta deve ser aplicada, na reforma da decisão recorrida. com tal interpretação.
Uma última nota breve sobre a questão da fiscalização das decisões do
Tribunal Constitucional – Quis custodiet custodes?
Sendo o Tribunal Constitucional o órgão máximo de fiscalização da
constitucionalidade, das suas decisões não cabe recurso para qualquer outro
órgão. Assim, como refere Jorge Miranda «A resposta há-de procurar-se no rigor
dos seus juízes, na capacidade para encontrarem a síntese das suas diferentes
formações e precompreensões, no seu apego ao princípio de legitimidade em que
se esteia o Tribunal. Há-de procurar-se também na consciência
jusconstitucionalística da comunidade, em interacção e diálogo com eles. E
ainda na apreciação crítica da doutrina especializada»
[58]
.
O que fica dito não significa que não ocorram conflitos entre secções
do Tribunal Constitucional
[59]
.
Como se referiu, o sistema português de fiscalização da constitucionalidade
é hoje puramente jurisdicional, sendo a defesa da Constituição levada a cabo
pelo Tribunal Constitucional, bem como por qualquer outro tribunal, embora em
diferentes moldes. As funções atribuídas a estas entidades são, como vimos,
diversas, tendo a construção do sistema, apesar de misto, contribuído para
reduzir potenciais conflitos.
Os tribunais em geral apenas são competentes para o controlo concreto e
incidental da constitucionalidade: o juiz do processo deve apreciar e decidir
acerca da inconstitucionalidade de norma relevante para a solução do feito
submetido a julgamento, devendo desaplicá-la caso a considere violadora da Lei
Fundamental.
Apesar deste poder atribuído a qualquer tribunal, é ao Tribunal
Constitucional que cabe a última palavra acerca da decisão sobre a questão de
constitucionalidade resolvida pelo juiz do processo, podendo esta norma ser
objecto de recurso para este órgão jurisdicional supremo. Simultaneamente o
Tribunal Constitucional é também, por natureza, e em exclusivo a instância de
controlo abstracto da constitucionalidade.
O sistema português, apesar de sistema misto, não está construído de
molde a potenciar conflitos ou desarmonia de julgados. Na verdade, no caso da
fiscalização concreta, a última palavra cabe ao Tribunal Constitucional, pelo
que a decisão final, mesmo com efeitos restritos ao caso sub iudice, será deste
Tribunal, o que funcionará como maior garante de harmonia entre decisões
restritas ao caso concreto, entre si, e entre estas e decisões com força
obrigatória geral. Caso o sistema tivesse sido construído de modo a que o
conhecimento dos recursos das decisões de inconstitucionalidade dos tribunais
em geral fosse concedido a uma sala de um Tribunal Supremo (v.g., o Supremo
Tribunal de Justiça), ficando a fiscalização abstracta sucessiva a cargo de um
outro Tribunal fora da ordem judicial (o Tribunal Constitucional), aí sim,
aumentaria a probabilidade de desarmonia de julgados
[60]
.
Para evitar conflitos contribui igualmente o regime previsto
relativamente à execução das decisões do Tribunal Constitucional pelos
tribunais em geral e pelo próprio Tribunal Constitucional.
Quando a decisão respeite a processo de fiscalização abstracta
sucessiva da constitucionalidade, o Tribunal Constitucional estará vinculado
pela sua própria declaração de inconstitucionalidade, devendo decidir em
conformidade com essa declaração todos os recursos pendentes. Relativamente aos
tribunais em geral, estes são obrigados a desaplicar nos processos pendentes, a
norma declarada inconstitucional.
No que respeita à fiscalização concreta, quando o Tribunal
Constitucional der provimento ao recurso este procede à revogação da decisão
recorrida em matéria de constitucionalidade, baixando os autos ao tribunal a
quo, a fim de que este reforme a decisão ou, caso se trate de tribunal
superior, mandar reformá-la, em conformidade com o julgamento sobre a questão
da inconstitucionalidade.
Também o processo de declaração da inconstitucionalidade com base no
controlo concreto é relevante para a compreensão das articulações do sistema
misto que visam evitar incongruências. Este permite o trânsito do controlo
difuso, concreto e incidental para o controlo concentrado quando o Tribunal
Constitucional tiver já julgado inconstitucional, na sequência de recurso, uma
norma em três casos concretos. O processo de generalização transforma em
efeitos erga omnes os efeitos inter partes que caracterizavam a decisão de cada
um dos três recursos anteriormente decididos acerca da aplicação da mesma norma
[61]
.
São várias as perspectivas a ter em conta nesta questão. Escolhemos
fazer referência breve à questão da vinculação do Tribunal Constitucional pela
jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, e do Tribunal de
Justiça das Comunidades Europeias.
Para que se compreenda melhor esta relação convém salientar que a
intervenção do Tribunal Constitucional português está limitada ao controlo de
normas, e não à sua aplicação, v.g. pela Administração Pública, ou ao
conhecimento de situações de violação directa de direitos fundamentais.
Este ponto permite desde logo compreender que é bem diversa a
competência do Tribunal Constitucional, que apenas por via indirecta, de
controlo de inconstitucionalidade de normas, poderá contribuir para a defesa de
direitos fundamentais, e a competência do TEDH, especialmente vocacionada para
este fim. Consequentemente, a potencial sobreposição prática de competências será
quase nula.
Ainda assim, importará apurar, noutra perspectiva, se a jurisdição
constitucional não estará vinculada à jurisprudência do Tribunal Europeu dos
Direitos do Homem, fora dos casos impostos na CEDH
[62]
.
Tem-se entendido que não, designadamente pelo facto de existirem na DEDH
mecanismos que permitam ao TEDH rever as decisões dos tribunais nacionais,
designadamente, do Tribunal Constitucional, o que retira alcance prático à
potencial vinculação da jurisprudência do TEDH
[63]
.
Ainda assim, o Tribunal Constitucional seguiu, em várias ocasiões, as decisões
do TEDH.
Para compreender a relação entre as duas jurisdições é igualmente
interessante saber se o recurso para o Tribunal Constitucional de uma questão
de constitucionalidade decidida pelo juiz do caso deve ser considerado para
efeitos de esgotamento das vias de recurso internas enquanto requisito para o
acesso ao TEDH: tem-se maioritariamente entendido que tal não é condição,
nomeadamente por que o acesso ao Tribunal Constitucional português é feito para
mero controlo da constitucionalidade de normas, e não para protecção directa e
imediata de direitos fundamentais, como se referiu
[64]
.
Também devem ser referidas algumas questões a propósito da relação
entre a jurisdição constitucional portuguesa e o Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias, pois em virtude das suas competências este poderá
pronunciar-se sobre normas protectoras de direitos fundamentais, tanto mais que
a Carta dos Direitos Fundamentais assim o potencia.
Este Tribunal tem-se considerado exclusivamente competente para
conhecer da aplicação do direito comunitário, cabendo-lhe decidir acerca da
invalidade e interpretação das regras comunitárias, o que pode significar que
os tribunais em geral, incluindo o Tribunal Constitucional português, terão de
recorrer ao mecanismo do reenvio prejudicial sempre que pretendam ver declarada
a nulidade ou desaplicada uma regra comunitária. De todo o modo, deve ter-se em
conta que o Tribunal Constitucional, como todos os tribunais nacionais, estaria
vinculado à interpretação ou juízo de validade que o Tribunal de Justiça das
Comunidades faça do direito comunitário.
O Tribunal Constitucional português, nos Acórdãos n.º 184/89 e n.º
163/90, admitiu a possibilidade de recurso a este mecanismo
[65]
.
E no Acórdão n.º 621/98 chegou mesmo a considerar que, envolvendo a recepção do
direito comunitário a recepção de mecanismos institucionais que visam garantir
a sua aplicação do direito comunitário, ou seja uma instância jurisdicional
comunitária vocacionada para sua tutela, seria incongruente que se fizesse
intervir para o mesmo efeito, no plano nacional, uma outra instância do mesmo
ou semelhante tipo, no caso, o Tribunal Constitucional
[66]
.
Na doutrina, em escrito recente, Moura Ramos considera que apesar de o
Tribunal Constitucional não se ter ainda pronunciado sobre a sua hipotética
competência para conhecer de uma eventual incompatibilidade de regras
comunitárias com os preceitos constitucionais, «sempre estaria em aberto um
potencial conflito com a actual jurisprudência do Tribunal de Justiça» por se
entender que a «Constituição nacional se mantém como padrão de juridicidade
último no espaço nacional – e portanto também em relação às regras do
direito comunitário -, mesmo que em termos de apenas estar em causa a salvaguarda
de um seu “núcleo essencial”»
[67]
.
Integrariam este núcleo, segundo Cardoso da Costa «a protecção dos direitos
fundamentais e com a garantia do respeito das “singularidades” próprias de cada
Constituição nacional»
[68]
.
[1]
Sobre estes e outros meios e institutos
de defesa da Constituição: CANOTILHO, José Joaquim Gomes/MOREIRA, Vital, Fundamentos
da Constituição, Coimbra
Editora, Coimbra, 1991, p. 236; Ver também CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Direito
Constitucional e Teoria da Constituição, 4.ª Edição, Almedina, 2000, p. 860-861.
[2]
Que não deve confundir-se com «garantias
constitucionais», relativas ao direito de os cidadãos exigirem dos poderes
públicos a protecção dos seus direitos e a consagração de meios processuais
para sua defesa, como refere Gomes Canotilho: Ob.Cit., p. 860. Ver também CANOTILHO, José
Joaquim Gomes/MOREIRA, Vital, Fundamentos da Constituição, Cit., p. 236.
[3]
Veja-se o poder conferido à Assembleia da
República de «vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis», no artigo
162.º, alínea a), da
CRP.
[4]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob. Cit, p. 860-861.
[5]
O artigo estabelecia o seguinte: «o Poder Judicial, desde que, nos feitos submetidos a
julgamento, qualquer das partes impugnar a validade da lei ou dos diplomas
emanados do poder executivo ou das corporações com autoridade pública, que
tiverem sido invocados, apreciará a sua legitimidade constitucional ou
conformidade com a Constituição e princípios nela consagrados».
[6]
Entre outros, MIRANDA, Jorge, Manual
de Direito Constitucional, Tomo II, 3.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1991, p. 391 e ss.
MOREIRA, Vital, «O Tribunal Constitucional Português: a “fiscalização concreta”
no quadro de um sistema misto de justiça constitucional», Sub Iudice
(Justiça e Sociedade), p,
95 e ss.
[7]
Artigo 204.º da CRP.
[8]
Artigo 281.º, n.º 1, alínea a), da CRP.
[9]
O n.º 1 do artigo 278.º da CRP estabelece
que: «O Presidente da República pode requerer ao Tribunal Constitucional a
apreciação preventiva da constitucionalidade de qualquer norma constante de tratado
internacional que lhe tenha sido submetido para ratificação, de decreto que lhe
tenha sido enviado para promulgação como lei ou como decreto-lei ou de acordo
internacional cujo decreto de aprovação lhe tenha sido remetido para
assinatura».
[10]
Artigo 283.º, n.º 1, da CRP.
[11]
Qualquer dos juízes do TC pode também
fazer desencadear o processo.
[12]
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito
Constitucional, Tomo VI,
Coimbra Editora, Coimbra, 2001, p. 194; CANOTILHO, José Joaquim Gomes/ MOREIRA,
Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, p.
797.
[13]
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito
Constitucional, Tomo VI,
Cit., p. 176.
[14]
Entretanto revista alterada pela Lei n.º 143/85, de 26 de Novembro, pela Lei n.º
85/89, de 7 de Setembro, pela Lei n.º 88/95, de 1 de Setembro, e pela Lei n.º
13-A/98, de 26 de Fevereiro.
[15]
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito
Constitucional, Tomo VI,
Cit., p. 136.
[16]
O mesmo artigo estabelece ainda:
«2. Podem existir tribunais marítimos, tribunais arbitrais e julgados
de paz.
3. A lei determina os casos e as formas em que os tribunais previstos
nos números anteriores se podem constituir, separada ou conjuntamente, em
tribunais de conflitos.
4. Sem prejuízo do disposto quanto aos tribunais militares, é proibida
a existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas
categorias de crimes».
[17]
Sustentando o carácter inequivocamente
jurisdicional do Tribunal Constitucional, quando este era ainda uma jovem
instituição: CANAS, Vitalino, Os processos de fiscalização da
constitucionalidade e da legalidade pelo Tribunal Constitucional, Coimbra Editora, Coimbra, 1986, p. 24.
Sobre a sua origem histórica: COSTA, José Manuel Cardoso da, «O Tribunal Constitucional português: a sua origem
histórica», Portugal O Sistema
Político e Constitucional 1974-87,
Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, p. 913 e ss.
[18]
Ver, v.g., MIRANDA, Manual de Direito Constitucional, Tomo VI, Cit., p. 117.
[19]
Ver, v.g. CANOTILHO, José Joaquim Gomes/ MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada,
Cit., p. 833-834.
[20]
Acórdão n.º 316/85, de 18 de Dezembro de
1985.
[21]
Em especial sobre este recurso: DOMINGOS,
Inês/ PIMENTEL, Margarida Menéres, «O Recurso de Constitucionalidade (espécies
e respectivos pressupostos)», Estudos
sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Lisboa, 1993, p. 429
e ss.
[22]
Comparando os sistemas: MIRANDA, Jorge, Manual
de Direito Constitucional, Tomo VI, Cit., p. 188-189.
[23]
Sobre a questão: CANOTILHO, José Joaquim
Gomes, Ob. Cit., p.
969 e ss.
[24]
Salvo quando se trate de recurso
obrigatório para o Ministério Público, cabendo, então, recurso directo.
[25]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob Cit., p. 969.
[26]
A Lei orgânica do regime do referendo é a
Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril. O regime do referendo local consta da Lei
orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto.
[27]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes/ MOREIRA,
Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Cit., p. 664; Acórdão nº 59/95, in Diário da República, I Série-A, n.º 59,
de 10 de Março de 1995.
[28]
Cfr. Acórdão n.º 17/94, in Diário da República, II Série, nº 76, de
31-3-1994. Diz o artigo: «Compete ao Tribunal
Constitucional declarar, nos termos e para os efeitos da Lei n.º 64/78, de 6 de
Outubro, que uma qualquer organização perfilha a ideologia fascista e decretar
a respectiva extinção». A Lei n.º 64/78 dá execução ao n.º 4 do artigo 46.º da CRP que proíbe as
organizações que perfilhem a ideologia fascista.
[29]
«Compete ao Tribunal Constitucional receber as
declarações de património e rendimentos, bem como as declarações de
incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos, e tomar as
decisões sobre essas matérias que se encontrem previstas nas respectivas leis.».
[30]
É a Entidade das Contas e Financiamentos
Políticos que auxilia o Tribunal Constitucional no exercício destas funções:
esta é «um órgão independente que funciona junto do Tribunal Constitucional
e tem como atribuição coadjuvá-lo tecnicamente na apreciação e fiscalização das
contas dos partidos políticos e das campanhas eleitorais para Presidente da
República, para a Assembleia da República, para o Parlamento Europeu, para as
Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas e para as autarquias locais». Esta entidade foi criada pela Lei
Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro.
[31]
Sobre a questão em geral, v.g., ALMEIDA, Luís Nunes de, A Justiça constitucional no Quadro das Funções
do Estado vista à luz das Espécies, Conteúdo e Efeitos das Decisões sobre a
Constitucionalidade das Normas Jurídicas; Lisboa, 1987, disponível em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020102.html.
[32]
Sobre este tipo de fiscalização em
especial pode ver-se: ANTUNES, Miguel Lobo, «Fiscalização Abstracta da Constitucionalidade
- Questões Processuais», Estudos sobre a
Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Cit., p. 399 e ss.
[33]
FONSECA, Guilherme da, «Fiscalização
concreta da constitucionalidade e da legalidade», Scientia Ivridica, Ano XXXIII (1984),
n.ºs 191-192, p. 455 e ss.
[34]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob Cit., p. 956-957.
[35]
Sobre a subordinação das normas
constantes de tratados internacionais à Constituição pode ver-se, nomeadamente:
MIRANDA, Jorge/MEDEIROS, Rui, Constituição da República Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, 2005,
p. 86 e ss; MEDEIROS, Rui, «Relações entre normas constantes de convenções
internacionais e normas legislativas na Constituição de 1976», O Direito, Ano 122 (1990), II, p. 355 e
ss.
[36]
Sobre esta questão: ARAÚJO, António de,
«Relações entre o Direito Internacional e o Direito Interno - Limitação dos
Efeitos do Juízo de Constitucionalidade (a norma do artigo 277,2 da CRP)», Estudos sobre a Jurisprudência Constitucional,
Cit., p. 18 e ss.
[37]
Ver sobre o assunto: CANOTILHO, José
Joaquim Gomes/MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Cit.,p. 998 e ss.
[38]
Nem as constantes de simples acordos.
[39]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes/MOREIRA,
Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Cit., p. 999. Sobre o que seja disposição
fundamental exemplificam os autores com as normas de competência exclusiva da
Assembleia da República para aprovar as convenções internacionais que versem
matéria da sua competência reservada (artigo 164.º, alínea j), hoje artigo 161.º, alínea i), da CRP), assim como com o direito das
regiões autónomas de participação nas negociações de tratados e acordos
internacionais que directamente lhes digam respeito 229.º, n.º 1, alínea s), hoje artigo 227.º, n.º 1, alínea t)).
[40]
Sobre este processo pode ver-se,
designadamente, CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob. Cit, p. 1011 e ss; COSTA, José Manuel Cardoso da, A jurisdição
constitucional em Portugal, 2.ª Edição, Coimbra, 1992, p. 27.
[41]
Sobre essa divergência: CANOTILHO, José
Joaquim Gomes, Ob. Cit, p. 1012; MENDES, Armindo Ribeiro/ UCHA, Ana Paula, Os orgãos de
fiscalização da Constitucionalidade: funções, competências, organização e papel
no Sistema Constitucional perante os demais poderes do Estado (I
Conferência da Justiça Constitucional da Ibero-América), disponível em
: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020301.html.
[42]
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Os
direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2001, p.
360 e ss.
[43]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob Cit., p. 412-413.
[44]
CANOTILHO/MOREIRA, Vital, Constituição
da República Portuguesa Anotada, Cit., p. 123.
[45]
Ver, por todos, CANOTILHO/José Joaquim
Gomes, Ob Cit., p.
413-414.
[46]
Ibidem, p.
413-414.
[47]
A execução das decisões do Tribunal Constitucional pelo legislador, Conferência Tripartidas Portugal,
Espanha e Itália, Roma 2001, da autoria de Miguel Nogueira de Brito, Joaquim Pedro
Cardoso da Costa e António de Araújo, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020201.html. Texto
igualmente disponível em: Sub Iudice (Justiça e Sociedade), Janeiro/Junho
de 2001, p. 111 e ss. Sobre a questão pode ver-se também: MARQUES, António Rocha, «O Tribunal Constitucional
e os outros tribunais: a execução das decisões do TC», Estudos sobre a Jurisprudência do Tribunal
Constitucional, Cit., p. 453 e ss.
[48]
Ao contrário da Assembleia Regional dos
Açores: Acórdão n.º 190/87, no qual o Tribunal
Constitucional se pronunciou pela inconstitucionalidade de todas as normas
constantes do Decreto Legislativo Regional n.º 8/87/A, a Assembleia Regional
dos Açores fez uso do poder que lhe é atribuído pelo n.º 2 do artigo 279.º, da
CRP, reapreciando o diploma e confirmando-o.
[49]
Como aconteceu no caso do Acórdão n.º
85/85, in Acórdãos do Tribunal
Constitucional, Vol. 6, p. 245 e ss.
[50]
No Acórdão n.º 276/89 (in Diário da República, II Série, de 12 de
Junho de 1989) deu-se por não verificada a omissão de medidas legislativas
necessárias para tornar exequível o artigo 120º, n.º 3, da CRP visto ter sido
entretanto aprovada a Lei n.º 34/87, de 16 de Julho; com o Acórdão n.º 36/90
(in Diário da República, II Série,
de 4 de Julho de 1990) o Tribunal Constitucional decidiu não dar por verificada
a omissão da medida legislativa prevista no artigo 241.º, n.º 3, da CRP, por
estar a decorrer o processo legislativo, havendo já sido votado na
generalidade; com o Acórdão n.º 638/95 (in Diário da República, II Série, de 28 de
Dezembro de 1995) o Tribunal Constitucional também decidiu não dar por
verificada a omissão das medidas legislativas necessárias à exequibilidade da
norma do artigo 52.º, n.º 3, da CRP, por entretanto ter sido publicado a Lei
n.º 83/95, de 31 de Agosto, sobre o direito de participação procedimental e de
acção popular.
[51]
Foi o que aconteceu depois da emissão do
Acórdão n.º 182/89 (in Diário da República,
I Série, de 2 de Março de 1989), no qual o Tribunal Constitucional decidiu dar
«por verificado o não cumprimento da Constituição por omissão da medida
legislativa prevista no n.º 4 do seu artigo 35º, necessária para tornar
exequível a garantia constante do n.º 2 do mesmo artigo».
[52]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes/MOREIRA,
Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Cit., p. 1045. Deve mesmo «abster-se de
quaisquer indicações precisas que não sejam necessárias pela justificação da
inconstitucionalidade».
[53]
Neste sentido, CANOTILHO, José Joaquim
Gomes, Cit., p. 983.
[54]
Ibidem, p. 983. V.g., Acórdão n.º 55/99, in DR I, de 19 de Fevereiro.
[55]
Para mais desenvolvimentos: A execução
das decisões do Tribunal Constitucional pelo legislador, Conferência Tripartidas Portugal,
Espanha e Itália, Roma 2001, da autoria de Miguel Nogueira de Brito, Joaquim Pedro
Cardoso da Costa e António de Araújo, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020201.html.
[56]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob Cit., p. 982. Ver na jurisprudência, v.g., Acórdão n.º 23/83, in DR II, de 1 de Fevereiro de 1984, ou
Acórdão n.º 142/85, in Acórdãos do Tribunal Constitucional,
Vol. 6, p. 81 e ss. Para outros exemplos menos significativos de vinculação do
legislador pelas declarações de inconstitucionalidade: A execução das
decisões do Tribunal Constitucional pelo legislador, Conferência Tripartidas Portugal, Espanha e
Itália, Roma 2001, da autoria de Miguel Nogueira de Brito, Joaquim Pedro Cardoso da
Costa e António de Araújo, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020201.html.
[57]
V.g., Acórdão n.º
532/99, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol. 45, 1999, p. 101 e ss., e Acórdão n.º
340/00, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol. 47, 2000, p. 541 e ss.
[58]
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito
Constitucional, Tomo VI,
Cit., p. 185.
[59]
A doutrina cita algumas vezes os
conflitos existentes entre a 1.ª e 2.ª secções do Tribunal em matéria de
relações do direito internacional com o direito interno, que teria conduzido à
inclusão, na Lei do Tribunal Constitucional, de um processo de verificação da
contrariedade de uma norma legislativa com uma convenção internacional.
[60]
MIRANDA, Jorge, Manual de Direito
Constitucional, Tomo VI,
Cit., p. 193; Idem, «A
jurisprudência do Tribunal Constitucional em 1995», O Direito, 1996, p. 137 e ss.
[61]
CANOTILHO, José Joaquim Gomes, Ob Cit., p. 994-995.
[62]
Sobre o tema:
ARAÚJO, António de/
BRITO, Luís Miguel Nogueira de/ COSTA, Joaquim Pedro Cardoso da, As relações entre
os tribunais constitucionais e as outras jurisdições nacionais, incluindo a
interferência, nesta matéria, da acção das jurisdições europeias, disponível em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020108.html; RAMOS, Rui Manuel Moura, «A Carta de
Direitos Fundamentais da união Europeia e a protecção dos direitos
fundamentais», Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Rogério Soares, Coimbra
Editora, Coimbra, 2001,
p. 963 e ss.
[63]
Sobre a questão: VITORINO, António, Protecção Constitucional e Protecção
Internacional dos Direitos do Homem: Concorrência ou Complementaridade, Lisboa, 1993, disponível em:
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020105.html.
[64]
Como referem, António de Araújo, Luís
Miguel Nogueira de Brito e Joaquim Pedro Cardoso da Costa, isto não significa
que o Tribunal Constitucional não se tenha pronunciado em questões que tenham
depois vindo a ser decididas pelo TEDH. Os casos citados reflectem,
inclusivamente, uma sintonia de decisões, As relações entre os tribunais
constitucionais e as outras jurisdições nacionais, incluindo a interferência,
nesta matéria, da acção das jurisdições europeias, Cit.
[65]
Respectivamente publicados no DR I, de 9 de Março de 1989, p. 1044 e ss; e Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol. 16, 1990, p. 301 e ss.
[66]
Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol., 1998, p. 301 e ss.
[67]
RAMOS, Rui Manuel Moura, Os Tribunais
Constitucionais perante a nova Constituição Europeia (incluindo a Carta dos
Direitos Fundamentais) e a sua futura articulação com o Tribunal de Justiça das
Comunidades Europeias (e com o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem) - A revisão dos Tratados da União
Europeia e das Comunidades Europeias e a posição futura dos Tribunais
Constitucionais dos Estados-Membros, disponível em: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/textos020202.html.
[68] COSTA, José Manuel Cardoso da, Ob. Cit.