Comunicado Acórdão n.º 307 /2025 - Morte Medicamente Assistida
Tribunal Constitucional declara inconstitucionais algumas normas da
Lei da Morte Medicamente Assistida
O Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais, com força obrigatória geral, as seguintes normas da Lei da Morte Medicamente Assistida: o n.º 1 do artigo 9.º, no segmento em que se dispõe que «(…) o médico orientador(…) combina o (…) método a utilizar para a prática da morte medicamente assistida (…)»; a alínea e) do n.º 1 do artigo 16.º, no segmento em que se dispõe que «[a] decisão do doente sobre o método de morte medicamente assistida»; a alínea c) do artigo 19.º, no segmento em que se dispõe «(…) para que aquele possa escolher e decidir de forma esclarecida e consciente»; o n.º 1 do artigo 6.º, ao não exigir que o doente seja examinado pelo médico especialista, e, em consequência, o n.º 1 do artigo 3.º, a disposição que legaliza, em determinadas condições, a morte assistida; e o n.º 2 do artigo 21.º, no segmento em que se impõe ao profissional de saúde que recusa praticar ou ajudar o ato de morte medicamente assistida o ónus de especificar a natureza das razões motivantes. As demais normas cuja apreciação da constitucionalidade foi requerida – quase todas as que integram o diploma – não foram declaradas inconstitucionais.
Processos n.ºs 1110/2023 e 271/2024
Acórdão n.º 307/2025
Morte Medicamente Assistida
1. Em 22 de abril de 2025, foi proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional o Acórdão n.º 307/2025, que apreciou, a pedido de um grupo de deputados à Assembleia da República (Processo n.º 1110/2023) e da Senhora Provedora de Justiça (Processo n.º 271/2024), a constitucionalidade da quase totalidade das normas que integram a Lei n.º 22/2023, de 25 de maio (Lei da Morte Medicamente Assistida − LMMA).
2. O Tribunal Constitucional reiterou e aprimorou a sua jurisprudência (Acórdãos n.ºs 123/2021 e 5/2023), no sentido de que a Constituição não impõe nem proíbe categoricamente a legalização da morte assistida, confiando ao legislador uma margem de ponderação entre os valores da liberdade individual e da vida humana, nomeadamente em situações clínicas marcadas pela gravidade, irreversibilidade e sofrimento. A morte assistida, como questão de princípio, é um problema de ordem política, cabendo ao legislador, no gozo da sua legitimidade democrática, arbitrar a tensão perene entre valores constitucionais de sentido contrário neste domínio de vida caracterizado pelo dissenso persistente e razoável entre os cidadãos [pontos 14. a 17].
3. Para além da questão principal da compatibilidade da morte medicamente assistida com o quadro constitucional, o Acórdão aprecia largas dezenas de questões de constitucionalidade, agrupadas nas seguintes categorias: subsidiariedade da eutanásia em relação ao suicídio [pontos 17. a 19.]; indicações clínicas da morte assistida [pontos 20. a 23.]; definição legal do conceito de sofrimento [pontos 24. e 25.]; conceitos indeterminados de doença e lesão [pontos 26. e 27.]; garantia de prestação de cuidados paliativos [pontos 28. e 29.]; e numerosas questões relativas ao procedimento de morte medicamente assistida [pontos 30. a 52.]. O Tribunal formulou, quanto a quase todas as questões colocadas, juízos de não inconstitucionalidade, refletidos na alínea e) da decisão. Porém, quanto a três questões formaram-se maiorias no sentido da inconstitucionalidade.
4. Em primeiro lugar [ponto 18.], o Tribunal declarou a inconstitucionalidade de vários segmentos da lei que pressupõem que o doente tem o direito a escolher entre os dois métodos de morte medicamente assistida – suicídio ou eutanásia −, quando, na sua atual versão, a lei só consente a eutanásia se o doente estiver fisicamente impossibilitado de autoadministrar os fármacos letais. No entender do Tribunal, estes lapsos do legislador, numa matéria extremamente sensível, podem criar dificuldades desnecessárias ao intérprete e geram um risco evitável de má aplicação do direito, ofendendo o princípio constitucional da segurança jurídica [alínea a) da decisão].
5. Em segundo lugar [ponto 37.], o Tribunal declarou a inconstitucionalidade da norma que regula o modo de intervenção do médico especialista na patologia que afeta o doente, ao não exigir que este seja examinado, ao contrário das legislações estrangeiras que consagram regimes de eutanásia mais próximos do português – a belga, a luxemburguesa e a espanhola. No entender do Tribunal, a omissão desta exigência comum põe em causa a idoneidade, objetividade, impassibilidade e confiabilidade do juízo médico de verificação das indicações clínicas da morte assistida, o que se traduz numa tutela deficitária da vida humana e na violação da reserva de lei parlamentar [alínea b) da decisão]. A inconstitucionalidade desta norma tem por consequência a inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 3.º da LMMA, uma vez que inquina a própria decisão de legalizar, em determinadas condições, a morte medicamente assistida [alínea c) da decisão].
6. Em terceiro lugar [ponto 52.], o Tribunal declarou a inconstitucionalidade da norma que impõe ao profissional de saúde que recusa praticar ou ajudar o ato de morte medicamente assistida o ónus de especificar a natureza das razões que o motivam, por entender que a mesma constitui uma restrição desadequada, desnecessária e desproporcional da liberdade de consciência, na vertente negativa da liberdade de não manifestar a terceiros as convicções pessoais [alínea d) da decisão] .
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