Manuel da Costa Andrade
Tomada de Posse
27 de julho de 2016
Tribunal Constitucional
Ex.mas Senhoras e Senhores Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional
Ex.mos Senhores Representantes do Ministério Público Junto do Tribunal Constitucional
Ex.ma Senhora Presidente e Membros da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos
Ex.ma Senhora Secretária-Geral
Senhores Assessores
Senhoras e Senhores Funcionários
1. As circunstâncias conhecidas que antecederam este acto — particularmente a aceleração quase estonteante do processo que nos trouxe aqui — ditaram o tempo e o modo da sua concretização. Recordo, no que pessoalmente me respeita, que vi confirmado o convite para integrar a lista de candidatos ao Tribunal na Sexta-feira, dia 15 deste mês. Para, na Terça-feira seguinte, ser chamado a audição parlamentar e no dia seguinte ser eleito pela Assembleia da República; e no dia seguinte, ia já adiantada a tarde, ser convocado para no dia seguinte tomar posse perante Sua Excelência o Senhor Presidente da República. Para no momento seguinte participar na eleição do Presidente e do Ex.mo Senhor Vice-Presidente do Tribunal. Para no instante seguinte, ser confrontado com a urgência da tomada de posse do Presidente e do Ex.mo Senhor Vice-Presidente. Uma urgência ditada pela exigência de, sem demora, reintegrar o corpo, reorganizar a estrutura e restabelecer a capacidade funcional do Tribunal, como condição inultrapassável da resposta às suas responsabilidades e do cumprimento das suas plúrimas e complexas tarefas.
Por ser assim, entendeu o Tribunal Constitucional que, não podendo ser antes, a posse teria de ocorrer hoje. Como entendeu que os constrangimentos de tempo não permitiam pôr de pé uma cerimónia ao estilo do que vinha sendo mais frequente na história do Tribunal. Uma posse ritualizada coram populum, aberta à presença de representantes qualificados de outros órgãos e instâncias do Estado, particularmente das demais magistraturas, que connosco concorrem para o desvelamento, a declaração e a actualização do direito. E, para além disso e sobretudo, exposta à assistência e ao escrutínio do povo, instância matricial e última da legitimação da nossa existência e da nossa acção. E também — porque não admiti-lo? — sob o olhar reconfortante daqueles que, por vínculos de sangue ou laços de afecto, acabam por viver estes gestos com mais intensidade e maior pathos do que nós próprios. Mesmo com mais felicidade. Logo porque mais tocados pela cor e pelo perfume das rosas do que pelos espinhos. Esses sobram inteiros para nós.
O que, importa sublinhá-lo, não contende em nada com o sentido e o significado de um gesto com a transcendência deste que aqui nos reuniu: não lhe retira densidade simbólica; não prejudica a sua legitimidade institucional, constitucional e legal— certo como é que, de acordo com a norma, o Presidente e o Vice-Presidente tomam posse perante o Tribunal—; nem frustra a sua intencionalidade e a sua funcionalidade.
Não podem, de resto, desatender-se as manifestas virtualidades desta atitude de aparente recuo para a esfera de reserva e de evasão face aos estímulos e ruídos do ambiente. Que pode também ser interpretada como a procura de um ponto de reencontro e reagrupamento, em busca de um insubstituível momento de reflexão e, se necessário, de crítica, de reavaliação das coisas bem e menos bem sucedidas. E, sobretudo, como forma de celebração e de reafirmação contrafáctica das normas e da constelação de valores da Constituição. E particularmente da sua exigente carta de liberdades: tanto as liberdades de ser, como as liberdades para ser. Para, num segundo momento, iluminados com a luz que deles emerge e armados com a força e audácia que deles emanam, caminharmos juntos “de encontro ao vento”.
Particularmente para mim, o modelo que o Tribunal escolheu tem a inestimável vantagem de permitir aligeirar o discurso, sobrecarregando-o ao mesmo tempo com o lastro das coisas que verdadeiramente contam e encantam.
Por um lado, o carácter relativamente informal da circunstância poupa-me — e sobretudo poupa Vossas Excelências — a acumulação de tropos, alegorias, metáforas e citações a que é uso — por vezes abuso — lançar mão para dar lustro à prosa.
Por outro lado e inversamente, circunscrever o universo dos destinatários do discurso e encurtar o espaço a alcançar com a sua mensagem, torna possível convocar privilegiadamente os tópicos e os argumentos que, em geral, polarizam as conversas e as discussões nos círculos mais fechados das reuniões de família ou dos encontros de amigos.
Nada mais gratificante. Como afirmava Tucídides, juntar amigos e travar conversas de amigos é coisa de deuses.
2. Compreender-se-á, por isso, a relativa leveza desta fala, tecida de breves e despretenciosas palavras.
A primeira vai naturalmente para Vossas Excelências, Senhores Juízes Conselheiros que, com incomensurável generosidade, nos deram o direito de estar aqui. Pelo que pessoalmente me respeita, um lugar que ocupo com indisfarçado e indisfarçável sentimento de privilégio e de honra. No plano das coisas e dos desígnios humanos, nada seguramente mais fascinante do que poder subir todos os dias ao Sinai, onde se encontram, cravadas na rocha, as tábuas da lei: da lei suprema que é para nós a lei constitucional. Acresce, a aumentar o fascínio, que ao contrário de Moisés, não nos limitamos a recolher e a ler a lei. Também tomamos parte na sua feitura, conformação e modelação. Como acontece com todas as leis, também as leis constitucionais só aparentemente saem acabadas das mãos do legislador. As leis produzidas pelo legislador trazem invariavelmente consigo a marca do inacabamento e da plasticidade. Só às mãos do Tribunal e pela voz do Tribunal as normas ganham a forma e o rosto definitivos com que hão-de projectar-se sobre os trabalhos e os dias dos homens e os conflitos segregados pelas clivagens e dinâmicas sociais.
Mais. A experiência do Tribunal e no Tribunal Constitucional traz consigo o privilégio único de todos os dias reviver, em síntese perfeita duas das mais densas e impressivas vivências hermenêuticas da humanidade: Babel e Pentecostes. No Tribunal actualiza-se permanentemente o Babel de muitas línguas, de muitos caminhos e de muitas gentes, que falam o indizível e dizem o incomunicável. Ao mesmo tempo, o Tribunal renova todos os dias o milagre do Pentecostes, o milagre do entendimento entre pessoas que vêm de lugares diferentes, trazem memórias distintas e falam línguas aparentemente incompreensíveis.
É efectivamente assim: chegamos aqui com percursos e formações distintas, trazendo linguagens e subculturas profissionais diferentes. Logo por imposição constitucional e legal, os magistrados de carreira têm que caldear experiência e cultura com profissionais que fazem carreira por outros azimutes e outras constelações deontológicas e mesmo axiológicas. Esta irredutível marca de Babel, de dispersão e desencontro, é potenciada e amplificada pela decisiva intervenção do Parlamento na escolha dos Conselheiros. Que, pela natureza das coisas, fazem chegar ao Tribunal mulheres e homens de muitas mundivisões e credos, normalmente dissonantes, por vezes irreconciliavelmente antagónicos.
O que em nada prejudica a subsistência, a interiorização e a obediência a uma gramática comum. Ancorada na ordenação axiológica da Constituição, tributária da sua cultura jurídica, onde se espelha o melhor da tradição iluminista-individualista e o melhor das ideologias que, em nome da solidariedade e da igualdade, privilegiam a dimensão dirigente e intervencionista do Estado. E, como tal, uma gramática vocacionada para rasgar rotas entre ilhas, lançar pontes entre abismos que separam e abrir diálogo entre línguas aparentemente condenadas ao destino de mónadas incomunicáveis. É a vertente do Tribunal virada para o Pentecostes e por ele iluminada. Um papel que o Juiz do Tribunal Constitucional assume e cumpre sem disfarçar ou esconder — menos ainda sem sacrificar — o rosto da sua idiossincracia, da sua mundivisão, em síntese do seu modo único e insindicável de ser pessoa. Estamos assim nos antípodas do actor da tragédia grega que, para assumir o papel, tinha que esconder a pessoa atrás da máscara, que lhe permitia outrossim disfarçar a própria voz.
Não são todas mas são já razões bastantes a justificar o gosto e mesmo o encantamento de estar aqui. E a fazer subir exponencialmente a medida da minha dívida face à generosidade prodigalizada por Vossas Excelências, Senhoras e Senhores Conselheiros. Tanto mais que este é um lugar de que não cuidei, não procurei, não desejei nem esperei, menos ainda solicitei e mesmo assim me atribuíram. E digo-o com a verdade e a autenticidade de quem conheceu e viveu as vicissitudes que acompanharam a eleição. Coisa que já esqueceu e que, de resto, enfrentou com serenidade e distanciação. E que, além do mais, interpretou e imputou à complexidade — diria mesmo à “irritação” (LUHMANN) — não devidamente superada com que reciprocamente se confrontaram os dois sistemas intervenientes no processo: o sistema político-partidário, por um lado, e o próprio Tribunal Constitucional, por outro. Dois sistemas distintos, portadores de legitimidades específicas, polarizados em torno de códigos diferentes, a organizarem-se e a funcionarem em termos autorreferentes e, como tais, potencialmente dissonantes e conflituais. Mas que no sistema constitucional pátrio devem conjugar-se e ajustar-se na hora de selecção de novos juízes para o Tribunal. Não será seguramente o sistema ideal e arquetípico que cada um de nós excogitaria para responder ao problema. Também não será arriscado acreditar que um sistema como este dificilmente teria lugar na caverna das ideias puras de Platão. Mas é o sistema que temos e de que todos, como Juízes do Tribunal Constitucional, somos tributários.
Foi o que sempre representei, interiorizei e erigi em premissa da minha conduta no processo de escolha do Presidente do Tribunal. Em que participei com a certeza de que impendia sobre o processo aquele inarredável coeficiente de álea que é, reconhecidamente, a marca de água e mesmo a insuprível condição de legitimação de decisões como as escolhas democráticas, as decisões jurisdicionais ou as competições desportivas. Que só gozam de legitimação se e na medida em que o resultado não está, à partida, predeterminado: se tanto se pode ganhar como perder.
É neste contexto e sobre este pano de fundo que renovo o meu agradecimento às Senhoras e Senhores Conselheiros. O que só posso fazer acompanhado do voto sentido de felicidade e de sucesso pessoal e institucional no caminho que agora iniciamos juntos. Seguros de que o sucesso de cada um de nós se converte, ampliado e reforçado, em sucesso colectivo. E, concretamente, em sucesso do Tribunal que todos, estou certo disso, nos propomos entregar aos que vierem depois de nós são e salvo como o recebemos.
Um voto que naturalmente estendo a todos os que, na diversidade das suas funções e das suas prestações, se propuseram servir a comunidade sob as telhas e a bandeira do Tribunal Constitucional. Uma casa comum onde as diferenças formais ou de estatuto não têm como reverso uma diferença de dignidade. Até porque há uma relativa equivalência de prestações, já que todas elas são condições e, em boa medida, condições equivalentes do funcionamento e do prestígio do Tribunal. Como se ensina na doutrina do crime ou das obrigações, todas as condições necessárias são igualmente causais, já que cada uma vale só por si como condição da causalidade de todas as demais. Cada uma delas valendo, só por si, tanto como o potencial causal acumulado de todas as outras.
É assim que interpreto e valorizo o contributo de todos os que votaram a vida ao serviço do Tribunal: desde os que ocupam os lugares teoricamente superiores aos que se situam nos limiares teoricamente menos elevados.
3. Numa segunda e última palavra, proponho-me deixar uma síntese brevíssima das razões de substância que me levaram a voltar de novo ao pó dos caminhos, que julgava ter irreversivelmente abandonado. São razões que, digo-o do mais fundo de mim mesmo, não se prendem com a recolha de distinções honoríficas, com a detenção e exercício de um qualquer átomo de poder, menos ainda com a acumulação de prebendas materiais.
As razões foram radicalmente outras. E todas convergentes na prossecução quotidiana e progressiva das metas do Estado-de-direito-social, na plenitude das suas exigências. Assim mesmo: Estado-de-direito, por um lado e social, por outro, na realização dialéctica e incindível das duas dimensões, que reciprocamente se complementam e limitam. De resto, só à revelia da cultura jurídica da Constituição e do seu unívoco programa de protecção, se poderiam separar as águas, pondo unilateralmente a tónica num ou noutro dos pilares: no momento Estado-de-direito ou na conotação social. Na certeza de que o esquecimento ou abandono de qualquer uma delas só poderia desencadear uma daquelas tragédias de que a História dá abundante lição. Sendo outrossim seguro que, na experiência actual, ambas as dimensões se encontram claramente “expostas às intempéries” (BINDING), ameaçadas de riscos, cada vez mais nítidos e mais difíceis de debelar
As coisas são particularmente evidentes do lado social, uma evidência que não carece de demonstração ou sustentação. Basta lançar um olhar sobre as feridas abertas no corpo e na alma da comunidade, privilegiadamente dirigido para os menos contemplados pela complacência da fortuna. O que é tanto mais perturbador e angustiante quanto se sabe que não faltam vozes, e vozes presumidamente credenciadas, a lançar sobre esta realidade a legitimação do véu diáfano das fantasias ideológicas. Postura a que, por vezes, não falta mesmo a aura de uma certa unção para-religiosa e idolátrica, como se tudo não passasse do cumprimento de indeclináveis desígnios de deuses que continuam a gerir e manipular o mundo e a vida com mão invisível. Tudo se passando como se o actual estado de coisas — que, afinal de contas, é assim, mas podia ser de outra maneira — valesse como afloramento aproblemático da pretensa “natureza das coisas”. Como se os direitos fundamentais de étimo económico-social, cultural-educacional, ambiental, médico-assistencial, etc., mais não fossem do que enunciados benvindos na hora de sublimar o discurso ou neutralizar os sentimentos de culpa colectiva.
Não são menos carregadas as sombras que impendem sobre o lado do Estado-de-direito. E tanto na vertente do pluralismo e da separação de poderes, como e sobretudo do lado dos direitos e liberdades fundamentais. Nada talvez mais indicado para o ilustrar do que a citação apressada da experiência dos direitos e liberdades do lado do processo penal, ontem como hoje o verdadeiro “sismógrafo” (PETERS) da realidade constitucional.
Seguramente, nunca como hoje foi tão nítida a consciência dos direitos que integram, por exemplo, o estatuto do arguido em processo penal. No plano da law in books, nunca como hoje foi tão densa e tão extensa a carta dos direitos do arguido, a emergirem decantados e límpidos nos tratados, nas discussões dos congressos e mesmo na letra dos textos legais. A começar pela matricial e intangível dignidade humana — de que decorre, como emanação directa, o irredutível privilégio contra a autoinculpação; passando pelo reconhecimento de uma área nuclear inviolável, criada pela jurisprudência constitucional, mas logo generalizadamente reconhecida e positivamente consagrada pela legislação de alguns países. Um direito que reserva à pessoa, a toda a pessoa, independentemente da gravidade dos factos imputados, um último refúgio de evasão e segurança, imune a toda a intromissão e devassa.
O quadro é manifesta e reconhecidamente mais sombrio no plano da law in action. Onde o cinzel dos factos parece ter apostado em demolir, golpe após golpe, este arquetípico e decantado estatuto do arguido, frustrando, um a um, muitos dos seus direitos. Neste sentido joga, desde logo, o recurso cada vez mais generalizado a meios ocultos e cada vez mais eficazes de investigação, muitos deles tornados possíveis pelos desenvolvimentos tecnológicos nos domínios da informação e das telecomunicações. Que, superando todas as barreiras, surpreendem, em todos os seus passos, gestos e palavras, pessoas que, desconhecendo a vigilância, continuam a agir e comunicar com “inocência”. Lançando para o processo provas que um dia estarão à sua espera na mesa do julgamento, como comprometedoras e inarredáveis confissões. “Confissões” que, entretanto, já se terão desdobrado e multiplicado em árvores e frutos “envenenados”. Só podendo induzir mal-estar e angústia naqueles que continuam a olhar para o processo penal como santuário de respeito pela intangível e imponderável dignidade e autonomia do arguido, pela liberdade da confissão, pelo privilege against self-incrimination. Numa palavra, como processo acusatório, constitucionalmente imposto. Tudo em consonância e sintonia com o medo da rua – espontâneo ou provocado – onde ecoam cada vez mais fortes e tenebrosos os gritos dos Erínias a reclamar vingança em nome da “ordem”. Reivindicações muitas vezes feitas em nome da exigível protecção contra as ameaças dos terrorismos mas que, não raro, acabam por perversamente colonizar o processo penal comum, nele se disseminando como metástases que a defesa não está normalmente em condições de ultrapassar.
As sombras só podem carregar-se e a angústia agudizar-se a serem minimamente plausíveis os fantasmas que começaram a levantar voo em nome das neurociências, nas suas versões mais extremadas. A reconduzirem o pensamento e a acção humanas a meros derivados de vicissitudes neuronais. E, como tais, a sustentar que toda a vida psíquica é, inconsciente e deterministicamente, comandada pelo sistema límbico, a produzir os potenciais de disposição que desencadeiam automaticamente a acção. Tudo a significar que a liberdade não passa de uma ilusão, de um auto-engano: cada pessoa faz o que faz porque naquele momento não poderia fazer coisa diferente.
Uma Menschenbild radical e inteiramente nova, com reflexos tão evidentes como dirimentes sobre o processo penal e, particularmente, sobre a produção e recolha da prova. As neurociências trazem consigo a pretensão de cumprir o velho sonho de separar a verdade da mentira, de aceder ao armazém dos conhecimentos sedimentados no fundo da memória e de levar a cabo o brain reading a partir do brain imaging. Para o que bastará o registo da actividade eléctrica dos neurónios por procedimento electroencefalográfico na busca do mítico P 300; ou mapear por ressonância magnética ou por PET as áreas do cérebro que dão guarida às diferentes actividades psíquicas, nomeadamente as supostas áreas da verdade e da mentira.
Tudo à margem do controlo e da autonomia da pessoa investigada – que não terá qualquer possibilidade de falsificar, adulterar ou perverter a informação – e fica reduzido à situação passiva de mero apêndice duma máquina. Tudo a deixar próxima a sugestão a seu tempo avançada por FREUD de deslocar o “julgamento” dos Tribunais para os laboratórios de neurotecnologia. Almejando afastar as togas negras do processo e a sua substituição pelas batas brancas. A fazer soar os alarmes face aos perigos do therapeutic state, seguramente o mais opaco e absurdo dos totalitarismos. De qualquer forma, a deixar sem sentido a figura do juiz, tal como hoje o entendemos. Porque então não haveria lugar para um juiz a decidir livre e responsavelmente sobre os factos e a sua valoração jurídica. Também as suas decisões estariam mecânica e deterministicamente antecipadas pelos potenciais de disposição segregados pelo sistema límbico.
4. Claro que estes problemas estão longe, muito longe de esgotar as questões de constitucionalidade a dirimir e superar pelo Tribunal. Na certeza de que eles seriam só por si bastantes para justificar a nossa existência e a nossa vigilância. Aqui colocados como sentinelas no promontório, permanentemente dispostos a responder à pergunta de JEREMIAS: custos, quid de nocte? E a garantir-lhe que a noite será sempre iluminada pela constelação dos valores da Constituição, a responder contrafacticamente à frustração dos factos, aqui sob o rosto de “factos normativos”.
Manuel da Costa Andrade
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