José Manuel Cardoso da Costa
Tomada de Posse
19 de março de 1998
Tribunal Constitucional
Senhor Presidente, em exercício, do Supremo Tribunal de Justiça
Senhor Ministro da Justiça
Senhor Ministro dos Assuntos Parlamentares
Senhor Procurador-Geral da República
Senhores Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo,
do Tribunal de Contas e do Supremo Tribunal Militar
Senhor Provedor de Justiça
Senhores Secretários de Estado
Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados
Senhores Deputados
Excelências e Excelentíssimos Convidados
Senhores Conselheiros
Senhores Procuradores-Gerais Adjuntos
Senhores Funcionários
Senhoras e Senhores
1. Porque só agora a sua lei orgânica, desde a recente revisão de que foi objecto, o passou a prever expressamente, reúne-se hoje o Tribunal Constitucional, pela primeira vez, em acto formal e solene, para que, perante ele, tomem posse dos respectivos cargos o seu presidente e o seu vice-presidente. Eis por que me cumpre a mim o dever e me cabem a honra e o privilégio de ser igualmente o primeiro dos presidentes desta casa a usar da palavra num tal acto, assinalando o particular significado que ele assume na vida do Tribunal. Procurarei ser breve e conciso, porque, se a circunstância impõe que me não remeta simplesmente ao silêncio, também não consente que vá mais longe do que ela mesma - e a cortesia - exigem.
2. Ao fazê-lo, seria curial que em primeiro lugar me dirigisse aos membros do Tribunal, para, em meu nome e no do Senhor Conselheiro Vice-Presidente, lhes significar quanto nos honra e desvanece a prova de confiança que renovadamente nos quiseram dar, elegendo-nos para o exercício das funções que acabamos de assumir. Mas, havendo partido de V. Exas., Senhores Conselheiros, a iniciativa e o propósito de conferir a este acto a solenidade pública de que entenderam ser ele merecedor, consentir-me-ão V. Exas. que, em nome de todos, comece por saudar as ilustres entidades e individualidades que, acedendo ao vosso convite, distinguem o Tribunal Constitucional com a sua presença nesta cerimónia.
Saúdo, assim, o Senhor Conselheiro Presidente, em exercício, do Supremo Tribunal de Justiça, e nessa saudação envolvo os Senhores Presidentes dos restantes Tribunais Supremos, representantes máximos dos tribunais e dos juízes portugueses, em cada uma das suas ordens de jurisdição - com os quais o Tribunal Constitucional compartilha a relevante, delicada, espinhosa, se bem que também exaltante, mas não raro ingrata tarefa que é a de administrar a justiça.
É a presença de V. Exas. neste acto um testemunho de especial solidariedade, que reconhecidamente agradeço.
Idêntica saudação e a expressão do mesmo reconhecimento dirijo a V. Exas., Senhor Ministro da Justiça e Senhor Ministro dos Assuntos Parlamentares - e também aos Senhores Secretários de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e Adjunto do Ministro da Justiça. Trazem V. Exas. a este acto a presença do Governo, e nessa qualidade institucional respeitosamente os cumprimento, sublinhando o especial significado dessa presença. Mas a esses cumprimentos não quero deixar de juntar o testemunho do meu - do nosso - apreço e estima pessoais.
Saúdo, igualmente, o Senhor Procurador-Geral da República - bem como os distintos Procuradores-Gerais Adjuntos que exercem funções no Tribunal Constitucional e lhe têm prestado tão relevante colaboração -, o Senhor Provedor de Justiça e o Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados - acompanhado aqui por alguns dos Presidentes dos Conselhos Distritais da Ordem. A um ou outro título, têm V. Exas, por si pessoalmente, ou a entidade ou classe profissional que representam, um relacionamento específico com o Tribunal Constitucional, por isso lhes cabendo um lugar próprio neste acto. Sente-se do mesmo modo o Tribunal sumamente honrado e grato pelo gesto, institucional e pessoal, da presença de V. Exas..
Uma especial palavra de cumprimentos gostaria ainda de dirigir a V. Exas., Senhores Deputados Presidentes ou representantes dos Grupos Parlamentares e da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. A presença de V. Exas. - em luzida e significativa representação da Assembleia da República - é sobremaneira dignificante para o Tribunal Constitucional, e dá-me a oportunidade de, em nome dele, e neste ensejo, testemunhar o alto respeito que lhe merece a instituição parlamentar, verdadeiro lugar geométrico do regime democrático, na pluralidade da sua expressão política e na sua privilegiada legitimidade popular. Nesta legitimidade, de resto, encontram os juízes constitucionais portugueses, directa ou indirectamente, - não virá a despropósito recordá-lo aqui - a fonte da sua própria legitimação, facto que honrosamente assumem, já que nem por isso ele implica qualquer quebra ou entorse da sua independência. Não o implica na ordem dos princípios, pois que a intervenção parlamentar - para mais havendo de exprimir-se numa maioria qualificada que requer um consenso político alargado - se esgota no acto mesmo de designação dos juízes; mas tão-pouco alguma vez o implicou na ordem dos factos, como posso, devo e me é grato neste momento asseverar.
Saúdo, finalmente, todas as demais ilustres entidades e personalidades convidadas ou que quiseram associar-se a este acto - Senhores Conselheiros, Senhor Embaixador Chefe da Casa Civil de S. Exa. o Presidente da República, Senhor representante da Câmara Municipal de Lisboa e Senhor Governador Civil, Senhores Magistrados Judiciais e do Ministério Público, Senhores Professores, Senhores Profissionais do foro e do direito - cuja presença me permito tomar como um tributo de consideração para com o Tribunal Constitucional, que desvanecidamente registo e agradeço. Seja-me apenas consentido que entre todos V. Exas. destaque - e decerto que todos o consentirão e compreenderão que o faça - os antigos membros deste Tribunal, e, com eles, os antigos membros da Comissão Constitucional, sua antecessora - para dizer-lhes, ainda uma vez, quanto nos gratifica e reconforta que voltem sempre a esta casa, que continua a ser sua.
Excelências
Minhas Senhoras e Meus Senhores
3. Com este acto encerra-se o processo de recomposição do Tribunal Constitucional, imposto pelo princípio, que a Constituição portuguesa consagra - como, de resto, o faz a generalidade dos ordenamentos constitucionais europeus que conhecem uma instituição similar -, da limitação temporal do mandato dos respectivos juízes.
Foi notoriamente um processo longo e complexo - mais na sua gestação, do que propriamente na sua execução. Mas um processo que não afectou minimamente, entretanto, ao contrário do que com frequência se propalou (quero crer que apenas por deficiência de informação ou por equívoco) a operatividade e o funcionamento do Tribunal. Isto mesmo o reconheceu há poucos dias o Senhor Presidente da República - na intervenção com que quis sublinhar a importância do acto de posse dos juízes do Tribunal Constitucional; e porventura a suprema qualificação desse testemunho - prestado em termos que não podiam ser mais gratificantes para os seus destinatários - impor-me-ia que não voltasse ao ponto. Mas, se me permito fazê-lo, é só porque isso me dá o ensejo para sublinhar e enaltecer a elevação e o devotamento com que - não apenas durante esse período de transição, mas durante todo o seu mandato, os juízes do Tribunal exerceram as suas funções. Sobre eles - mais do que sobre quem recebe o honroso múnus de dirigir, qual primus inter pares, a actividade do correspondente colégio - recai, no essencial, o encargo substantivo de dar corpo à sua função judicativa. É, pois, cabido e justo que eu o registe e sublinhe neste momento de renovação do Tribunal.
Esta palavra de reconhecimento devo endereçá-la, em particular, aos Juízes que cessaram definitivamente funções, e que emprestaram ao Tribunal Constitucional, durante o exercício delas, todo o prestígio da sua alta qualificação de jurisconsultos. Quero assegurar-lhes que deixam nesta casa uma gratíssima lembrança, e reiterar-lhes a expressão do mais vivo e alto apreço.
Em seu lugar, iniciam agora funções no Tribunal Constitucional quatro novos Juízes - igualmente juristas de elevada craveira e de mérito reconhecido, de que largas provas têm dado, de resto, seja no exercício da magistratura, seja no da investigação e do magistério universitário, seja noutros relevantes domínios da actividade jurídica. É com o maior aprazimento que cumpro o dever - que também é o meu neste momento - de saudá-los e de dizer-lhes quanto o Tribunal espera da sua valiosa contribuição. Estou certo de que em V. Exas. o Tribunal encontrará, a um tempo, o estímulo renovador de que esta, como todas as instituições judiciárias permanentemente necessitam, e a garantia de continuidade de que também nenhuma delas pode prescindir.
4. Realiza-se este acto poucos dias antes de se cumprirem quinze anos sobre o início do funcionamento do Tribunal Constitucional, ocorrido em 2 de abril de 1983, com a posse dos seus primeiros juízes.
Seria esta, pois, oportunidade adequada para uma nova reflexão sobre a actividade do Tribunal ao longo destes anos, e sobre o modo como ele correspondeu ao desígnio para que foi criado, e exerceu as múltiplas competências que lhe estão confiadas, mas em particular aquela que verdadeiramente lhe imprime carácter e representa a sua função nuclear: a do controlo da constitucionalidade das normas jurídicas e, primacialmente, das normas legais.
Poupando V. Exas., no entanto, a um balanço exaustivo, que seria, de todo o modo, descabido e penoso, cingir-me-ei simplesmente a algumas referências que reputo de mais significativas.
E a primeira delas não pode ser senão para registar e salientar aquilo que julgo ser notório e geralmente reconhecido: ao longo destes quinze anos de actividade o Tribunal Constitucional - para além da divergência ou da polémica que não poucas das suas decisões suscitaram, e hão-de, inevitavelmente, continuar a suscitar - soube acreditar-se como órgão jurisdicional específico para as questões constitucionais, e criou raízes firmes, não só no universo das instituições judiciárias portuguesas, como no quadro mais amplo dos órgãos de soberania, previstos pela Constituição, que é como quem diz, e à maneira clássica, no quadro dos diferentes poderes do Estado.
Efectivamente - e como noutra oportunidade tive já ocasião de afirmar, por estas mesmas ou equivalentes palavras - tem o Tribunal Constitucional, através da sua jurisprudência, desempenhado um relevante papel na efectivação, consolidação e desenvolvimento da ordem jurídico-constitucional, contribuindo decisivamente, seja para assegurar o respeito pela regra de divisão de poderes e correlativo equilíbrio político-institucional postulados pela Constituição, seja para garantir, por outra parte, que o ordenamento jurídico vigente no país, no contínuo do seu dinamismo e evolução, com ela se mantenha em permanente e substantiva consonância. E por ser assim, bem poderá dizer-se que o Tribunal se perfila hoje, entre nós, como uma verdadeira pedra angular do Estado-de-direito democrático.
Tenho bem a noção de que ao dizê-lo assim de si próprio, pela minha voz, corre o Tribunal Constitucional o risco de ser acusado de um feio pecado de presunção. Mas - se agora retomo as palavras que acabei de citar, e que nesta mesma sala proferi aquando da sessão solene comemorativa do 10 aniversário do Tribunal - é porque creio, convictamente, que, cinco anos decorridos, elas não só não sofreram nenhum desmentido, como ganharam mesmo acrescido fundamento; e porque uma tal convicção representa, decerto, o prémio mais reconfortante para todos quantos têm servido nesta instituição e procurado dar-lhe o melhor de si.
5. Entretanto - e esta é a segunda nota que queria deixar referida - passados quinze anos sobre a sua instituição, é hoje, natural e compreensivelmente, muito diverso do seu início o panorama da actividade do Tribunal e o condicionalismo ou as condicionantes do seu funcionamento.
Por um lado, foi-se progressivamente alargando o quadro das suas competências - nele tendo também passado a inscrever-se, nomeadamente, a do controlo da constitucionalidade e legalidade dos referendos, a da verificação anual das contas dos partidos políticos e a do controlo das regras de incompatibilidade dos titulares de cargos políticos, para não falar ainda de outras, que a estas se vieram juntar, estabelecidas pela última revisão constitucional; por outro lado, e no domínio da já referida função nuclear do Tribunal - a do controlo normativo - assistiu-se, ao longo do tempo, a um crescimento progressivo do número de processos pendentes e, consequentemente, do número anual de decisões. Deter-me-ei, por mais alguns instantes, neste ponto - desde logo indicando, a respeito dele, alguns poucos mas esclarecedores números.
Assim, referirei que, de 187 processos de fiscalização da constitucionalidade entrados no Tribunal em 1984 (o seu primeiro ano completo de funcionamento), se passou, em 1994, para 554 e, em 1997, para 784; e que, nos mesmos anos, o número das correspondentes decisões subiu, respectivamente, de 130 para 656 e 661. Por outro lado, e considerando-se números médios de entradas de processos e de decisões proferidas, verifica-se que eles foram, respectivamente, de 319 e 315 para o período de 1984 a 1990, mas já de 737 e 730 para o período de 1991 a 1997 - o que representa, portanto, uma percentagem de aumento claramente superior a 100%.
Os números mencionados são, pois, de si mesmos, suficientemente expressivos - só importando acrescentar que a variação que eles traduzem se reporta, basicamente, aos processos de fiscalização concreta, isto é, aos recursos (e reclamações da sua não admissão) vindos dos restantes tribunais. Com efeito, já no que toca à fiscalização abstracta da constitucionalidade, seja preventiva, seja sucessiva, a pendência processual se apresenta como muito mais estável, e revelou mesmo, nos anos mais recentes, alguma tendência decrescente. Entretanto, e ainda no que à fiscalização concreta diz respeito, uma desagregação estatística mais detida dos números apontados permitirá, decerto, evidenciar que o crescimento assinalado se deveu, sobretudo, ao aumento - naturalmente previsível - dos recursos facultativos de parte (contra a aplicação de normas alegadamente inconstitucionais), cujo número, também nos últimos anos, vem já ultrapassando o dos recursos obrigatórios do Ministério Público (para a revisão de decisões de recusa de aplicação de normas, tidas por inconstitucionais pelo juiz a quo).
Eis, Senhoras e Senhores, alguns elementos que já permitirão formar uma ideia, embora muito esquemática, do volume e características que assume hoje em dia a actividade jurisdicional do Tribunal Constitucional português.
É óbvio que se está longe de nele se verificar o fenómeno de litigância de massas a que contemporaneamente se assiste um pouco por toda a parte, provocando as maiores dificuldades e mesmo o bloqueio dos sistemas judiciários, e da sua capacidade de resposta adequada e atempada à procura da justiça por parte dos cidadãos. Mas, se não se esquecer o leque alargado de competências do Tribunal - e, desde logo, a necessidade de compaginar o julgamento dos recursos judiciais com o exame dos pedidos de fiscalização abstracta da constitucionalidade, por regra sempre mais complexos, e sujeito, no caso da fiscalização preventiva, a prazos constitucionais impreteríveis - e se, a par disso, se tiver em conta a natureza e especificidade das questões que caem no âmbito da sua jurisdição - é também claro que se está já perante um volume de actividade significativa, a exigir um suficiente suporte logístico e uma adequada ordenação processual.
6. Não têm faltado ao Tribunal o primeiro, nem os meios para o ir reforçando, remodelando e modernizando, à medida que as necessidades o impõem. Mas como esses meios, antes de serem materiais, hão-de ser financeiros, e passam necessariamente pela respectiva inscrição no Orçamento do Estado, é de justiça que eu saliente aqui a atenção que a esse respeito o Tribunal Constitucional sempre tem recebido da Assembleia da República e, antes de mais, do Governo, na preparação da proposta orçamental. Refiro-me a ambos os órgãos de soberania em si mesmos, independentemente da maioria parlamentar do momento e da origem partidária do Governo, dos sucessivos Governos - já que, qualquer que hajam sido uma ou outra, nunca o Tribunal deixou de encontrar em ambos, no melindroso mas sintomático aspecto a que me refiro (como, de resto, em geral) um rigoroso e correcto entendimento das implicações da sua autonomia institucional e orgânica. Creio que esta é uma ocasião azada para dar testemunho do facto, que reputo de exemplar no relacionamento entre os três órgãos de soberania em causa, na mútua dependência funcional a que o princípio da divisão de poderes - matriz de qualquer Constituição democrática - os obriga.
Seja como for, mais do que o suporte logístico material, conta o suporte logístico humano, para que uma qualquer instituição possa desempenhar-se cabalmente das tarefas que lhe estão cometidas.
Ora, também esse não tem faltado ao Tribunal Constitucional - e em especial porque, não obstante a sóbria dimensão do seu quadro de pessoal, vem estando servido por um corpo de funcionários competentes, zelosos e empenhados, e cuja dedicação ao serviço - ao serviço público - e à instituição que concretamente servem, não tenho dúvida em qualificar também de exemplar. Queria, pois, nesta oportunidade, saudar todos quantos trabalham nesta casa - no serviço judicial e administrativo, no serviço de documentação e no serviço dos gabinetes - e agradecer-lhes a decisiva colaboração que, sem reservas, e frequentemente sem horas, têm prestado ao Tribunal.
7. Tanto, porém, como dos recursos humanos e materiais que referi, depende o bom funcionamento de uma instância jurisdicional, como no caso acontece, da adequação e da funcionalidade da correspondente ordenação processual.
A tal propósito, direi apenas que tem sido esta uma área a que o Tribunal Constitucional sempre prestou uma permanente atenção, em ordem a retirar da experiência do seu funcionamento as lições que sucessivamente permitissem aperfeiçoar aquela ordenação, adaptá-la progressivamente ao aumento de volume e até à alteração das características da sua pendência processual e, por sobre tudo, imprimir a maior celeridade possível às suas decisões - sem quebra das garantias das partes, por um lado, e sem prejuízo da análise reflectida e criteriosa das questões submetidas ao seu julgamento, por outro. E, se esta tem sido uma preocupação permanente do Tribunal, não tem a mesma deixado de encontrar o correspondente eco por parte do legislador competente - o que também não quero deixar de registar aqui. Assim voltou agora a suceder, com a importante e extensa reforma da Lei Orgânica do Tribunal, que a Assembleia da República acabou justamente de aprovar, e que acabou de entrar em vigor.
Introduzem-se, nessa reforma, mecanismos processuais que vão seguramente contribuir para uma maior agilidade e flexibilidade do funcionamento do Tribunal; e avança-se nela, por outro lado, para uma solução inteiramente inovatória no direito judiciário português, da qual se espera que permita tornar igualmente mais célere a decisão dos próprios processos de fiscalização abstracta da constitucionalidade.
Aliás, uma análise comparada da duração dos processos no Tribunal Constitucional (tendo agora em conta quanto a este, claro está, os processos de fiscalização concreta) e nos restantes tribunais superiores portugueses não revela - ao contrário - qualquer resultado desfavorável ao primeiro relativamente aos demais; e muito menos justifica qualquer apreciação alarmista a tal respeito (como por vezes, mas infundadamente, já tem ocorrido): basta dizer que, de acordo com os últimos números oficiais disponíveis (os da "Estatística da Justiça" do ano de 1996), a duração média de um recurso no Tribunal Constitucional cifrou-se, nesse ano, em 8 meses. O facto, porém, não pode servir de caução para que o Tribunal descanse na preocupação de aumentar os seus níveis de eficácia, e de decidir, tão prontamente quanto possível, as questões que lhe são submetidas. Estou certo de que, com as modificações agora introduzidas na sua lei de processo, estão preenchidas as condições para que assim aconteça.
8. Não desejaria terminar estas sumárias considerações - que me pareceram as adequadas á circunstância - sobre a actividade e o funcionamento do Tribunal Constitucional, sem a referência a um aspecto que, em qualquer domínio da actividade judiciária, mas segura e privilegiadamente no concreto domínio da justiça constitucional, assume a maior relevância, a saber, o da comunicação pública do próprio desenvolvimento dessa actividade e, em particular, do conteúdo e fundamentos das correspondentes decisões. Um aspecto para o qual - e justificadamente - o Senhor Presidente da República não deixou de chamar a atenção, nas palavras que proferiu aquando da posse dos Juízes do Tribunal.
O ponto mereceria - só por si - uma detida análise, nas suas múltiplas dimensões e implicações, análise, a que, porém, não é viável proceder aqui. E desde logo porque tenho consciência de já haver ultrapassado o limiar da brevidade e concisão que me havia imposto no início destas palavras - e que, vejo agora que temerariamente, prometera a V. Exas..
Limitar-me-ei assim a dizer que um tal aspecto também não tem estado menos nas preocupações do Tribunal - apesar de aí se revelarem deficiências (sem constrangimento o reconheço) que urge ultrapassar. Tenho esperança de que o consigamos fazer com relativa brevidade - seja, desde logo, recuperando o atraso da publicação oficial dos acórdãos e o registo informático dos respectivos sumários, seja encontrando uma forma mais expedita e rápida de difusão das decisões do Tribunal, à semelhança do que ocorre em instituições congéneres.
Nesta matéria, porém, não pode esquecer-se ainda o relevante e imprescindível papel que igualmente cabe aos diferentes meios de comunicação social em geral. Gostaria de o destacar; e de asseverar aos seus responsáveis e colaboradores que o Tribunal Constitucional - com os condicionamentos que a natureza jurisdicional da sua função inevitavelmente impõe - continuará, como até aqui, disponível para facilitar a sua missão informativa, e empenhado em que possam cumpri-la do modo mais fiel, rigoroso e esclarecido possível.
Excelências
Minhas Senhoras e Meus Senhores
Senhores Conselheiros
9. Inicia-se hoje um novo ciclo na vida do Tribunal Constitucional. Seja, porém, qual for a feição conjuntural que ele venha a assumir, no desenvolvimento, ou, porventura, numa sempre possível, mas improvável, involução das características ou tendências que hoje podem mais marcadamente detectar-se na actividade deste órgão jurisdicional de soberania, algo será sempre seguro e certo: e isso é que a missão que ao Tribunal é cometida continuará a revestir-se da especificidade e do melindre que decorre da própria natureza das questões que integram o núcleo da sua competência - questões que, com frequência, há que decidir segundo "princípios", necessitados da mediação do juiz, e não segundo regras jurídicas tecnicamente acabadas; e questões que, por outro lado, e também com grande frequência, assumem uma especial repercussão política, quando não emergem mesmo nos momentos mais conflituais do processo político.
Foi sem ignorar isto mesmo - e sem ignorar que, por ser assim, haveremos sempre de contar com a possibilidade da divergência e da controvérsia em torno de muitas das nossas decisões - que assumimos as nossas funções, e que as vamos exercer, em fidelidade de consciência ao juramento que prestámos.
No início deste novo ciclo da actividade do Tribunal, confiaram-me V. Exas., Senhores Conselheiros, a presidência do colégio que todos integramos, e, ao Senhor Conselheiro Luís Nunes de Almeida, a sua vice-presidência. Não é gesto que caiba agradecer. Mas é uma missão que recebo - são missões que recebemos - com a mais sentida honra, pelo testemunho de confiança que representam naqueles a quem são atribuídas. Procuraremos ser dignos dessa confiança.
Por mim, estou certo de que terei o meu múnus facilitado, pela coadjuvação leal do Senhor Vice-Presidente, e pelo empenhamento, cooperação e benevolência de V. Exas. Não creio que, ao assumi-lo, devesse enunciar qualquer programa de acção - e ir além da referência a algumas preocupações que no decurso desta intervenção deixei apontadas ou sugeridas. Direi só que no final do meu mandato me sentirei reconfortado se tiver sabido contribuir para manter entre todos o clima de respeito, de lealdade e de solidariedade, que ao longo dos anos se foi criando nesta casa, e é já o timbre dela.
Disse