Lei dos partidos políticos
Lei Orgânica n.º 2/2003 de 22 de agosto [1]
Alterada pela Lei Orgânica nº 2/2008, de 14 de maio e Lei Orgânica n.º 1/2018 de 19 de abril.
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, para valer como lei geral da República, a lei orgânica seguinte:
CAPÍTULO I - Princípios fundamentais
Artigo 1º (Função
político-constitucional)
Artigo 2º (Fins)
Artigo 3º (Natureza e duração)
Artigo 4º (Princípio da liberdade)
Artigo 5º (Princípio democrático)
Artigo 6º (Princípio da transparência)
Artigo 7º (Princípio da cidadania)
Artigo 8º (Salvaguarda da ordem constitucional
democrática)
Artigo 9º (Carácter nacional)
Artigo 10º (Direitos dos partidos políticos)
Artigo 11º (Coligações)
Artigo 12º (Denominações, siglas e símbolos)
Artigo 13º (Organizações internas ou
associadas)
Artigo 14º (Inscrição
no Tribunal Constitucional)
Artigo 15º (Requerimento)
Artigo 16º (Inscrição e publicação
dos estatutos)
Artigo 17º (Dissolução)
Artigo 18º (Extinção judicial)
Artigo 19º (Liberdade
de filiação)
Artigo 20º (Filiação)
Artigo 21º (Restrições)
Artigo 22º (Disciplina interna)
Artigo 23º (Eleitos dos partidos)
Artigo 24º (Órgãos
nacionais)
Artigo 25º (Assembleia representativa)
Artigo 26º (Órgão de direcção
política)
Artigo 27º (Órgão de jurisdição)
Artigo 28º (Participação política)
Artigo 29º (Princípio da renovação)
Artigo 30º (Deliberações de órgãos
partidários)
Artigo 31º (Destituição)
Artigo 32º (Referendo interno)
Artigo 33º (Sufrágio)
Artigo 34º (Procedimentos eleitorais)
Actividades e meios de organização
Artigo 35º (Formas de
colaboração)
Artigo 36º (Filiação internacional)
Artigo 37º (Regime financeiro)
Artigo 38º (Relações de trabalho)
Artigo 39º (Aplicação
aos partidos políticos existentes)
Artigo 40º (Revogação)
CAPÍTULO I - Princípios fundamentais
Artigo 1º
(Função político-constitucional)
Os partidos políticos concorrem para a livre formação e o pluralismo de expressão da vontade popular e para a organização do poder político, com respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política.
São fins dos partidos políticos:
a) Contribuir para o esclarecimento plural e para o exercício das liberdades e direitos políticos dos cidadãos;
b) Estudar e debater os problemas da vida política, económica, social e cultural, a nível nacional e internacional;
c) Apresentar programas políticos e preparar programas eleitorais de governo e de administração;
d) Apresentar candidaturas para os órgãos electivos de representação democrática;
e) Fazer a crítica, designadamente de oposição, à actividade dos órgãos do Estado, das Regiões Autónomas, das autarquias locais e das organizações internacionais de que Portugal seja parte;
f) Participar no esclarecimento das questões submetidas a referendo nacional, regional ou local;
g) Promover a formação e a preparação política de cidadãos para uma participação directa e activa na vida pública democrática;
h) Em geral, contribuir para a promoção dos direitos e liberdades fundamentais e o desenvolvimento das instituições democráticas.
Artigo 3º
(Natureza e duração)
Os partidos políticos gozam de personalidade jurídica, têm a capacidade adequada à realização dos seus fins e são constituídos por tempo indeterminado.
Artigo 4º
( Princípio da liberdade)
1. É livre e sem dependência de autorização a constituição de um partido político.
2. Os partidos políticos prosseguem livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas, salvo os controlos jurisdicionais previstos na Constituição e na lei.
Artigo 5º
( Princípio democrático)
1. Os partidos políticos regem-se pelos princípios da organização e da gestão democráticas e da participação de todos os seus filiados.
2. Todos os filiados num partido político têm iguais direitos perante os estatutos.
Artigo 6º
( Princípio da transparência)
1. Os partidos políticos prosseguem publicamente os seus fins.
2. A divulgação pública das actividades dos partidos políticos abrange obrigatoriamente:
a) Os estatutos;
b) A identidade dos titulares dos órgãos;
c) As declarações de princípios e os programas;
d) As actividades gerais a nível nacional e internacional.
3. Cada partido político comunica ao Tribunal Constitucional, para efeito de anotação, a identidade dos titulares dos seus órgãos nacionais após a respectiva eleição, assim como os estatutos, as declarações de princípios e o programa, uma vez aprovados ou após cada modificação.
4. A proveniência e a utilização dos fundos dos partidos são publicitadas nos termos estabelecidos na lei do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.
Artigo 7º
(Princípio da cidadania)
Os partidos políticos são integrados por cidadãos titulares de direitos políticos.
Artigo 8º
(Salvaguarda da ordem constitucional democrática)
Não são consentidos partidos políticos armados nem de tipo militar, militarizados ou paramilitares, nem partidos racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.
Não podem constituir-se partidos políticos que, pela sua designação ou pelos seus objectivos programáticos, tenham índole ou âmbito regional.
1. Os partidos políticos têm direito, nos termos da lei:
a) A apresentar candidaturas à eleição da Assembleia da República, dos órgãos electivos das Regiões Autónomas e das autarquias locais e do Parlamento Europeu e a participar, através dos eleitos, nos órgãos baseados no sufrágio universal e directo, de acordo com a sua representatividade eleitoral;
b) A acompanhar, fiscalizar e criticar a actividade dos órgãos do Estado, das Regiões Autónomas, das autarquias locais e das organizações internacionais de que Portugal seja parte;
c) A tempos de antena na rádio e na televisão;
d) A constituir coligações.
2. Aos partidos políticos representados nos órgãos electivos e que não façam parte dos correspondentes órgãos executivos é reconhecido o direito de oposição com estatuto definido em lei especial.
1. É livre a constituição de coligações de partidos políticos.
2. As coligações têm a duração estabelecida no momento da sua constituição, a qual pode ser prorrogada ou antecipada
3. Uma coligação não constitui entidade distinta da dos partidos políticos que a integram.
4. A constituição das coligações é comunicada ao Tribunal Constitucional para os efeitos previstos na lei.
5. As coligações para fins eleitorais regem-se pelo disposto na lei eleitoral.
Artigo 12º
(Denominações, siglas e símbolos)
1. Cada partido político tem uma denominação, uma sigla e um símbolo, os quais não podem ser idênticos ou semelhantes aos de outro já constituído.
2. A denominação não pode basear-se no nome de uma pessoa ou conter expressões directamente relacionadas com qualquer religião ou com qualquer instituição nacional.
3. O símbolo não pode confundir-se ou ter relação gráfica ou fonética com símbolos e emblemas nacionais nem com imagens e símbolos religiosos.
4. Os símbolos e as siglas das coligações reproduzem rigorosamente o conjunto dos símbolos e das siglas dos partidos políticos que as integram.
Artigo 13º
(Organizações internas ou associadas)
Os partidos políticos podem constituir no seu interior organizações ou estabelecer relações de associação com outras organizações, segundo critérios definidos nos estatutos e sujeitas aos princípios e limites estabelecidos na Constituição e na lei.
Constituição e extinção
SECÇÃO I
Constituição
Artigo 14º
(Inscrição no Tribunal Constitucional)
O reconhecimento, com atribuição da personalidade jurídica, e o início das actividades dos partidos políticos dependem de inscrição no registo existente no Tribunal Constitucional.
1. A inscrição de um partido político tem de ser requerida por, pelo menos, 7500 cidadãos eleitores.
2. O requerimento de inscrição de um partido político é feito por escrito, acompanhado do projecto de estatutos, da declaração de princípios ou programa político e da denominação, sigla e símbolo do partido e inclui, em relação a todos os signatários, o nome completo, o número do bilhete de identidade e o número do cartão de eleitor.
Artigo 16º
(Inscrição e publicação dos estatutos)
1. Aceite a inscrição, o Tribunal Constitucional envia extracto da sua decisão, juntamente com os estatutos do partido político, para publicação no Diário da República.
2. Da decisão prevista no número anterior consta a verificação da legalidade por parte do Tribunal Constitucional.
3. A requerimento do Ministério Público, o Tribunal Constitucional pode, a todo o tempo, apreciar e declarar a ilegalidade de qualquer norma dos estatutos dos partidos políticos.
Extinção
Artigo 17º
(Dissolução)
1. A dissolução de qualquer partido político depende de deliberação dos seus órgãos, nos termos das normas estatutárias respectivas.
2. A deliberação de dissolução determina o destino dos bens, só podendo estes reverter para partido político ou associação de natureza política, sem fins lucrativos, e, subsidiariamente, para o Estado.
3. A dissolução é comunicada ao Tribunal Constitucional, para efeito de cancelamento do registo.
Artigo 18º
(Extinção judicial)
1 — O Tribunal Constitucional decreta, a requerimento do Ministério Público, a extinção de partidos políticos nos seguintes casos:
a) Qualificação como partido armado ou de tipo militar, militarizado ou paramilitar, ou como organização racista ou que perfilha a ideologia fascista;
b) Não apresentação de candidaturas durante um período de seis anos consecutivos a quaisquer eleições para a Assembleia da República, Parlamento Europeu e autarquias locais;
c) Não comunicação de lista actualizada dos titulares dos órgãos nacionais por um período superior a seis anos;
d) Não apresentação de contas em 3 anos consecutivos ou 5 interpolados num período de 10 anos;
e) Impossibilidade de citar ou notificar, de forma reiterada, na pessoa de qualquer dos titulares dos seus órgãos nacionais, conforme a anotação constante do registo existente no Tribunal.
2 — A decisão de extinção fixa, a requerimento do Ministério Público ou de qualquer membro, o destino dos bens que serão atribuídos ao Estado.
Filiados
Artigo 19º
(Liberdade de filiação)
1. Ninguém pode ser obrigado a filiar-se ou a deixar de se filiar em algum partido político, nem por qualquer meio ser coagido a nele permanecer.
2. A ninguém pode ser negada a filiação em qualquer partido político ou determinada a expulsão, em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, instrução, situação económica ou condição social.
3. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão da sua filiação partidária.
4. Os estrangeiros e os apátridas legalmente residentes em Portugal e que se filiem em partido político gozam dos direitos de participação compatíveis com o estatuto de direitos políticos que lhe estiver reconhecido.
1. A qualidade de filiado num partido político é pessoal e intransmissível, não podendo conferir quaisquer direitos de natureza patrimonial.
2. Ninguém pode estar filiado simultaneamente em mais de um partido político.
1. Não podem requerer a inscrição nem estar filiados em partidos políticos:
a) Os militares ou agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo;
b) Os agentes dos serviços ou das forças de segurança em serviço efectivo.
2. É vedada a prática de actividades político-partidárias de carácter público aos:
a) Magistrados judiciais na efectividade;
b) Magistrados do Ministério Público na efectividade;
c) Diplomatas de carreira na efectividade.
3. Não podem exercer actividade dirigente em órgão de direcção política de natureza executiva dos partidos:
a) Os directores-gerais da Administração Pública;
b) Os presidentes dos órgãos executivos dos institutos públicos;
c) Os membros das entidades administrativas independentes.
Artigo 22º
(Disciplina interna)
1. A disciplina interna dos partidos políticos não pode afectar o exercício de direitos e o cumprimento de deveres prescritos na Constituição e na lei.
2. Compete aos órgãos próprios de cada partido a aplicação das sanções disciplinares, sempre com garantias de audiência e defesa e possibilidade de reclamação ou recurso.
Artigo 23º
(Eleitos dos partidos)
Os cidadãos eleitos em listas de partidos políticos exercem livremente o seu mandato, nas condições definidas no estatuto dos titulares e no regime de funcionamento e de exercício de competências do respectivo órgão electivo.
Organização interna
SECÇÃO I
Órgãos dos partidos
Artigo 24º
(Órgãos nacionais)
Nos partidos políticos devem existir, com âmbito nacional e com as competências e a composição definidas nos estatutos:
a) Uma assembleia representativa dos filiados;
b) Um órgão de direcção política;
c) Um órgão de jurisdição.
Artigo 25º
(Assembleia representativa)
1. A assembleia representativa é integrada por membros democraticamente eleitos pelos filiados.
2. Os estatutos podem ainda dispor sobre a integração na assembleia de membros por inerência.
3. À assembleia compete, sem prejuízo de delegação, designadamente:
a) Aprovar os estatutos e a declaração de princípios ou programa político;
b) Deliberar sobre a eventual dissolução ou a eventual fusão com outro ou outros partidos políticos.
O órgão de direcção política é eleito democraticamente, com a participação directa ou indirecta de todos os filiados.
Artigo 27º
(Órgão de jurisdição)
Os membros do órgão de jurisdição democraticamente eleito gozam de garantia de independência e dever de imparcialidade, não podendo, durante o período do seu mandato, ser titulares de órgãos de direcção política ou mesa de assembleia.
Artigo 28º
(Participação política)
Os estatutos devem assegurar uma participação directa, activa e equilibrada de mulheres e homens na actividade política e garantir a não discriminação em função do sexo no acesso aos órgãos partidários e nas candidaturas apresentadas pelos partidos políticos.
Artigo 29º
(Princípio da renovação)
1. Os cargos partidários não podem ser vitalícios.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os cargos honorários.
3. Os mandatos dos titulares de órgãos partidários têm a duração prevista nos estatutos, podendo estes fixar limites à sua renovação sucessiva.
Artigo 30º
(Deliberações de órgãos partidários)
1. As deliberações de qualquer órgão partidário são impugnáveis com fundamento em infracção de normas estatutárias ou de normas legais, perante o órgão de jurisdição competente.
2. Da decisão do órgão de jurisdição pode o filiado lesado e qualquer outro órgão do partido recorrer judicialmente, nos termos da lei de organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional.
1. A destituição de titulares de órgãos partidários pode ser decretada em sentença judicial, a título de sanção acessória, nos seguintes casos:
a) Condenação judicial por crime de responsabilidade no exercício de funções em órgãos do Estado, das Regiões Autónomas ou do poder local;
b) Condenação judicial por participação em associações armadas ou de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, em organizações racistas ou em organizações que perfilhem a ideologia fascista.
2. Fora dos casos enunciados no número anterior, a destituição só pode ocorrer nas condições e nas formas previstas nos estatutos.
Artigo 32º
(Referendo interno)
1. Os estatutos podem prever a realização de referendos internos sobre questões políticas relevantes para o partido.
2. Os referendos sobre questões de competência estatutariamente reservada à assembleia representativa só podem ser realizados por deliberação desta.
Eleições
Artigo 33º
(Sufrágio)
As eleições e os referendos partidários realizam-se por sufrágio pessoal e secreto.
Artigo 34º
(Procedimentos eleitorais)
1. As eleições partidárias devem observar as seguintes regras:
a) Elaboração e garantia de acesso aos cadernos eleitorais em prazo razoável;
b) Igualdade de oportunidades e imparcialidade no tratamento de candidaturas;
c) Apreciação jurisdicionalizada da regularidade e da validade dos actos de procedimento eleitoral.
2. Os actos de procedimento eleitoral são impugnáveis perante o órgão de jurisdição próprio por qualquer filiado que seja eleitor ou candidato.
3. Das decisões definitivas proferidas ao abrigo do disposto no número anterior cabe recurso para o Tribunal Constitucional.
Actividades e meios de organização
Artigo 35º
(Formas de colaboração)
1. Os partidos políticos podem estabelecer formas de colaboração com entidades públicas e privadas no respeito pela autonomia e pela independência mútuas.
2. A colaboração entre partidos políticos e entidades públicas só pode ter lugar para efeitos específicos e temporários.
3. As entidades públicas estão obrigadas a um tratamento não discriminatório perante todos os partidos políticos.
Artigo 36º
(Filiação internacional)
Os partidos políticos podem livremente associar-se com partidos estrangeiros ou integrar federações internacionais de partidos.
O financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais é regulado em lei própria.
Artigo 38º
(Relações de trabalho)
1. As relações laborais entre os partidos políticos e os seus funcionários estão sujeitas às leis gerais de trabalho.
2. Considera-se justa causa de despedimento o facto de um funcionário se desfiliar ou fazer propaganda contra o partido que o emprega ou a favor de uma candidatura sua concorrente.
Disposições finais
Artigo 39.º
(Aplicação aos partidos políticos existentes)
A presente lei aplica-se aos partidos políticos existentes à data da sua entrada em vigor, devendo os respectivos estatutos beneficiar das necessárias adaptações no prazo máximo de dois anos.
São revogados:
a) O Decreto-Lei n.º 595/74, de 7 de novembro, e as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 126/75, de 13 de março, pelo Decreto-Lei n.º 195/76, de 16 de março, e pela Lei n.º 110/97, de 16 de setembro;
b) O Decreto-Lei n.º 692/74, de 5 de dezembro;
c) A Lei n.º 5/89, de 17 de março.
Aprovado em 15 de julho de 2003.
O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.
Promulgada em 7 de agosto de 2003.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendada em 8 de agosto de 2003.
O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso.